CENA ÚNICA: INT. MANSÃO INFERNAL - MADRUGADA (01h30)
A jovem Tortura encontra-se em seu quarto, que só não está completamente escuro por conta de uma vela acessa na mesa de cabeceira. Ela bate freneticamente uma perna na outra, revelando sua crescente ansiedade, enquanto encara quase sem piscar a janela coberta por pesadas cortinas vermelhas, como se estivesse esperando um sinal divino.
TORTURA (sussurrando): Droga, Imperatriz, onde você está?
IMPERATRIZ (sussurrando): Essa senhorita aqui nunca se atrasa, mas não posso dizer o mesmo de seu namorado.
TORTURA (sussurrando, levemente sobressaltada): Que susto!!!! Por onde você entrou?
IMPERATRIZ (sussurrando e dando de ombros): Atravessei a parede.
[Tortura arqueia uma das sobrancelhas]
IMPERATRIZ (sussurrando): Tá bom, você me pegou. Entrei pela porta mesmo.
TORTURA (sussurrando): Caramba, não escutei.
IMPERATRIZ (sussurrando e cruzando os braços): Você anda com a cabeça nas nuvens desde que começou a sair com Blake.
TORTURA (sussurrando): Um dia você vai se apaixonar e eu vou fazer questão de passar isso na sua cara.
IMPERATRIZ (sussurrando com ironia): Eu não lhe daria esse gostinho.
[Antes que as jovens moças pudessem dar continuidade à discussão, um pequeno estalo foi ouvido no vidro da janela. Tortura caminha animadoramente na direção da mesma, mas é impedida pela Imperatriz.]
IMPERATRIZ (sussurrando): Espere! Pode ser o tio Diab querendo nos pegar no flagra. Se for Blake, ele que venha até aqui em cima, não é como se ele fosse aleijado.
[Tortura concorda e ambas esperam por outro sinal]
2 minutos depois...
TORTURA (sussurrando com impaciência): O que diabos ele está fazendo para demorar tanto?
IMPERATRIZ (sussurrando): E eu que sei?!
[Uma batida leve na janela é ouvida. As duas moças se entreolham. A Imperatriz vai até a janela e puxa a cortina, revelando Blake em cima de uma vassoura. A Imperatriz revira os olhos e Tortura corre na direção da janela, abrindo-a.]
BLAKE (sussurrando): Espero que a Ternura não se importe de pegarmos a vassoura dela emprestada.
TORTURA (sussurrando): Você demorou! Pensei que meu tio tinha te pegado.
BLAKE (sussurrando): Eu joguei uma pedrinha na janela e como você não saiu, decidi ir até o galpão para pegar a vassoura. Seu tio vai ter que substituir a fechadura…
IMPERATRIZ (sussurrando e cerrando os olhos): Você derrubou a porta, não foi?
BLAKE (sussurrando e coçando a cabeça): Foi um acidente…
TORTURA (sussurrando, preocupada): Será que o estrondo acordou o tio Diab?
IMPERATRIZ (sussurrando e dando de ombros): Creio que não, nós não ouvimos nada…
BLAKE (sussurrando e estendendo a mão para Tortura): Aposto que ele não ouviu nada… Idosos costumam ter sono pesado.
[Enquanto a Imperatriz soltava uma risada baixa, Tortura sobiu no parapeito da janela, sentando-se na vassoura a seguir. Após passar os braços ao redor de Blake, deu um beijo no rosto do rapaz. A Imperatriz revira os olhos.]
IMPERATRIZ (sussurrando com desgosto): Eu mereço… Escutem aqui, corvinhos apaixonados e fogosos, voltem antes do amanhecer. Vou ficar aqui até às 5h, pois amanhã Tortura e eu pretendemos começar o plano de morte de um certo presidente e o tio Diablair sabe disso.
TORTURA (sussurrando e lançando um sorriso para sua madrinha): Seremos pontuais, prometemos.
BLAKE (sussurrando e piscando para a Imperatriz): Obrigado por sempre nos ajudar! Vou lhe trazer uma faca rara na próxima.
IMPERATRIZ (sussurrando): Em vez de fazer isso, faz o favor de arrumar um carro.
[A Imperatriz fechou a janela e as cortinas. Tortura abraçou Blake com mais força e aconchegou a cabeça nas costas de seu amado, inalando seu perfume. Blake começou a subir lentamente com a vassoura.]
TORTURA (sussurrando, mas rindo): Você sabe pilotar uma vassoura?
BLAKE (sussurrando, mas com determinação): Estou aprendendo agora.
[Tortura desferiu um tapinha nas costas de Blake, mas assim que o casal alcançou o telhado, a atmosfera mudou. Tortura solta um grito, enquanto Blake empalidece. Em cima do telhado, encontra-se Diablair vestido em seu pijama, com os braços cruzados e uma cara de bravo que não poderia ser descrita.]
