Eu carrego no meu peito uma tristeza
E carrego em meus olhos lágrimas ressecadas
Carrego em minha boca palavras impronunciáveis
Um apelo por ajuda, uma válvula de pressão
Ajuda-me a escapar, senhor, por obséquio
Necessito de ar, das montanhas, da calmaria
Deixa-me à deriva de uma estrada qualquer
Faz-me a gentileza de deixar-me só
Não tenho mãe, tenho uma estranha
Não tenho pai, tenho um convencido
Não tenho irmã, tenho uma conhecida
Não tenho irmãos, tenho dois amigos
Não tenho identidade
Não tenho história
Minha história é composta por um lado só.
Não tenho passado,
Embora tenha o presente,
Mesmo que o presente seja de uma visão só.
Eu carrego no peito uma angústia
E carrego em meu corpo sangue sem orgulho
Carrego em meus lábios mentiras
Falácias sem vergonha, palavras perfídias
Ajuda-me, senhor, por obséquio
Diz ao senhor meu pai meus sentimentos
Diz-lhe que estou sofrendo
Diz-lhe que estou morrendo
Diz-lhe que vou embora
Diz-lhe o que vou contar-te
Não tenho mãe, nem pai
Nem irmãos, nem irmã
Nem gato, nem cachorro
Nem tios, nem primos
Nem família pela qual sentir amor
Eu tenho mãe por certidão
E tenho pai por conformação
Tenho família por documentação
Sou viva sem ter benção
Diz ao meu senhor, meu pai
Que cansada estou
E que nessa casa não voltarei nunca
Se ele não admitir que é somente um pai
E esquecer a existência de minha mãe.
Ajuda-me, senhor.
Ajuda-me,
Pois já não aguento mais.