Era madrugada. O relógio na escrivaninha ao lado do rapaz marcava exatamente 4h30m.
Ele girava e se contorcia na cama. O suor fazia com que seus cabelos, agora brancos como a neve, grudarem em sua testa. Seus gemidos de pavor e dor eram os únicos sons no quarto. Estava acontecendo novamente, Min estava tendo outra crise.
Quando Yoon tinha 9 anos, sua casa foi invadida e seus pais foram assassinados. Após ser perseguido pelo assassino — um homem mascarado — por todos os cômodos, conseguiu fugir e se refugiar na moradia vizinha.
Além de perder as pessoas que mais amava, perdeu também naquele dia parte de sua sanidade e sua habilidade de ter uma tranquila noite de sono.
Se tornou um garoto perturbado atormentado pelos pesadelos que traziam a tona um passado do qual queria muito esquecer, mas não conseguia.
Park o encontrou quando estava prestes a pular da Banpo, dois anos antes. Se lembra de naquele dia ter brigado com seu pai por ter assumido sua sexualidade e ser posto para fora de casa após levar um forte soco do mesmo. Se lembra também dos gritos de sua mãe implorando para que ele não continuasse a bater em Jim. Caminhava sem rumo pelo centro de Seul, com lágrimas nos olhos quando avistou uma silhueta em pé no parapeito da ponte. Correu imediatamente em direção ao garoto, gritando para que ele descesse, mas o rapaz continuava ali, imóvel.
Chegou bem perto, segurou o braço dele e notou que seus olhos estavam fechados. Chamou por ele algumas vezes mas o outro continuava estático.
Foi então que se deu conta: o garoto era sonâmbulo.
Com cuidado, pegou-o no colo, o tirando da área de risco e só então o rapaz acordou, meio desnorteado.
Após entender o que havia ocorrido, agradeceu e se ofereceu para cuidar do olho roxo de seu salvador.
Foi a primeira vez que Park o salvou e, infelizmente, não foi a última em que Min precisou ser salvo. Muitas outras ocorreram e quando Jim menos esperava, aquela enorme sensação de proteção invadiu seu peito, tornando sua fuga daquele ciclo vicioso impossível de ocorrer.
Agora, dois anos depois, ali estavam os dois, morando em apartamentos vizinhos, ambos tendo uma péssima noite de sono.
Yoon se levantou cambaleando e completamente adormecido. Seus passos eram lentos mas, em sua mente, ele corria. Corria do apavorante homem mascarado.
Do outro lado do corredor, em sua cama, Jim viu-se envolto por uma terrível sensação. Fechou seus olhos e enquanto sua cabeça latejava, podia ouvir as batidas aceleradas de um coração, um coração que não era o seu. Suas mãos estavam tremulas e sua boca seca. Lívido, havia perdido a pouca cor que tinha. Uma sufocante dor tomou conta de seu peito, seu corpo pareceu pesar toneladas no momento em que lutou para se pôr de pé. Sabia o que estava acontecendo: Yoon estava prestes a morrer mais uma vez e ele era o único capaz de salvá-lo.
Descalço, correu por seu apartamento até chegar a porta e abri-la bruscamente. Fez o mesmo com a de Min, para, em seguida, vascular todo o lugar, não o encontrando. Lágrimas já escorriam de seus olhos, seu coração estava prestes a saltar de seu corpo.
Fechou suas pálpebras e procurou se concentrar. Era uma ligação mistica: ele ainda podia ouvir o coração acelerado de seu amado.
“Ele ainda estava vivo!” – Pensou e sorriu mas, seu sorriso se desfez ao lembrar de onde encontrou Min da última vez que o mesmo sumiu de seu apartamento.
O terraço. Subiu as escadas desesperadamente e quando abriu a porta desejou que tudo aquilo fosse uma grande ilusão de sua mente:
Yoon estava na parte desprotegida da construção e caminhava até a beirada. O prédio tinha quinze andares. Ele estava centímetros de uma queda mortal e não estava nem perto de parar.
Park corria enquanto gritava pelo seu nome, seus berros estridentes pareciam cortar sua garganta assim como seu desespero cortava sua alma.
Um dos pés do garoto já flutuava quando meio cambaleante, Jim estendeu suas mãos e puxou o rapaz, o jogando contra o chão do terraço.
Os segundos seguintes passaram em câmera lenta enquanto o grito desesperado do seu parceiro recém-acordado servia como a mais agoniante música de fundo.
Jim perdeu o equilíbrio, pisou em falso e tudo o que viu antes de cair foi o rosto apavorado de Yoon enquanto o mesmo tentou o segurar e suas mãos encontraram o vácuo.
A queda que durou instantes pareceu eterna enquanto ele se lembrava de tudo o que viveu com seu amado.
O início de um sorriso surgiu em seus lábios milésimos de segundos antes do impacto com o asfalto, que resultou na dissipação de sua vivência.
Por qual motivo ele sorriu?
É simples.
A realidade é que ambos tinham em mente que não viveriam por muito tempo. Se yoon não morresse por Jim não chegar a tempo, Jim morreria em uma das vezes que o salvava. Seja qual fosse das duas opções, um não suportaria viver sem o outro. Sabiam que estavam destinados a morte conjunta desde o dia em que assumiram seus sentimentos.
Min tentou convencê-lo a desistir dele mas era tarde demais.
Park morreria junto a ele ou estaria morto sem o mesmo.
Desde o começo Jim estava prometido a isso. Ele salvou Yoon diversas vezes e apenas aguardava aquela que seria a salvação final, seu último ato como prova de seu amor a Min.
Essa não é uma das histórias da Marvel e, infelizmente, Jim não é um super-herói capaz de salvar a todos e sair ileso.
Sim, ele já conhecia a triste realidade.
Já tinha em mente que na maioria das vezes, aquele que salva acaba não se salvando.
Mas se no final, quem Park Jim salvasse fosse Min Yoon, – mesmo que o outro também tivesse o mesmo destino em breve – não ser salvo não seria um problema.