A figura refletida no lago acalentava seu coração e ao mesmo tempo a figura que se contemplava acalentava a outro coração.
Narciso tinha o poder ou talvez a maldição de pertencer a si próprio. Eco já não tinha tanto azar ou sorte, pois, pertencia a Narciso como Narciso se pertencia. A cabeleira agraciava aos dois, era belo como se movimentava como uma serpente ao vento. Os cabelos de Eco moviam-se como uma chama no seu auge, porém ninguém o percebia como Narciso.
Narciso era muito mais do que apenas um reflexo de si mesmo; mais do que sintomas narcisistas, e Eco o enxergava como o verdadeiro. Eco era muito mais do que apenas ecos ao tempo, era a personificação do amor que Narciso esbanjava de si próprio, porém Narciso não a enxergava como a verdadeira Eco.
Narciso, como o próprio narcótico, embriagava-se com a forma com que os lábios e corpo mexiam-se conforme a imagem refletida. Era incapaz de ficar confuso sobre o que acontecia; enxergava-o como outro. Como Eco enxergava-o.
Coexistiam em um mesmo tempo e espaço, porém não compartilhavam de noções reais sobre o que acontecia. Eco sabia que seus ecos não poderiam salvar Narciso de perder-se em si mesmo e Narciso desejava entregar-se de boa vontade a si próprio, assim como Eco desejava entregar-se a ele.
Foi incapaz de ajudá-lo quando a forma bela deslizou para dentro da água em busca de respostas e sentimentos recíprocos e em seu lugar havia apenas uma flor solitária, assim como o próprio Narciso.
Eco desvaneceu-se em pedra, fadada a ecoar os últimos sons e soltá-los ao vento.
Assim como Narciso, Eco perdeu-se de amor.