Jisoo sente os pés implorarem por uma pausa; ela não cede, segue com sua série de 100 giros. Ao final, zonza — não pelos giros, afinal, bailarinas não podem ficar zonzas, mas pela dor —, ela se olha no espelho. Está sozinha na sala, gostava de ensaiar de madrugada — a solidão era sua melhor tutora.
Assume a posição preparatória, bras au repos, e ergue a cabeça. A regata preta, o body azul, a transparente meia calça, o cabelo escuro como a noite preso num coque puxado, tudo parecia perfeito. Tudo tinha de ser perfeito. Jisoo não se deixaria não ser perfeita.
Segue com mais uma série, agora com menos giros. Enquanto gira, a sala repleta de espelhos roda em sua cabeça. A sua própria figura no espelho a segue, também girando e desaparecendo a cada volta. A cada volta, parecendo se aproximar. Cada vez mais próxima e mais escura, Jisoo encara a si mesma nos microssegundos durante os giros.
A sensação gelada do vidro já chega perto de sua pele, ela pode sentir seu inebriante toque frio centímetros à distância. Continua, giro, giro, giro.
Seu joelho toca no vidro, a temperatura, tão mais baixa que a do corpo, lhe dá um choque. A Jisoo do espelho não se abala, portanto ela também não. Giro, giro, giro. Crack.
O sangue escorre do joelho, ela não quer parar. Giro, giro, giro.
Jisoo cai ao chão, não consegue se segurar. Giro, giro, giro. A Jisoo do espelho continua, mesmo com a rachadura no vidro.
Seus olhos frios sequer a olham agora, a bailarina sempre mantém sua cabeça alta. Ela continua os giros, cada um deles com toda a perfeição que se espera. A Jisoo do espelho não se deixa não ser perfeita, a Jisoo do espelho não falha. Jisoo jamais será perfeita como seu reflexo.