Puseste-me uma coroa demasiado grande na cabeça. Demasiado pesada, demasiado fria, demasiado escura, demasiado para mim.
É uma coroa de ferro negro e eu não lhe vejo beleza ou utilidade alguma. Se fosse de ouro, eu podia embeber-me de vaidade e suportar-lhe o peso, e ela podia contrastar com o castanho dos meus cabelos e realçar as nuances douradas que oscilam nos meus olhos.
Sendo preta, parece carcomer a luminosidade das minhas íris, e roubar a cor à minha tez. Assemelho-me a um fantasma de amarguras e não a uma mulher cuja grinalda de metal deveria conferir um ar régio.
Tu foste o cavaleiro que me aprisionou. Aquele que eu sonhei que me daria rosas, que me cantaria canções, que me escreveria poemas. O qual eu fantasiei que me cortejaria de maneira galante e contínua até conseguir, como prémio pela sua persistência e dedicação, a minha pessoa e o meu coração.
Eu nunca quis uma coroa — só uma de flores, feita pelas tuas mãos.
Agora estou cercada por um castelo de angústias do qual sou soberana dos teus e dos meus pesadelos. Antigamente era rainha de mim própria e dos meus risos, e hoje já não tenho risos para governar.
Onde está o amor que me prometeste em silêncio? Onde se escondem os risos que pensei que partilharia contigo? As nossas conversas e sonhos confessados à luz da lua, o beijo de bons dias que me deverias dar e não que eu te deveria roubar pela manhã, responde-me, onde está tudo isso?
Eu nunca quis um castelo — muito menos um de angústias —, viveria feliz no teu abraço.
Antes era amada por todos e por ninguém. Envergava vestidos de cor clara, para parecer inocente, e colocava flores na trança que fazia no cabelo. Inclinava-me na varanda, com os cotovelos delicadamente pousados na trave de pedra, e distribuía risos e sorrisos a quem passasse pela minha rua e os quisesse.
Os homens exibiam-se, montados na garupa de cavalos brancos, e acenavam-me com panos brancos. As mulheres trocavam tesouros comigo, como se fossemos velhas amigas; um colar por um xaile rendado, uma cesta de romãs por um pente de ébano. As crianças ofertavam-me flores para prender no cabelo.
E então apareceste tu, brilhante, montado num cavalo, com promessas que nunca verbalizaste, mas que eu julgava que cumpririas. Levaste-me para longe de tudo e, quando demos por nós, estávamos rodeados de muralhas. Assusta-me saber se estás dentro ou fora delas.
Eu nunca quis ser rainha — apenas uma mulher apaixonada, detentora dos teus afetos e coração.
Então, deita isto tudo abaixo. Por favor. Eu abdico da coroa que nunca quis, mas que não neguei. Queima o castelo, derruba as muralhas, permite que o sol entre na janela do nosso quarto e tenta esquecer a dor, mágoa, rancor e ciúme que te manchou.
Tenta esquecer isso, ou então, esquece-me a mim.