Eu sei que virei adulta agora que não invejo mais as pessoas, agora que sei que todo tipo de alegria é sagrada e merece ser vivida e principalmente compartilhada, se eu não tivesse tido coragem, poderia estar bem pior do que estou agora, é muito importante me lembrar de todos os passos que dei errado, até conseguir acertar aqui.
Não sei se é a vida ideal que sempre sonhei quando criança - uma hippie nerd extrovertidamente depressiva que está vivendo uma história de amor muito boa - ou se essa é a vida que eu aprendi a amar.
Provavelmente, as duas coisas.
Me lembro de toda dor e culpa com as quais eu tive de lidar por toda a vida, como eu era obssessiva por sucesso e sempre falhava, como eu odiava cada centímetro do meu ser com o mais fiel orgulho e a forma como eu normalizava sofrer por amor... Eu era tão cruel comigo mesma e com as pessoas ao meu redor, mas principalmente comigo mesma - arrancava minha carne com os dentes, sem dó.
Hoje em dia, tento sufocar com uma tonelada de fumaça - se é que isto é possível - todos os pensamentos que despertam monstruosidades em mim, eu tenho um amor para cuidar, eu tenho uma casa adorável para manter, eu possuo amigos, família e bichinhos... Preciso não só sobreviver, mas viver por todos eles - e principalmente, por mim.
Às vezes penso que esta guerra conta a escuridão jamais acabará, passo meses tão serenos, que me fazem questionar como eu podia ser tão assombrosamente destrutiva - mas então, há dias em que tudo volta e eu me perco momentaneamente.
Arrasto com os cotovelos, no chão rochoso da tragédia para sair deste espaço de puro ódio autoflagelado - sei que sou adulta, pois consigo sair, desta vez, sem tantos danos.
As respostas vem mais fácil, pois eu já sabia tudo, eu só precisava me lembrar... E organizar.
O amor, organiza a alma.
Eu não sabia que eu sabia cozinhar tão bem, ou pintar, ou cantar, ou limpar a casa ou organizar finanças, ou estudar, ou ter pensamento matemático, ou ser responsável ou ser saudável - às vezes você precisa se distanciar da família, para enfrentar a selva por si mesma, sem dicas nem histórias, apenas você, sua ansiedade e seu coração em processo de cura.
Me sinto desconexa, pois há muito THC à minha volta, curo todo sintoma possível com umas boas e profundas lufadas. Não ando mais descalça e uso mais meias do que calcinhas. Aprendi a comer todo tipo de legume e salada. E minhas vitaminas andam bem reguladas.
Acho que nunca estive em um lugar melhor do que este aqui.
Eu ainda não sei de muita coisa sobre a felicidade, ainda mais quando eu costumava estar caindo consecutivamente - agora estou aprendendo a andar na corda bamba, talvez eu consiga me sustentar até cruzar o picadeiro, talvez eu aprenda a odiar menos os palhaços, talvez eu pare de contar os meus segredos, talvez eu seja motivo de orgulho para quem eu amo.
Eu sei que virei adulta, pois isso não me amedronta mais.
Como eu desejava poder ter contado estes segredos para minhas versões anteriores - mas elas não acreditariam.
A felicidade precisa ser vivida em carne, senão se torna apenas uma ansia fora de controle.
Eu já vi de tudo.
Já senti o diabo por detrás dos olhos.
Já morri mais vezes do que sou capaz de contar.
Estou espanando o pó da minha alma agora.
Minha mente precisa começar a ser meu lar.