Seja Bem Vinda
Mifanwy Thomas
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 28/10/16 13:22
Gênero(s): Terror ou Horror
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 9min a 12min
Apreciadores: 3
Comentários: 1
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Palavras: 1520
Este texto foi escrito para o concurso "Concurso de Halloween" No Concurso Oficial de Halloween da Academia de Contos, apoiado pela DarkSide Books, convidamos os participantes a escreverem textos no estilo "creepypasta", ou seja, obras detalhadas de terror escritas com o objetivo de assustar os leitores e deixá-los se perguntando o que é real e o que é ficção na história. Ver mais sobre o concurso!
Não recomendado para menores de catorze anos
Capítulo Único Seja Bem Vinda

Seja Bem Vinda

Liana não ouvia o que a mãe falava ao fundo, devia ser algo sobre uma amiga qualquer, não importava. Ela estava mergulhada em algo hipnotizante. Desde muito tempo ela tinha o hábito de navegar em sites de terror, só para passar o tempo ou para ficar sabendo de coisas assustadoras para contar aos amigos e rir quando ficarem com medo.

A notícia mais recente do mundo do bizarro era sobre o avistamento de pessoas fantasiadas de palhaço que vinham aterrorizando todo mundo nos EUA e, ao que parecia, estavam chegando à Europa e ao Brasil. Um arrepio agitou-lhe o corpo. Imagine só, voltar de sua faculdade à noite, descer do ônibus, estar andando distraída e dar de cara com alguém vestido de palhaço bem na sua frente? O que você faria? Diria alguma coisa, sairia correndo, gritaria?

Não eram exatamente os palhaços que assustavam nesse caso, mas a ideia de se chocar com algo tão estranho à noite, sem segurança nenhuma. Era isso que mais perturbava. A notícia do site vinha acompanhada de fotos e vídeos dos ditos palhaços e, obviamente, ela viu todas. As roupas coloridas, perucas e máscaras horrendas, tudo fazia parte do show. Ela pensou que não demoraria muito para proibirem a venda de fantasias - a coisa estava ficando séria. No fim da matéria, ela viu algo que lhe chamou a atenção: um link com um anúncio:

“Torne-se um Palhaço Assustador Você Também! Junte-se a Nós!”.

Ela deu um risinho. Seria verdade ou só um anúncio falso pra encher o computador de vírus? Passou o cursor do mouse algumas vezes sobre o anúncio: a ideia de se vestir daquele jeito e assustar os outros lhe parecia perigosa e atraente. Sorriu ao imaginar-se assustando a melhor amiga Mariana, rondando a casa dela em um fim de semana, mandando trotes. Se ela fosse um deles, queria ser a pior de todos, ou o a melhor, nesse caso. Havia um certo sadismo em meter medo nos outros que a fazia querer muito clicar no anúncio. E, afinal, o único modo de se não temer os monstros era ser um deles. Sem pensar muito mais, ela clicou. O navegador abriu uma nova aba. Não aconteceu nada por alguns segundos, e aí, de repente, a tela ficou preta e uma única frase apareceu: “Seja Bem Vinda”.

Então a aba fechou-se sozinha. “É isso?” pensou ela, um pouco decepcionada. Ela abriu o histórico para ver se conseguia voltar ao site, mas, quando o fez, percebeu que não havia registro da aba. Ela deu de ombros e desligou o computador. Sua mãe continuava falando. Ela foi até a cozinha e pegou água na geladeira, a mãe estava sentada à mesa.

- Você tá bem, filha? Liana bebeu um gole e respondeu:

- Tô sim, por quê? - Não sei... Você tá um pouco pálida e o seu nariz tá meio vermelho.

- Ah é? – ela correu para o banheiro. O que a mãe disse era verdade. Sua pele estava descorada e o seu nariz estava inchado e vermelho.

- Acho que vou ficar gripada.

- Tem remédio no armário, toma um – gritou a mãe, da cozinha.

- Tá bem – ela engoliu em seco, nervosa.

À noite, na faculdade, ela contou para Mariana, sobre o site e a notícia dos palhaços:

- É, eu vi isso – disse Mariana – Como pode ter gente tão maluca nesse mundo pra ficar aí, assustando os outros?

Elas andaram um passo na fila da lanchonete.

- Quer dizer, isso é sério.

- Eu cliquei no anúncio.

- O quê?! Por que você fez isso? – o tom dela ficou tão alto que as pessoas ao redor olharam para as duas.

- Sei lá, achei que ia ver algo legal. No fim, nem aconteceu nada. Só apareceu uma tela preta e um recado dizendo: “Seja Bem Vinda”, era mentira.

Mariana segurou o braço dela.

- Peraí, tava escrito “Bem VindA”? Como eles sabiam que você é mulher? Ela ficou em pausa, pensando. Aquilo era bem estranho. Talvez eles tivessem rastreado o computador dela, o que não fazia de tudo menos assustador.

- Ah, não sei. Bom, não aconteceu nada, é o que importa.

- Você é maluca – sentenciou a amiga negando com a cabeça.

A aula acabara e ela estava no ônibus cheio, ouvindo música e pensando na conversa com Mariana e na situação dos palhaços. Ela seria tão corajosa quanto gostava de afirmar? Achava que não. Alguns minutos mais tarde, ela apertou a campainha para descer do ônibus e sentiu um frio na barriga. Era tarde, e ela estava completamente sozinha. O medo quase a fez sufocar.

