Inutilidade Cotidiana
Mariana Heloise
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 04/03/21 12:24
Editado: 04/03/21 12:27
Gênero(s): Drama
Avaliação: Não avaliado
Tempo de Leitura: 2min
Apreciadores: 3
Comentários: 4
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Palavras: 329
Livre para todos os públicos
Notas de Cabeçalho

Olá caros leitores, essa história pertence ao desafio do OPMP do mês de março, vulgo mês da música. Esse desafio musical foi diferente pois só usamos musicas nacionais, eu escutei minha musica e entrei em desespero pois estava completamente sem ideias, contudo, a inspiração bateu em minha porta e eu abri! A minha música foi "Dorme Com Essa" da Letrux, eu confesso que escuto bem pouco musica nacional então não conhecia.

Esse texto ficou pesadinho, eu acho pelo menos, então se for sensível não leia!

Esse texto não apoia suicídio, traição ou relacionamentos abusivos!

Link da música nas notas finais, boa leitura!

Capítulo Único Inutilidade Cotidiana

Desde que eu era criança, sempre tive a necessidade de ser útil, acredito que isso tem relação com a história do meu nascimento. Nenhum dos meus pais me queria quando descobriram a gravidez, eles se divorciaram quando eu tinha seis anos e embora minha mãe sempre falasse sobre isso num tom de brincadeira eu me sentia muito incomodada. Por isso, a sensação de que eu não deveria existir nesse mundo martelava no meu corpo, o que me fez pensar em morrer mais de uma vez, contudo sempre desisti, pois, se fizesse isso seria apenas mais um estorvo na vida desses pais que não me queriam. De forma que quando conheci ele as coisas não foram diferentes.

Eu me apeguei a ele, me apaixonei por ele, amei ele. Eu acreditava que era recíproco, então fiz o meu melhor para ser útil para ele, para não o irritar, para sempre o agradar, entretanto não funcionou, descobri as traições apenas dois meses após o início da nossa relação. Ele dormia com outras enquanto mentia para mim sobre estar ocupado, mas não me importei, afinal, eu queria ser útil então aceitei tudo calada, continuei nossa relação, continuei a dormir com ele, mesmo sabendo que tantas outras estiveram em seus braços. E mesmo eu aceitando tudo, ele se foi.

Em um dia como qualquer outro ele apareceu, disse adeus, explicou brevemente que iria sair do país para trabalhar em Lisboa e então se foi. Eu me senti inútil, novamente eu fora inútil.

E agora enquanto andava pelas ruas de Copacabana eu o vi, pelo menos achei que o vi e apenas esse achismo fez meu coração saltar para boca, parecia ele, mesmo que o cabelo estivesse diferente, quem sabe ele pudesse ter pintado? Contudo, quando passou por mim, não era ele. Quem sabe seja melhor assim, pois ele provavelmente mudou enquanto esteve fora e eu permaneci aqui, tão inútil quanto era no dia em que ele partiu e tão inútil quanto serei até morrer.

❖❖❖
Notas de Rodapé

música: https://www.youtube.com/watch?v=5D3KslHiHqY

Apreciadores (3)
Comentários (4)
Postado 04/03/21 13:29 Editado 09/03/21 17:37

Realmente... É um texto pesado e, infelizmente para muito mais casos do que jamais realmente saberemos mensurar , deveras representativo. E por isso mesmo, faz com que parte do peso imenso que esse peso evoca seja oriundo da tristeza que suas linhas possuem...

Às vezes as pessoas se sujeitam a tantas provações por um pouquinho que seja de reconhecimento... E mesmo depois de muito (ou até mesmo tudo) sacrificarem, simplesmente são descartadas como se fossem um pedaço de papel higiênico pós uso. E não me refiro tão somente a relacionamentos afetivos (como muito bem exemplificado neste precioso texto), mas no geral. É na amizade, é no emprego, na faculdade, é em tanta coisa...

E isso macula, mutila, destrói tantas vidas em N aspectos (às vezes literalmente) desde o Início dos Tempos... Falta empatia do próximo, falta amor próprio das vítimas, enfim, é um caos destrutivo e generalizado tão grande e surreal que até parece que existir positivamente é um privilégio inalcançável ou estritamente restrito a quem tem X pré requistos.

E o moedor de carne continua funcionando a todo vapor, com muita gente alegremente girando a manivela com um sorriso nos lábios.

Creio que esse assunto renderia uma análise e um debate tão imenso quanto o próprio fato/mal em si, então peço desculpas pela divagação pessimista (eu particularmente diria realista) e encerro lhe parabenizando por mais uma criação tão robusta e necessária, dada a luz que ela traz acerca de algo tão medonho e, infelizmente, cotidiano...

Muito obrigado por compartilhar conosco esta obra excelsa (na minha singela opinião), Srta Heloise!

Atenciosamente,

um ser que sempre sentiu sua existência como sendo essencialmente inútil na maior parte do tempo, Diablair.

Postado 09/03/21 17:22

Obrigada pelas palavras! Me trouxe mais reflexões! Obrigada!

Postado 13/05/22 19:25

Milagres: eventos cujas possibilidades são tão astronomicamente impossíveis, como transformar água em vinho.

Muitos passam a vida a esperar tais eventos, e ainda assim ignoramos o nascimento de uma vida humana.

Milhões e milhões de células competindo para criar, geração após geração.

Até que, enfim, um casal se ama, ou se odeia. E, então, desta contradição, contra toda a impossibilidade infinitesimal, somos nós que emergimos.

Destilar forma tão específica, de todo o caos.

É como tranformar água em vinho.

Sjow

Postado 02/06/22 16:53

Obrigada!

Postado 07/06/22 00:16

De nada!

Postado 13/05/22 19:35

Viver para ser útil é como viver a vida de outra pessoa, e quando vão embora se tornam fantasmas que vemos em reflexos. Sinto por isso, é difícil seguir em frente quando tudo o que tinha foi levado embora.

É primoroso, obrigada Mariana.

Postado 02/06/22 16:53

Obrigada!

Postado 14/10/22 16:21

Querida Mariana,

Esse ultimo verso foi tão real em minha mente que desbloqueou memórias esquecidas.

Obrigada por essa obra especial