Em 1977, quando vim da Casa da Infância, tinha 10 anos incompletos, no entanto, me sentia adulto, exibia um ar de guri de 14 anos.
Bom, sendo mais novo que meus habituais amigos, eu estava na quinta-série, portanto, o barbeiro Castro não rapava meu cabelo e, por trabalhar na olaria, escapava do pino e da enxada.
Numa bela manhã, o irmão Domingos apareceu com uma moto CB-400 novinha na olaria, hora de lanche e todos os guris, carregadores de tijolos, se chegaram para apreciar, um monstro de linda, deixou a moto perto do forno e foi ver o Carioca no artefato de cimento.
Eu e meus amigos ficamos ali e sonhando, rasgando as estradas da vida com o vento no rosto, que sonho.
Dali a pouco, voltou o Domingão, subiu na moto e constatou que havia acabado o combustível.
Raciocinou uns instante e teve uma ideia:
-Algum guri leva a moto para a administração e depois vou de carona no Fusca do Carioca.
Nesse mesmo instante, os meninos se perfilaram para a escolha, lado a lado.
Na fila estavam, eu, o Zé Brígido do 16, o Cezinha do 24, o Lucídio do 14, o Gibi do 19, o Gilvan do 19, o Celso Baiano do 24, e Edvaldo do 20 e o Ranho do 20.
Olha que turma, o irmão Domingos passou e repassou em revista a tropa, e na cabeça dele, o guri que representava menos risco de acontecer um acidente era a minha pessoa.
O Domingão era sábio mesmo, eu, no lugar dele, me escolheria.
_Não é para subir na moto e não coloca a chave na ignição.
_De jeito maneira irmão.
Uma moto daquele tamanho é pesada mas, fazer a volta no lago era moleza, no fim da vila dos funcionário começa uma árdua subida, eu me arrependi do voluntariado.
Ali, onde tem a entrada que vai para a assistência, termina a subida e começa a descida, parei nesse ponto para descansar.
Para não perder a chave, enfiei-a na ignição sem ligar, não ia ligar que, não sou doido.
Tive dificuldade para me sentar, muito grande aquele monstro mecânico, no me ajeitar, bati a mão na chave e ela ligou.
A descida começou a passar rápido e eu tentando equilibrar, sabia que um dos manetes era o do freio, virei com a mão pequena, os eucaliptos passaram mais rápidos, vendo na minha frente a casa do seu Reginaldo e sabendo que o final era inevitável, antes de fechar os olhos, pensei na minha frase favorita das horas fatais:
_Valha minha Nossa Senhora.
A moto se chocou contra a cerca viva que protegia a casa do seu Reginaldo, sequer me arranhei mas, fiquei contorcendo uma dor que me salvaria.
Em poucos momentos uma pequena multidão apareceu, o seu Felipe a me socorrer.
Agora não tinha jeito, o Domingão vinha com a cólera nos olhos, aquelas dores disfarçada agora iam ser de verdade, sem chances agora.
O Domingão olhou para mim, olhou para a moto e a gente sabia o fim da história.
Antes que ele despejasse a cólera, o seu Felipe entrou na frente.
_Irmão, melhor sumir com esse menino, a polícia não pode descobrir que ele guiava a moto...
Ah aquele careca querido, mais essa, eu devo a ele.