Ela desceu no seu ponto e começou a andar rápido pela rua silenciosa. “Está tudo bem” pensou consigo. “Nada vai acontecer”. Seus passos faziam eco na calçada e lhe pareceu por alguns segundos ter ouvido alguém atrás dela. Virou – se e não viu nada. Respirou fundo. Aquilo foi uma sombra? Não, foi engano. Andou mais rápido. À sua frente havia uma árvore, logo depois dela, uma esquina e enfim, sua casa. Logo estaria segura.

Mas assim que ela passou pela árvore, uma figura alta, em trajes coloridos e um sorriso enorme e maníaco, acertou-a com soco no rosto e tudo ficou escuro. Quando Liana acordou, estava deitada em um tipo de galpão e cinco criaturas olhavam-na através de seus rostos feitos de alegrias disformes.

Ela tentou se mexer, mas não conseguia. “Ah, Deus, não.” Pensou em desespero, em meio a um choro frio. Cinco palhaços fitavam-na com suas expressões mascaradas que só incentivavam o medo. Aquele que havia lhe batido usava uma roupa amarela e vermelha e tinha olhos totalmente brancos, vazios.

Ele se inclinou sobre ela e passou a mão enluvada em seu rosto, quase carinhosamente, o que a perturbou ainda mais.

- Por favor, não me machuca – implorou, chorando. Todos os outros quatro lavaram os dedos indicadores à boca, pedindo silêncio.

- Você é uma de nós – disse o quinto palhaço. – Deve parecer conosco.

Ele pegou do macacão uma pequena faca.

- Não, não! Não! – ela tentou se mover em vão.

O palhaço segurou o rosto dela e abriu sua boca, os outros o ajudaram a segurá- la. A lâmina arrancou a língua dela com facilidade e o sangue inundou sua garganta, ela bebia o próprio sangue ainda quente. Apenas grunhidos saíam de Liana, altos e estranhos. Ele seguiu cortando as laterais da boca da menina, removendo seus lábios finos. Ela tonteava, quase desmaiando de dor. Um dos outros palhaços saiu por alguns segundos e retornou trazendo uma almofada de veludo, onde havia uma pequena bola vermelha cintilante. O palhaço que parecia ser o líder espalhou tinta branca pelo rosto dela, que se misturou ao sangue. Ele pegou fio, agulha e o nariz de cima da almofada com cerimônia. Encaixou o nariz vermelho no dela e começou a costurar, devagar, com cuidado, pontos pequenos e firmes que perfuravam sua carne macia, enquanto os outros raspavam a sua cabeça livrando-a de seus longos cabelos cacheados e castanhos.

Quando a costura terminou, toda a confusão e o medo haviam a abandonado, ela apenas sentia paz. Eles a levantaram do chão e lhe trouxeram um espelho de mão. Quando ela viu seu novo rosto, uma parte bem dentro de seu ser quis gritar, mas não, ela apenas sorriu com sua boca sem lábios, seu nariz redondo e sua pele branca. “Se eu fosse um deles, seria a pior...” a frase ecoou em sua mente, parecendo de uma outra vida. Ela era um deles. Nada nunca mais mudaria isso. O grupo trouxe uma grande caixa de madeira para Liana e a menina abriu-a devagar. Dentro dela havia uma peruca azul-cintilante e lisa, junto com um macacão preto e roxo. Vestiu-se com ele e colocou a peruca. O que mais poderia fazer agora?

- Seja Bem Vinda! – disseram eles em coro, com vozes guturais e sem mover a boca. O líder entregou a ela um cutelo com certa reverência.

Ela segurou a ferramenta com força e simulou alguns golpes no ar. A parte dentro dela que gritava, calou-se de repente. Sem pensar duas vezes ela enfiou o cutelo no pescoço do líder da trupe. Os outros ficaram em choque, sem se mover, apenas assistiram o outro cair, com uma das mãos segurando o pescoço enquanto uma cascata vermelha descia por ele, tingindo sua roupa e molhando o chão. Ele caiu, seus olhos vazios fitavam Liana com ódio e, por fim, com nada mais. Os quatro palhaços restantes se voltaram para ela. Poderia ser loucura, mas ela achava ter percebido medo em seus olhares. Ela abriu a porta do galpão e fez um sinal para que eles a seguissem pela rua. Era sua nova líder. Eles andaram, no início, hesitantes, mas, com o tempo, ganharam mais confiança, seguindo Liana. Espalharam-se em direções diferentes, esperando e espreitando. Ela sabia onde os estava levando.

- Mãe, tem alguém lá fora - disse Mariana com a voz trêmula.

- O quê? Quem? – a mãe foi até à janela da sala.

- Eu não sei, é alguém vestido de palhaço, com uma roupa preta e peruca azul. Chama a polícia, mãe.

- Nossa, não acredito. Mas quem será que faria uma coisa dessas?

- Deve ser algum maluco – disse a menina sentindo um calafrio.

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Comentários (1)
Postado 16/10/22 06:01

O terror que essa mãe e essa menina passaram, meu Jesus, que medo...