Seus olhos mortos afundam mais a medida em que me encara. Eles eram tão lindos — antes, brilhavam intensamente, banhados num amor túrbido. Agora, no entanto, sua frieza e rigidez transpassam pelo seu corpo, suas não atitudes em relação a esse relacionamento me causam a maior das tristezas.
É triste lembrar do passado, mas pensar num futuro sem ti não me agrada nem um pouco. Eras tão belo, meu amor, de porte alto e sorriso caloroso. Seus braços me esquentavam tão bem e, agora, vão manter-me farta por um bom tempo. Você sempre foi tão caridoso. E eu o amo por isso.
Não irei desperdiçá-lo, caso pense assim. Desmembrá-lo foi difícil, visto que seu porte não me ajudava, porém ainda bem que eu estava preparada — com facas próprias para o uso. Primeiro, fiz as demarcações e logo o sangue passou a escorrer. Você sabia, querido, que quando um animal está para ser abatido o estresse pode interferir na qualidade da carne?
Minha sorte, amor, é que você é tão bobinho… Sequer dei-lhe tempo para sentir o frio do machado contra sua garganta. Arrancar-lhe a cabeça foi tão fácil, amor e, acredite, preservei seu cérebro a fim de devorá-lo. Quem sabe assim nós nos conectaremos mais. Seremos só um.
Quando arranquei-lhe a primeira perna foi um alívio. Era uma pena, no entanto, que boa parte de seu sangue escorresse pelo ralo, sendo desperdiçado — espero que entenda, não teria-me muito uso. Seus braços foram os próximos e não pude evitar sorrir. Estava quase acabando e eu estava faminta. Guardei-lhe no freezer e parti para a melhor parte.
Finalmente suas pernas grossas me serviriam para um bom guisado, fora complicado separar a carne do osso, mas são só detalhes (e você não reclamou). O contraste do branco de sua pele com o vermelho do vinho era belo e, reduzi-lo com ele foi uma das melhores escolhas que fiz — oh, como você tão deleitosamente derreteu em meus lábios.
Dizem que você é o que você come e, por Deus, você é extremamente delicioso, querido.