Eu vejo as pessoas fazendo coisas tão diversas, tão distintas umas das outras. Uma menina da minha sala tem as características de quem vai passar direto em Medicina, a outra tem pernas de bailarina, o menino que senta na última carteira resolve todos os desafios de matemática e o casal que se esconde na cortina de apostilas é uma dupla tão gostosa de se ouvir cantando na praia.
Eu vejo as pessoas ao meu redor e elas correm como abelhas de um lado para o outro carregando suas vidas e preocupações e sentimentos estampados nas testas majoritariamente expostas pelo cabelo lavado naquela manhã. Eu vejo as pessoas voando pelas escadas com suas mochilas de dois anos atrás sem um rasgo sequer, vejo os alunos enchendo o caderno de post-it e os professores com suas vozes sonoramente apreciáveis e letras de dar orgulho. Vejo o coordenador passar de sala em sala com um comentário sarcástico e coração de pai, vejo meus colegas se amontoando em um canto na hora do intervalo compartilhando seus lanches trazidos de casa ou comprados na cantina, vejo os gatos pingados que continuam sentados e vejo meu reflexo nas canetas transparentes que estão desorganizadamente jogadas no estojo.
Eu vejo as pessoas e observo suas maneiras e elas são tão diferentes e tão únicas e tão em harmonia com o mundo ao redor delas. Eu ouço as pessoas com suas vozes uma sobressaindo à outra e escuto suas melodias tomarem forma nos nomes chamados em todos os pontos do corredor, da escadaria e da sala de aula. Eu aprecio as pessoas com todas as suas cores e tons de pele e tons de cabelo de loiro a violeta e tons de íris como castanho, verde e caramelo. Eu vejo as pessoas lapidando seus talentos e vejo a mim mesma sentada na biblioteca após o horário colocando matéria em dia e voltando para casa com dúvidas que não tive coragem de perguntar ao professor com seu carisma desejável.
Eu vejo as pessoas e observo seus passos e refaço meus erros ano após ano e andar acima de andar e me pergunto por que continuo na mesma cadeira azul com o uniforme branco e azul e sentindo-me azul enquanto inalo o ar violento dessa cidade ladeada por um oceano cor de petróleo. Eu inalo o oxigênio. Expulso o gás carbônico. Minhas células respiram em conjunto, meu coração bate compassado, meu pulmão expande, o diafragma comprime e meus órgãos trabalham em sincronia.
Nesse ínterim percebo: o meu talento é respirar; o das pessoas, existir.