Caminhei naquele momento com passos tão lentos, que uma chuva imaginária caiu sobre minha nuca, o rosto curvado para a frente, meu corpo estava anestesiado e meus olhos pareciam ter duas pedras ardidas com olheiras que me queimavam o rosto, o dia era cinza, e os sons eram abafados e distantes, a tarde já estava em sua pior fase, quando já se está escuro demais para se dizer laranja ou intermediária. Só os vales negros, distantes, pareciam fazer algum sentido no horizonte, era seco, sem vida, os sons foram sumindo, a noite caíra, o exterior já não fazia diferença, nem o interior, sua mente viajou para o universo, depois para os tempos passados, e ainda sim, estava caminhando na escuridão, a dor veio, e com, ela, uma ressaca pesada na cabeça, que dia ruim, murmurou para alguns passarinhos, saíra de casa para passear no domingo, e já estava de volta, olhou os próprios pés por alguns segundos, em frente à porta de sua casa, suspirou, a mão introduziu a chave na fechadura, que abriu com o giro de sua mão, ele entrou, bateu os pés, tirou a camisa e foi ao banheiro, entrou na ducha fria e sentiu o prazer daquela água percorrendo todo o seu corpo, se sentiu vivo, mas triste, enxugou-se, deitou na cama, a lua minguante já estava acesa no céu, e fazia um silêncio, de uma noite sem estrelas "o que ele queria?" "Porquê era tão difícil?" "Havia um sentido?", aquele dia era um ciclo, e seu vazio era silencioso, na verdade, não era exatamente triste, era a sensação nostálgica, daquelas que o corpo exige para se recuperar de um intenso estresse ou algo assim, não era tão ruim, ele estava grato, de alguma forma, por ainda ser ele, por ainda filosofar, em um universo extremamente amplo, em um lugar muito etéreo, precisava lutar, lutar, sentiu suas células, seus órgãos. Seu corpo estava musculoso, depois de tantas guerras, estava duro, o couro rígido, cicatrizes na pele, ossos que tinham quebrado e se juntado mais fortes, todos descansaram, descalço, com a brisa da noite entrando em seu quarto, com um frio refrigerador, seus músculos adormeciam, ainda com a toalha no ombro, sem previsão e sem fazer o restante de seus afazeres naquela noite de domingo, ele dormiu, e uma mulher de cabelos azuis e ondulados tocou uma harpa, o embalando em uma noite azul em um sonho ao redor de uma fogueira, com faunos festejando, alegres, andarilhos estranhos, velhas sem olhos, alguns amigos e ninfas maléficas, mas uma boa carne e vinho, e risos e mais uma cantoria que saía de seu quarto e se enrolava com a noite, ciclicamente, com estrelas faíscantes, de brilhos quase ensurdecedores, gritando em uma noite muito intensa, quase como o dia, o dia, não tinha sido ruim, mas contemplativo, saíra de casa se perguntando qual era a resposta, e voltara cansado, instintivamente sentindo, junto com a noite, e o dia e a vida, amanhã o sol irradiaria. Os sons voltaram e ele ressonava, guerreiro, descanse sua espada, venha cá, conte-me suas aventuras, o mundo é tão grande como dizem? O que aprendeu depois de tantos anos metafóricos? Durma, amanhã terá mais, talvez novidades, talvez conquistas, e a arpa da ninfa azul foi ficando mais intensa, e os sonhos, e o além, haverão mais aventuras, um ciclo, terras distantes, coisas incompreensíveis, há só o dia e a noite? O jovem guerreiro descansou, e as cortinas se fecharam, o show tinha terminado, alguns se emocionaram, outros ficaram pensativos, alguns se entediaram, mas estava findo, os aplausos vieram e os atores agradeceram, fim.