O busto do Imperador, cujo qual ela não sabia o nome, a observava com seus atentos olhos de pedra. Hyejoo sentia o olhar a queimar como fogo, gelando a barriga e atiçando o farfalhar das borboletas que ali estavam. Suspirou, se aproximando da figura de mármore.

Delicadamente, quebrava os protocolos e acariciava, de mansinho, as feições de seu amado, esperando que ele, em seu passado histórico, sentisse os carinhos de seu presente. A estátua nada disse, mas continuou a observando, fazendo seu peito esquentar e arder. O apelidara de Nero, pois ele deixava seu coração em chamas.

Hyejoo tinha um coração puro, à espera de ser machucado. Machucado, quebrado, destroçado, sim, pois ela não suportava a ideia de um coração solitário como o dela era. Doía, e doía muito mais do que tê-lo em pedacinhos, ela sabia — dizia que sabia, pois não havia como descobrir sem sentir.

Por isso, Hyejoo voltava todas as tardes àquele museu, para seu amado e silencioso Nero. Queria poder lhe coroar com louros, ouvir seu coração de pedra bater e vestir-lhe a túnica, mas dali, do chão polido do museu, podia apenas sentir sua contemplação.

“Eu entendo, meu bem.”, ela dizia. Mas não entendia.

Hyejoo não poderia entender, afinal. Não sabia o que era o amor; sabia o que era amar, e assim, amava a ideia de um amor Eros que nunca poderia ter. Amava a ideia de amar e perseguia a ideia de ser amada. Criava seu Eros próprio, se forçava a acreditar nas próprias mentiras, em suas próprias histórias inventadas: seus melhores momentos, o auge de sua vida, tudo, havia se passado apenas em sua cabeça.

Mesmo que fictícios, lhe percorriam a mente como reais. Via Nero ao pôr do sol, lhe abraçando com as mãos duras e brancas de mármore. Sentia a pedra gelada aproximar-se de seu rosto, os narizes colados, a própria respiração batendo na pedra e voltando. O sol lhe agitava os cabelos, mas os dele permaneciam talhados na pedra. “Eu te amo”, sussurrava ela; não havia resposta. E nem precisaria de haver.

Comumente ia ao museu de branco, a cor de seu amado e a cor de seu amor — mesmo que o tempo o tivesse transformado em cinzento e rachado. Imaginava seu casamento com Nero, e, Nero, (em sua imaginação) prometia lhe coroar com louros. Ela queria, mais que tudo, poder lhe cobrar a promessa. (Mas ainda preservava a esperança em seu coração.)

Um coração solitário como o de Hyejoo preferia fingir histórias de amor-de-faz-de-conta do que encarar a própria solidão. Valia mais viver (dentro de sua cabeça) histórias de amor com aquela estátua de mármore branco do que deixar-se sozinho. Mais valia uma companhia solitária do que companhia nenhuma, por isso apreciava o silêncio de seu Imperador.

“Ficamos sozinhos juntos.” dizia Hyejoo a Nero. Mas ele não era Nero, mesmo ela sendo Hyejoo.

Nero, entretanto, do fundo de seus olhos e peito empedrados, se pudesse sentir, sentiria algum tipo de Ágape pela garota que lhe polia a superfície e enchia suas fissuras com suas lágrimas. Amor de autopreservação. Talvez dó, pela garota ter mais rachaduras que ele. Mas ele era apenas uma estátua, e estátuas não sentem nada.

E isso doía, partia seu coração em pedaços todas as vezes que via as rachaduras no mármore — e por isso mesmo ela continuava. Hyejoo preferiria ter um coração machucado do que solitário, pois mesmo que uma mentira doesse, doía menos do que o vazio que ali habitava. E o que é o amor, afinal, se não uma dor — boa ou ruim — que nos lembra que somos feitos de carne? — e carne dói, dói muito.