Sinto-me preso, embora não haja correntes. O ar está rarefeito e meu corpo pesa. Vejo meus olhos vermelhos e o sofrimento continua. A felicidade momentânea que a droga proporcionou foi tão rápida que nem tive tempo de aproveitar. Após o primeiro gole, sinto o sabor da deliciosa bebida seguido da sensação de calor e agonia que o álcool presente em abundância proporciona. Brindo aos poucos momentos bons. Não vivo num deserto, mas me vejo sempre sozinho. Não vivo num hospício, mas me sinto e me pergunto se sou louco.
Talvez sim já que esse sofrimento eu mesmo quem causo. Egoísmo não é certo, mas de tanto chegar ao abismo resolvi me afundar em solidão e viver em meu próprio universo. Trancado em meu quarto eu continuo vivendo e sorrindo para os outros que não percebem que estou a ponto de explodir. Às vezes eu só quero que alguém diga: “Você está triste”. Trancado no quarto eu continuo olhá-los fingindo, não tão bem quanto eu, serem felizes. Observo-os fingindo se preocupar, observo-os dizer: “Eu te amo”, observo-os fingindo e fingindo.
Por que diabos os humanos mais fingem do que vivem? Continuo sobrevivendo e me questionando enquanto vejo a vida me levar. Me sinto um tronco sendo arrastado pela correnteza. Me sinto o próprio desperdício. Podemos observar bem, pois eu sou o exemplo vivo do que a tal religião azul diz: “O inferno é aqui”. Como posso continuar a suportar o peso desse objeto que carrego em meu anelar esquerdo?
O silêncio faz barulho. O silêncio perturba. O silêncio incomoda. O silêncio me permite ouvir o som das lágrimas caindo. Eu posso ouvir meu coração bater, meu sangue viajar pelo meu corpo, minha respiração arrastada, meus ossos rangendo, meus olhos piscando, engolindo a saliva... Esse silêncio maldito me deixa desocupado e com isso eu agonizo sempre que seguro um copo, quando aceno, quando escrevo... Ah! Por que eu nasci canhoto? Nem nisso essa maldita mulher me perdoa! Por que ela não me deixa esquecer? Eu não tive culpa! É verdade acredite em mim! Ela estava me traindo...
Ela fingia me amar, fingia cuidar de mim, fingia não se importar com nada além do nosso amor. Sinto que estou ficando louco! Eu vejo vultos, sombras e ouço vozes nesse momento. Eu estou ficando louco! Preciso correr! Preciso ouvir vozes! Preciso, necessito, exijo ver humanos. Eu quero me sentir vivo, mas essa solidão está me afogando!
Eu achava que eu suportaria viver estaticamente até morrer. Ledo engano! Sinto desespero, medo, anseio. O oceano agora invade minha mente, antes, que já não era lúcida agora mergulha completamente na loucura. Solitário e solidão. São minhas únicas companhias.
Acordo e cumprimento a loucura. Vou arrumar o cabelo e cumprimento o ego. Vou tomar café e cumprimento a solidão. Vou para o trabalho e cumprimento o vazio. Converso com as pessoas e cumprimento o fingimento. Pego o ônibus lotado e cumprimento o egoísmo. Volto para casa e cumprimento minha namorada. Uma linda Jericó me aguarda sobre a mesa sensualmente. Há tempos ela me seduzia, mas agora resolvi oficializar o relacionamento.
A arma que nunca falha é mais do que perfeita para mim. Ora, ela é tudo que preciso. Tudo que necessito é de um caráter que nunca falhe. Ela diz em meus ouvidos tudo que quero ouvir: “Você está certo”. Tomo-a em minhas mãos e sinto sua textura fria. Sinto o peso e o poder que ela me dá e gosto disso. “A solidão não me acompanhará no inferno” penso eu.
Sento no chão e miro na origem disso tudo e como qualquer covarde: “A culpa não é minha!” esbravejo na tentativa de espantar o medo que me acomete repentinamente. Olho para a minha namorada e ela me aguarda silenciosa. Aproximo o dedo do gatilho e xingo tudo o que vivi desde que nasci:
– Solidão, oh terrível solidão. – Pela primeira vez em semanas ouço o som da minha própria voz enquanto observo minha namorada sentir as batidas do meu coração.
Cerca de três segundos antes de apagar não cheguei a ver, mas pude sentir o líquido escarlate mudar a cor das paredes. Achei que atirar no coração fosse tão rápido quanto atirar na cabeça, mas agora vejo que morrer não é tão...