“Vou pegar o trem de manhã”,
foi o que a menina de cabelo azul disse.
Aconteceu naquele prédio,
onde mora a menina que recentemente
pintou os cabelos de lilás.
Ali, naquela cobertura,
em uma noite estrelada,
testemunhava-as a lua enevoada,
beijaram-se bocas coloridas.
O primeiro e último beijo,
um adeus sofrido,
a memória de quem logo partiria
para Amsterdã.
Ouvia-se alguma banda indie,
os corpos dançaram na noite abafada.
Logo eram fios vermelhos e azuis
em um swing desengonçado.
Então eram lábios penosos
encontrando sua outra metade
num ósculo tão colorido
quanto o desconsolo comprimido.
Apaixonaram-se no verão,
e expressaram seu amor naquele dia outonal.
De manhã a ruiva não tinha mais vista
dos cabelos azuis que tanto gostava.
Partira para a Holanda,
não se sabe quando volta.
E enquanto não se tem notícia,
tem a memória da maciez de lábios
pintados de vermelho,
a cor de seu cabelo.
(Quando a moça de fios rubros foi ver o correio,
quase despencou ao ver a carta fúnebre.
A lembrança de danças azuladas não foi suficiente
para aplacar a dor de nunca mais aspirar
a essência doce de perfume;
ou então nunca mais tocar
os lábios de tão belo volume.)
“Moça de cabelo ruivo, dou então meu
au revoir.
Não fique triste, nem chore lágrimas azuis,
tenho certeza que um dia
ainda iremos nos encontrar”,
então a menina de fios azuis entrou no trem.