Nos últimos tempos o que mais me deixa perplexo é a passagem do tempo. É como quando eu era criança e dormia no sofá, mas acordava na cama sem saber direito como tinha ido até lá, mas agora, a cada momento que passa estou fechando os olhos e, de repente, um ano inteiro passou. E de novo. E de novo.
Nos momentos que a vida não parece real, em especial durante as madrugadas insones cada vez mais frequentes, quando o mundo cai em silêncio e dorme, eu me pego revivendo esses momentos, afundando em sentimentos sem nome, carregados de nostalgia e saudade do passado. Nesse museu de memórias que apenas eu tenho, vou cada vez mais fundo em todas as exposições, admirando lembranças progressivamente mais antigas e desbotadas.
Nos momentos que a vida não parece real, eu me pego pensando como tantas coisas foram sumindo silenciosamente nas entrelinhas do tempo. Telefone fixo, orelhões, cartões de telefonia, recargas de celular, internet discada, jornal impresso, fotos reveladas, câmeras analógicas, CDs, MP3, celular de flip e até mesmo fios, seja lá de qual dispositivo estejamos pensando…e a lista segue em uma finidade de objetos que aos poucos deixaram de fazer parte da vida cotidiana.
Porém, algumas coisas resistem à passagem do tempo, tão resilientes e persistentes, teimosas, em transformação: rádio, bancas de jornal, polaroides, celular de flip (relançados numa estética mais contemporânea), jogos de tabuleiro, mídias impressas lutando e ao mesmo tempo se adaptando à internet das coisas.
As bancas de jornal são um caso especial. Elas ainda permanecem com a mesma arquitetura que sempre tiveram, embora já não mais vendam revistas novas todo mês, jornais, livros, histórias em quadrinhos e mangás. Não. Tudo isso migrou para o mundo digital. A vida continua, assim como as bancas de jornal, em constante transformação para ser preenchida por bugigangas que as pessoas não sabem que precisam até pôr os olhos nelas.
Tudo parece tão estranho, se repetindo em uma porção de coisas novas e brilhantes na monotonia dos dias.
Nesse mundo em que nada mais dura ou é tão bom quanto era antes, sinto que de repente acordei na minha cama depois de ter dormido no sofá. Sinto falta do futuro que não chegou, desejando voltar ao passado que desapareceu silenciosamente nas ondas do tempo.
Já não me reconheço nesse despertar, essa pessoa sem brilho no olhar não pode ser o "eu" que adormeceu tantos anos atrás. Me pergunto se, na verdade, eu fui a única coisa que desapareceu permanentemente nas ondas do tempo, talvez o "eu" que adormeceu um dia para não voltar seja a atração mais antiga no museu onde guardo toda essa saudade sem sentido.