A coluna de Fabiano
Irvin Philos
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 21/12/22 20:19
Editado: 21/12/22 20:28
Gênero(s): Comédia Cotidiano
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 6min a 9min
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Palavras: 1099
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Capítulo Único A coluna de Fabiano

Telefone tocando...

— Alô?

— É o Fabiano?

— Ele mesmo.

— Aqui é o presidente, preciso de uns serviços.

— Estou a caminho.

Vestiu um terno cinza claro passadíssimo, uma gravata violeta com bolinhas brancas e sapatos pretos recém-lustrados. Pegou a maleta e correu em direção a porta. Passos rápidos, suor na testa, o elevador nunca pareceu tão lento.

Era 15:45 quando chegou ao gabinete do Presidente da República.

— Só com autorização prévia - insistiu o segurança.

— Ele me ligou há uns 30 minutos, pode perguntar.

— A ordem foi explícita, o Presidente não quer ser incomodado.

— Pô, cara. Estou um pouco apressado, me faz esse favor.

— Sinto mui...

Antes que pudesse continuar, sentiu que alguém punha a mão em seu ombro. Era o Presidente.

— Deixe o rapaz entrar, ele não está mentindo. Realmente fiz uma ligação, há uns... - olhada no relógio - 30 minutinhos, de fato.

— Tudo bem, pode entrar - abaixando a voz.

O Presidente e Fabiano sentaram-se frente à frente.

— Então, do que precisa?

— Fabiano, meu amigo, embora eu já seja o Presidente com maior grau de aprovação da história deste país, não acho que posso descansar ainda. Por isso, tenho um novo desafio para você.

— E que desafio seria esse?

— Sei, muito bem, que você conhece como a palma da mão o Shopping da Praça Central, aquele ilustríssimo, com suas enormes colunas e piso de mármore.

— Sim, conheço.

— Pois bem, eis o desafio: torne uma de suas colunas famosa, quero que o mundo inteiro a veja, a reconheça.

— Uma coluna? Sério?

— Exato, acha que consegue?

— Acredito que dou conta, algum prazo?

— O mais rápido que puder.

— Vou elaborar alguns projetos e ligo assim que houver algo concreto - piadinha? Talvez.

— Perfeito!

Aperto de mão sincero, tapinha nas costas e Fabiano saiu.

Chegando em casa, um beijo na esposa e logo partiu debruçar-se sobre a escrivaninha, faria a melhor campanha de publicidade de todos os tempos. Ideias para cá, ideias para lá, anotações, rascunhos, um copo da água e...

— Droga!

Derramou sobre os papéis, teria que reescrever. Sem problemas, fez em um piscar de olhos. Mais algumas horas trabalhadas, três xícaras de café, 2:00 da manhã, até que: voilà! Uma exposição artística em torno da coluna! Haveria performances teatrais, pinturas e estátuas de um lado, bandas do outro, etc., etc. Fabiano sentia-se empolgado. Tinha certeza de que o festival seria comentado pelo país inteiro. Na manhã seguinte, não perdeu tempo, saiu na corrida diretamente para um encontro com o Presidente, sequer ligou.

— Mas já?

— O senhor pediu que fosse rápido, trabalhei bastante e acho que temos algo promissor.

— Vamos, vamos, me mostre.

Abriu a maleta e lá estavam eles, os papéis. Na sequência, explicou detalhe por detalhe, com apenas 20 minutos de reunião.

— Inacreditável, ótimo trabalho! Começamos em 3 dias.

Mais um aperto de mão, mais um tapinha nas costas.

Nos dias seguintes: horas de organização, uma boa parcela do orçamento e café que não acabava mais.

Tudo pronto, agora era só... Mas o quê???

Meia dúzia de gatos-pingados, um ou outro morador de rua procurando comida gratuita e era o fim do 'glorioso' festival.

— Não se preocupe Fabiano, vamos tentar outra coisa.

— Como pode? Como pode? - incrédulo.

