Você só quer a minha amizade,
enquanto eu me calar e te escutar...
Vive cobrando cumplicidade
sobre uma subjetividade,
que nem você mesma
é capaz de interpretar.
Faminta por resolver os enigmas,
que você deixa na caixa de perigos,
eu me esqueço de ser eu mesma...
e tudo vira um eterno
pisar em ovos
- para não te confrontar.
Mas eu ainda me sinto
como se fosse a pior de todas,
por não saber ler sua mente,
ou me lembrar de detalhes
do octagésimo sexto amor
que veio como uma luz,
(e que você apagou sozinha).
Se te escuto em silêncio,
sou culpada por não falar
o suficiente...
Se deposito em conselhos,
faíscas de bons sentimentos,
então eu me torno inconveniente.
Se digo não compreender o que se passa,
então não mereço o seu tempo,
se digo saber como você se sente,
então de repente, eu não sei de nada.
Em sua boca me torno agora:
a egoísta, a barulhenta,
a que não escuta,
a que não te sente, verdadeiramente,
ou será que é diferente?
Você já tentou amar alguém
que não seja apenas um relance
da sua idealização perfeitamente doentia?
Você conta os segundos na ponta dos dedos,
então queima a própria língua,
pois, você me mede apenas através dos seus próprios medos
e prefere que eu minta,
ou que eu apenas assinta:
sim, sim, sim - com a cabeça,
sem tomar responsabilidade ou me preocupar.
- estou triste
- sim...
- estou cansada
- verdade...
- estou farta
- é...
- quero morrer
- fatos...
- estou me destruindo
- está...
- sinto que estou perdendo tudo
- pois é...
- não vejo mais saída
- ...
Eu não sou o seu próprio eco,
pois, ecoar sua tristeza,
não me faz uma amiga boa,
me faz apenas a única telespectadora
de uma catástrofe pronta para estourar.
Talvez você não precise mesmo de mim,
talvez nunca tenha precisado nos últimos
dez anos em que a sua amizade,
abasteceu cada um dos meus dias.
Mas às vezes, querida velha amiga,
o problema somos nós.
E tudo bem admitir isso,
para melhorar e crescer, mas...
Você prefere culpar,
me culpar pela sua dor não cicatrizada,
culpar ela pelas respostas que não chegaram,
culpar ele pelas palavras que você não disse,
culpar outro pela sua instabilidade...
e assim o ciclo se repete,
e assim os laços se apertam,
e assim meu pescoço sufoca...
Mas se eu queimar essa ponte,
se eu virar essa página,
se eu fechar esse livro,
se eu trocar as trancas da casa,
nunca mais haverá volta.
Nunca mais poderei chamar
a sua amizade de lar...
Talvez eu tenha morado de aluguel
esse tempo todo, afinal,
sinto que venho pagando o preço
por não ser suficiente,
por não reagir como você quer,
por não ser perfeita...
Mas o vento me sussurrou
que nada nunca é suficiente para você:
nem amor, nem alegria, nem amizade, nem dor
nem tristeza e nem raiva,
nada preenche suas léguas de vazio...
E sempre que uma tempestade vem,
você soa o alarme, pedindo socorro,
me desculpe, velha amiga,
dessa vez eu vou pular do barco.
Isso eu aprendi com você.