Albert novamente fazia seu ritual padrão, um banho gelado, um café sem açucar e vestindo o mesmo sobretudo de 20 anos atrás, as mesmas luvas que logo seriam incineradas, as olheiras eram visiveis, assim como a escuridão ao seu redor, sempre sozinho, sempre no escuro.
_ Mais um dia 10 de novembro... _ diz ele saindo de seu casebre em meio ao mato, caminha zombeteiro em plena 3 da manhã, em meios as arvores secas, procurando qualquer pessoa, em principio uma mulher.
Assoviava de forma assombrosa a canção, que só ele sabia...
"Pobre homem, doce homem
sem coração, feito de carne e ossos
sem propósito, ele precisa de amor
mas um dia achará
um achará?
até lá, permanecerá vazio"
Achou depois de um tempo no meio da estrada, sua primeira vitima, moça alta, não tão bela, parecia pensativa, tão zombeteira quanto ele, cabelos compridos no rosto, um vestido branco e curto, maquiagem pesada, saltos.
Um banquete grande.
Ele se aproxima sorrateiro, não havia ninguém ali, e Albert sabia disso, então fica frente a frente com a tal dama, que distraida o olhava.
_ O senhor precisa de ajuda? _ diz a voz meio embargada, meio risonha.
Pobre coitada, estava bebáda, coração adormecido pela bebida era mais facil...que sorte.
_ Não querida, mas você parece precisar da minha ajuda, céus, seus olhos estão vermelhos, andou chorando?
_ Ah, bem, talvez, desculpa só quero voltar para casa.
_ Claro, claro _ a voz dele soava melodiosa _ Quer que eu te acompanhe? Parece perigoso uma mocinha tão doce andar sozinha, existem pessoas más por ai.
Ela não poderia recusar, ele tinha boa aparencia apesar do tempo ter corroido tudo de bom em sua alma, mas ainda, superficialmente ele parecia perfeito, parecia confiável, também não tinha como pensar, estava tão cansada...
_ Tudo bem... _ ela diz com um sorriso e passa então a caminhar com ele, mal sabia que era em rumo a morte.
_ Qual seu nome, moça?
_ Angel
_ Um nome bonito
_ E o seu?
_ Hm, me chamo John.
Albert não foi criativo com um nome novo, ele admitia, mas já usou tantos...
Enquanto caminhavam, Angel dizia o que a fazia triste, terminou com o noivo, perdeu o emprego, a melhor amiga era uma vadia, tudo tão vão e patético, um coração tão pobre e carente de atenção, eram os melhores, Albert tentava não sorrir com a narrativa triste da pobre donzela, mas era inevitável, disfarçava com palavras amigáveis de superação, conseguia mante-la entretida, ela não notou, mas já tinha passado longe do caminho de casa, indo parar em um cemitério belo e barroco, pobremente abandonado.
Horas se passaram em meio a conversa sobre sentimentos, e ela enfim se deu conta.
_ Onde estamos? Não me lembro desse lugar
_ Isso não importa mais...
Um movimento rapido, uma imobilização meticulosa, um pescoço quebrado em segundos, um corpo morto.
um rosto palido e manchado das lagrimas que sequer conseguiram cair a tempo.
Ajoelhou ate o corpo, acariciou os cabelos dela como se fossem de uma amada distante, deu um sorriso vazio.
_ Meu nome é Albert, uma pena que você nunca saberá, pelo menos tive uma boa ouvinte para falar sobre o que sentia, acho que pela primeira vez
Pegou a faga em seu sobretudo, e rasgou a frente daquele belo vestido branco, uma pena, parecia ser caro, abriu a caixa toraxica de forma suja, não poupou apunhaladas, nem rasgos, sujou o belo corpo e o belo jardim abandonado, enquanto os santos barrocos observavam com olhares tristes, por fim, quebrou as costelas de forma rude, espalhando os ossos de forma aleatoria e arrancou com suas próprias mãos, o coração puro e triste de Angel.
_ Nunca mais sofrerá por amor ou pela sociedade injusta e falsa, meu amor _ segurava o coração que já não pulsava, e por fim fechou os olhos da vitima, tomando cuidado para não mancha-lo de sangue. _ Agora, não sofrerá com mais nada.
não poderia borrar a maquiagem de uma linda mulher, poderia?
saiu dali, sorrateiro, fez o sinal da cruz quando viu a igreja ao longe, caminhou em direção ao vazio.
_ Enquanto tenho um coração... preciso arrancar os dos outros _ sussurrou pensativo _ Uma pena que ninguém fará o mesmo favor por mim, me manterão sentimental, sofrendo neste mundo podre, mas poupo o sofrimento do próximo, como um novo santo, santo Albert... _ riu ele _ nome patético...
Logo amanheceria, ele teria que fingir ser o pobre Albert novamente, o abandonado pela esposa, o traído pelos amigos, o amaldiçoado pelo patrão, o que dava medo em crianças com seu olhar sério, o que sorria de forma vazia e esparsa para o vizinho...E o que teria que fingir choque, ao notar no noticiário, o pobre assassinato cruel naquela noite.
Até lá, ele seria ele mesmo.
O arrancador de corações.