Observava as mariposas espalhadas pelo seu simplório e aconchegante quarto. Podia passar horas fitando-as no alto das paredes de coloração escura, gracejando para todos que ali estavam ou viriam estar em algum momento.
Lembrou-se de sua infância.
Dos finais de semanas treinando seus movimentos finos e delicados com o pincel em mãos. Ao seu lado, sua professora amistosa a guiava sempre que possível. Sua mãe, sorridente, fazia-se presente em todas as ocasiões. Gostava de ver sua filha alegre, feliz. Mais do que isso, sentia-se bem ao vê-la afastada das energias de onde moravam.
Observou tudo sozinha, apavorada.
Impotência.
Os jardins coloridos e as paisagens exuberantes deram lugar a um tom mais intimista e melancólico. Os quadros da ruiva se tornaram sombrios, sem cor; sem vida. Apenas a tinta preta prevalescia perante as demais, refletindo o sentimento mais puro da jovem adolescente. Havia perdido a luz em um caminho só de ida.
As mariposas negras surgiram, levando-a, em conjunto, para o alto de um penhasco, largando-a sem piedade rumo a um choque fatídico com o chão úmido. Seu desolado mundo passou a ser preenchido com a escuridão das sombras, entretidas com seus piores demônios.
Sentia-se fria, renascida. Apenas um casulo feito de carne e ossos.
O sorriso impiedoso e sádico. As gargalhadas malfadadas de prazer e libido. O toque. As mãos grossas e ressecadas percorrendo por toda a extensão do seu corpo frágil e indefeso. A violência.
Ali, naquele momento, seu casulo ganhava a primeira rachadura.
Seu mundo havia se tornado escuro. A vida não era bem uma aquerela de cores como imaginou. Passou a aceitar sua condição. Estava empacotada nesse casulo, esperando pelo fatídico dia em que estará livre de tudo e de todos. O dia em que tudo ficará eternamente preto.
Aguardava esse momento ansiosamente.