Assim que escuto o latido do menor galgo do outro lado da sua porta, subo em cima do muro porque, de lá, posso pegar uma ou duas laranjas para você antes mesmo que me veja de pé na grama. Somente quando subo em minha árvore, em cujos galhos ainda há flores para virarem os frutos que perfumarão sua casa, consigo olhá-la nos olhos. Quando desço, você me vê sempre de cima, porque é quase tão grande quanto a minha laranjeira e eu sou apenas maior do que os seus cachorros.
Os copos de leite escorados na janela me veem entregar-lhe as frutas e até eles recuam quando te veem chegar mais perto, mais perto e mais perto. Queria poder ver o sabor que elas têm na sua xícara de café segura em suas mãos angulosas e longas. Antes de descobrir qual o cheiro do sol nos seus cabelos, minto que quero ver os galgos e, por isso, me afasto, mas sem dizer nada para não acordar as borboletas que dormem à sombra.
De cima do muro, vejo como caminha, imponente, até o jardim que se desfaz em uma plantação de trigo dourado e mergulha no último pôr-do-sol da primavera. Contaram-me, no mês de setembro, sobre o linho fino trançado da sua saia e sobre como os gafanhotos se penduram no tecido das roupas no varal de corda. Lá, secam à moda do vento, que abana com mão preguiçosa o pescoço dos galgos na varanda.
Quando for verão de novo, torço para que as andorinhas nos visitem com seus rasantes envolvidos pelo vento vindo do mar siciliano. Os cães então irão latir, eufóricos, vindos de dentro de sua casa laranja como as frutas no pé do meu quintal. Me pergunto se você ainda vai querê-las quando não me sobrar nenhuma flor sequer.