Moro numa cidadezinha do interior. Lugar calmo, pacífico, próprio para o cultivo do espírito. E todo mês me chegam livros da capital. É que comecei um curso de Filosofia lá na capital. E aprendi a cultivar meu espírito nas letras filosóficas e nas belas letras. Aqui aprendi a gostar de um cão, que passou à minha posse. E ele estava precisando de vacina. Chamei, através da empregada, uma veterinária para cuidar dele. Ela veio. Mas logo cismou comigo. É que ela tem o privilégio de ser Doutora. Numa terra de gente simples, uma Doutora pode, como ela fez, se colocar acima dos mortais. Mas, como dizia meu pai, arranjou, agora aguenta.
Eu já não aguentando as gracinhas dela, é que aqui no meu país, saiu dr. da faculdade, muita gente respeita como se o Dr. entendesse de tudo. E numa conversa despretensiosa, ela ficou sabendo que eu cheguei a frequentar a Faculdade de Filosofia. E ao invés de amiga, como a empregada dizia que era dela, passou a me por à prova. Claro que eu não gostei. Eu já tinha me acostumado à paz do lugar, e ao ver a Dra. me arguir, me por à prova, pensei: Qual é a desta Dra? E se ela está querendo competir em alguma coisa, eu já abandonei este espírito de competição próprio de outros lugares.
E tirei o dia de hoje para rezar. Rezei muito pedinto a Deus uma solução para o caso. E no mais me mantive fechado em casa.
Tal como imaginei depois, a Dra. veio. O título de Dra. pode colocá-la acima dos demais. Mas eu é que não tinha pensado nisso. Porque é o máximo de crueldade. Ela, antes de tudo, é um ser humano como nós todos. Dito e feito. Ela precisa comer, se vestir, pagar a gasolina do carro, alimentar a filha, e etc. E para isso, precisa de trabalhar. E o que vale o Dra. sem que ela colabore um mínimo para ter sossego para trabalhar. Notem bem, eu disse sossego para ela trabalhar. Era o que ela estava desprezando. E fazendo-a notar isto, as coisas se arranjaram. E aqui estou contando mais um conto.