Fabiano não poderia esconder a desolação, mas seguiria em frente. Passou os próximos 5 dias e 5 noites absolutamente focado, desenvolveria algo infalível, o plano perfeito. Até que, finalmente uma nova aposta: um encontro de celebridades, seriam as maiores do mundo.

— Ótimo, ótimo, bom trabalho! - a mesma reação efusiva do Presidente da República.

As celebridades se reuniram, festejaram, mas certamente não eram as maiores do mundo. Enquanto isso, a coluna permanecia esquecida.

— Se acalme, meu homem! Vamos de novo.

Sobre Fabiano? Ainda mais frustrado.

Mas não desistiu, continuaria em frente. Dessa vez, mais 5 dias e 5 noites em pleno vapor.

— Inventarei uma história - dizia Fabiano.

— História? - questionava o Presidente.

— Isso, diremos que há uma lenda cercando a coluna. Falaremos de mistérios, segredos ocultos e tudo o que for poderoso na captura da atenção desta Terra.

De fato, capturaram a atenção, mas apenas a atenção de um grupo de esquisitões, daqueles com chapéus de alumínio, pulseiras quânticas e tudo a que se tem direito.

Na sequência: inúmeras tentativas, passando por desfiles de moda (uma das modelos usava um vestido em forma de coluna), eventos de pets, concursos de feiura e sei lá mais o quê.

Certa noite, a esposa de Fabiano entra no quarto e não vê o marido. Não, o que vê é um homem de 40 anos deitado no chão, em posição fetal, com a cabeça entre os joelhos, à lágrimas, gemidos e espasmos.

— Meu bem, mas o que é isso? - assustada.

— Coluna, coluna, coluna... - repetia incessantemente.

— Recomponha-se, por favor.

Aos poucos, Fabiano se reconstituiu, algo improvável sem a ajudinha da esposa. Tiveram que ter uma conversa séria, como adultos:

— Acho que esse trabalho não está fazendo bem para você.

— Esse trabalho é minha vida, meu amor.

— E eu não sou?

— Você também, com certeza.

— Acho que esse tal Presidente deveria dar uma sumidinha.

— Sumidinha?

Naquela noite, dormiram mais cedo. Quando a esposa de Fabiano acordou, ele já havia saído.

Foi ao encontro do Presidente, pois em sono sentira que recebeu uma inspiração divina, a melhor proposta de todos os tempos, a que marcaria o apogeu de sua carreira, de sua vida e da nação.

— Tem certeza? Permita-me verificar a agenda. - o presidente não poderia deixar de questionar.

— Lhe garanto, esta vez será a última, portanto quero fazer uma surpresa - convicto.

Saíram juntos. Fabiano havia dito ao Presidente que a surpresinha serviria para marcar a conquista.

Deixaram o Palácio em um carro blindado, descendo 6 quarteirões rumo ao Shopping da Praça Central. Subiram ao terceiro andar, avizinhando a famigerada coluna, Fabiano se preparava para expor a sumptuosidade da obra. Aproximavam-se mais a cada passo, enquanto a ansiedade do Presidente crescia a proporções astronômicas. Um pouquinho mais e lá estava ela, reluzente.

— Vamos nos achegar ao peitoril, a surpresa surgirá assim que olharmos para baixo.

Inclinaram-se sobre o abismo de 15 metros.

Com os olhos meio esbugalhados virados para baixo, a cintura projetada para fora e os pés apoiados na pontinha dos dedos, o Presidente pronunciava duras palavras de embasbacamento:

— Mas ora, não vejo nada... e, uoooooohhh – caiu deslizando.

O ligeiro 'empurrãozinho' de Fabiano fora suficiente.

Nos anos seguintes, milhares de pessoas visitaram a coluna sobre a qual o Presidente com maior grau de aprovação da história daquele país teve a cara espatifada. De tal magnitude a força do impacto que os dentes se lançaram para fora das gengivas. Ademais, construiu-se uma titânica homenagem de metal, capaz de acomodar as infinitas consequências de uma morte libertadora.

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