Vessels
maddie
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 05/03/23 12:22
Gênero(s): Drama LGBT Romântico
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 3min a 5min
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Palavras: 600
Não recomendado para menores de catorze anos
Capítulo Único Vessels

Álvaro estava deitado na mesma clareira que deitava-se sempre que podia na estação anterior. Entretanto, agora a grama parecia tão menos verde e o lugar ao seu lado parecia tão mais vasto sem o moreno a seu lado.

Desde que ele havia partido, o sol partira para trás das nuvens, as árvores começaram a perder vida, as margaridas do campo secaram. Na última vez em que o vira, Tomas disse que o nome daquilo era outono. Álvaro odiava o outono.

Álvaro havia aprendido a palavra ódio também, ouviu de longe Tomas dizendo aquilo para seus pais durante uma briga. Ele não tinha certeza do que era naquele momento, mas sabia que era algo muito ruim para que o garoto tão doce falasse de uma maneira tão áspera. Álvaro entendia o que era odiar agora, e odiava estar sozinho, odiava estar sem Tom.

Desde que ficou sozinho, Álvaro nunca esteve tão triste. Cuidar das ovelhas era chato, mas fugir para a colina era pior. A grama não era mais tão verde, não haviam mais margaridas no campo, a floresta era escura e assustadora e o mar era revolto e azul escuro.

Ah, o mar. Álvaro odiava-o com intensidade, não havia nada de afável nele. Entretanto, mesmo o odiando Álvaro ia, dia sim, dia também, até o topo da montanha apenas para observá-lo. E o fazia com lágrimas nos olhos, sentado com os joelhos ao peito e o olhar zangado, feito uma criança. Ele desabafava tudo o que tinha ressentido no peito ao mar. Gritava, xingava, falava as palavras mal-educadas que havia aprendido com seu moreno. Moreno este que agora havia de estar em algum lugar entre suas ondas azul-anil.

E os barcos, aqueles que os dois contavam juntos, agora eram apenas monstros marinhos para Álvaro . Todas as embarcações — mais uma palavra que Tomas havia ensinado — eram motivo de ódio e esperança. Álvaro não desejava que monstros marinhos fossem reais e as atacassem, pois seu moreno haveria de estar em uma, mas desejava que as ondas levassem embora todas as outras.

Álvaro pedia ao mar, aquele que de repente havia virado seu confidente, aquele que segredara as mágoas de seu coração, para que levasse embora todas as embarcações que iam em direção ao horizonte. Entretanto, Álvaro pedia desculpas ao mar e pedia que guardasse e protegesse todas as embarcações que vinham do horizonte; Tom poderia estar em uma delas. Mesmo odiando o mar, o gigante cruel e azul era o único que podia trazê-lo de volta, e Álvaro rezava ao mar todos os dias que Tomas estivesse naquele barco a cada barco que se aproximava.

Mas ele nunca estava. Álvaro não sabia que ele sequer voltaria um dia. Tomas foi-se ao mar de madrugada, antes do sol raiar, antes de poder segredar mais algum segredo ao garoto dos fios solares.

Por isso Álvaro odiava, também, as madrugadas. Odiava tudo onde não havia sol, verão, grama verde ou Tom, e chorava sempre que sentia que demorava demais para amanhecer, pois à noite não conseguia enxergar se vinha algum barco ao longe. Odiava ter se nublado feito do céu de outono. Mas odiava, mais que tudo, as embarcações, tão faceiras, que haviam trazido seu único amor e depois o levaram de volta.

Não havia mais refúgio na colina que o acalmasse, nem mais sol para se banhar. O que restava era apenas a natureza cada vez mais cinza e moribunda, como um presságio daquilo que vinha à frente. Se o inferno existisse, seria uma tarde fria de outono, onde Álvaro está sozinho ao topo da montanha vendo o mar e nenhuma embarcação se aproxima.

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Notas de Rodapé

continuação de: http://www.academiadecontos.com/texto.php?id=7618

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