"Os demônios devem dormir, ou eles nos devorarão; devem ser mergulhados no sono, ou nós pereceremos!"
- Edgar Allan Poe
25/12
XX:XX
Papai Noel não se esquece de ninguém.
Abro os meus olhos e tento me mover, o meu corpo está paralisado. Envio comandos para os meus pés e pernas, mas nada acontece, tento fazer um mínimo movimento com os dedos, mas o meu corpo todo continua entorpecido e pesado.
A minha respiração antes compassada pelo sono começa a acelerar, o quarto escuro parece se mover e a cama treme. Sinto a parte esquerda da cama afundar, viro os meus olhos e os comprimo tentando enxergar no escuro, mas não vejo nada.
Fecho os meus olhos e tento ajustar a minha respiração, mas fracasso e quando abro os olhos novamente o quarto antes envolto pela escuridão está colorido, repleto de luzes natalinas, elas piscam rápido e com uma frequência assustadora. Escuto o som da tela do meu smartphone desbloquear perto da pequena mesa branca em frente à janela, e então começa a tocar uma música natalina que eu não consigo lembrar o nome. A porta próxima a minha cama é aberta, o rangido da madeira encostada no chão, antes familiar, torna-se assustador. Tento ver pela minha visão periférica, mas é quase impossível.
Uma figura grande aparece no meu campo de visão, com roupas vermelhas, cabelo e uma enorme barba branca, mas não está sozinho, ele arrasta dois corpos vestidos com o que parece ser roupas brancas ou aqueles pijamas convencionais, mas que agora estão ensopados com sangue que coagula na roupa e pelo corpo. Uma criatura agora pequena entra no cômodo e oferece uma grande faca pontiaguda ao homem grande. O Barba Branca levanta e desce a faca repetida vezes cravando-a nos corpos dispostos no chão, as facadas frenéticas seguem o ritmo das luzes e da música como uma orquestra afinada em perfeita sincronia. Os meus olhos ficam absortos pelo que está acontecendo.
Tento abrir a boca e gritar, mas nenhum ruído sai pela minha garganta. Fecho os olhos em um acesso de medo e lembro que isso já aconteceu outras vezes e logo o meu corpo irá responder aos meus comandos. É apenas uma alucinação, vai passar. Mas assim que abro os olhos, o Barba Branca, agora com a barba tingida de vermelho sangue sobe em minha cama com a faca empunhada na mão e a coloca na minha mão esquerda. O seu grande corpo está inclinado sobre o meu, antes de sair do quarto ele sorri, mostrando seus enormes dentes sujos de sangue. O seu pequeno ajudante o acompanha. As luzes se apagam e música termina. Sinto o meu corpo ficar leve, quase flutuando, solto o suspiro pesado pela boca e o meu corpo desfalece na cama.
XX/12
XX:XX
Acordo desorientada em tempo-espaço, respiro lentamente e percebo que estou segura no meu quarto, consigo mover a minha cabeça e percebo que não foi uma simples alucinação. A faca suja com sangue ainda está na minha mão. Permaneço deitada sem ousar me levantar e ver se os corpos ainda estão no chão. Um pedaço de papel branco cai no meu rosto, levanto a mão esquerda para pegá-lo, a faca cai no chão fazendo um barulho estridente no assoalho de madeira e a minha mão pegajosa agarra o papel, um pedaço do meu diário, onde em um momento de fúria escrevi e pedi coisas que não deveria, mas como dizem: Papai Noel não se esquece de ninguém.