Os fogos de artifício enfeitavam o céu, comemorando a chegada do novo ano. 10L havia acabado e agora 10M vinha com tudo, prometendo sorte e amor aos homens e mulheres da cidade! Mas ela não era considerada mulher, e nem mesmo um homem. Talvez não a tivessem como humano, mas isso só eles poderiam decidir. O ser, que não se sabia se era vivo ou mexia-se através de comandos, levantou-se e caminhou até a entrada de uma antiga oficina. Parou em frente aos vidros e se observou. Em meio à tantas roupas, não se via, mas a tal criatura sabia. Sabia de sua perna esquerda, e do joelho ao pé direito. De parte da bacia e metade horizontal da barriga. Do antebraço esquerdo e boa parte até o ombro direito. E também seu pescoço, e a curvatura entre o dois. A parte externa da bochecha esquerda e toda a testa. Feito de metal, pregos e fios, e sabe-se lá mais oquê.
Sua boca, rasgada brutalmente de ambos os lados, com pontos inúteis e dentes tentando sair. O único olho natural -o direito- se encontrava pesado e com olheiras, desrespeitando a beleza da íris vermelha-sangue.
Talvez pensassem que era um monstro. Mas Sammy não era um monstro. Nem Alexia, nem Nickie. Estas eram as pessoas por quem já se passou para ficar em vários lugares da cidade.
Ajeitou os cabelos negros atrás da orelha, um dos poucos lugares feitos de sua própria pele.
-Eu sou um ser humano...-Balbuciava perdida em sonhos que tinha para quando crescesse, agora arruinados.-
Ela era assustadora. E o mais assustador disso tudo, era que mesmo sem boa parte de si mesma, conseguia ter beleza comparada a de uma princesa. Ela era assustadoramente linda coberta de membros falsos e sangue. Alguém nascida para o terror.
Foi puxada com força de seus devaneios por homens de terno preto, que acompanhavam um garoto digno de estúdios em Hollywood.
# Por favor, levem-na até o palácio.-Ordenava o menino.-
Surpresa, conseguiu dar um chute ao cara em suas costas, fazendo seu músculo doer. Continuou em uma pequena briga, roubando a arma de choque que o mais alto carregava. Não permitia que ninguém se aproximasse, impedindo-os com socos joelhadas. Mas chegar perto não era necessário: Uma mulher bem vestida a alguns metros de distância jogou um grande balde de água em sua cabeça. Travada, com o sistema chiando, ela caiu ali mesmo, nos braços de quem parecia ser o líder.