DIABLAIR (com severidade): É a terceira vez essa semana que você invade a minha casa para sequestrar minha sobrinha, e ainda é só terça-feira. Você não tem medo de morrer mesmo, Sr. Black.
BLAKE (tentando se explicar): Teoricamente eu não invadi. Estou do lado de fora…
DIABLAIR (gritando): CALADO, MALANDRO!
[O grito de Diablair atraiu a atenção das outras moradoras da casa que se encontravam com as cabeças para fora das janelas de seus respectivos quartos.]
TERNURA (com a voz sonolenta, debruçando-se sobre o parapeito de sua janela): Oi, Blake. Se você quebrar minha vassoura, eu quebro seu pescoço.
DIABLAIR: Isso seria muito útil, querida.
IMPERATRIZ (indignada): Caramba! Como você nos descobriu?
SARAH (levemente irritada): Ele está aí desde 00h. Me deixou sozinha aqui para poder pegar vocês no pulo. Que feio, crianças.
TORTURA: Tia, eu posso explicar…
SARAH: Você vai dizer que caiu acidentalmente da janela super arrumada e Blake te salvou heroicamente com a vassoura da Ternura? Inclusive, a vassoura estava trancada dentro de um galpão vigiado por seis guardas! Como você entrou lá, Blake?
BLAKE (sentindo-se orgulhoso): Um bom hunter nunca revela seus segredos!
DIABLAIR (para Tortura e Blake): Você, mocinha, está muito encrencada e de castigo. Sem assassinatos por uma semana! E você, hunter maldito sem um centavo no bolso, nunca mais vai pisar na minha casa para ver minha sobrinha.
BLAKE (cerrando os olhos) E se eu não obedecer isso?
DIABLAIR (com tranquilidade): Bom, eu te mato.
BLAKE (indignado): Você não pode me impedir de vê-la. Eu a amo.
[Diablair encara Blake com ódio. Ternura cantarola o Réquiem de Mozart. A Imperatriz está com as mãos no rosto, indignada com a descoberta do tio, se perguntando qual parte de seu plano perfeito havia falhado. Sarah lança um olhar de reprovação para o casal fujão. Tristeza espirra alto e todos olham para ela.]
TRISTEZA: Em vez de ficar sequestrando ela todos os dias, porque você não a pede em casamento, Blake? Sinceramente, não dormir me deixa muito melancólica…
IMPERATRIZ: Você fica melancólica por qualquer coisa, mas, sim, eu concordo com você, Tristeza.
DIABLAIR (indignado): Eu jamais permitirei que você se case com ela!
BLAKE (apontando o dedo indicador para Diablair): Isso não depende de você, demônio maluco!
SARAH (animada): Pela Deusa, preciso registrar esse momento.
[Sarah desaparece nas sombras de seu quarto e passa a procurar sua câmera pelo local.]
DIABLAIR (furioso): Você não tem onde cair morto, Blake! Você abdicou da sua carreira duas vezes, não tem casa e é uma bomba emocional ambulante!
BLAKE: E, ainda assim, mesmo com todas as minha falhas, eu me apaixonei pela sua sobrinha! Você mais do que ninguém deveria saber por tudo o que passei e o quanto mudei!
[Por alguns segundos, todos ficaram em silêncio e uma atmosfera pesada se instaurou no local, porém Blake desviou seu olhar do de Diablair e dirigiu-se a Tortura e, mesmo sem encará-la, a jovem sentiu seu coração bater mais forte.]
BLAKE (com determinação): Apesar de te amar muito, seu tio tem razão: eu sou um fracassado que não está aos seus pés… Por isso, quero me tornar digno de você e te dar uma vida confortável e feliz.
TORTURA (com a voz embargada de emoção): Ah, Blake…
[Tortura, completamente emocionada e na ânsia de expressar seu amor por Blake, deu um impulso que desregulou a gravidade da vassoura. Blake, que não sabia conduzir, empurrou o corpo completamente para a frente, fazendo com que a vassoura começasse a cair rapidamente em direção ao chão. Tristeza e Imperatriz gritam. Blake, no desespero de se segurar em algo para impedir a queda, agarrou o braço de Diablair, levando junto o ser infernal. Sarah apareceu na janela novamente e tirou uma foto bem na hora. A pequena Ternura subiu no parapeito, apontou as mãozinhas para o chão e gritou um feitiço.]
TERNURA: Pula-pula fofo, apareça e salve esses tontos do tombo!
[Um pula-pula rosa apareceu no chão, impedindo a queda mortal dos três. Ao ver a cor do brinquedo, a Imperatriz soltou um grito, horrorizada, e desapareceu nas trevas do quarto. Ternura deu uma risadinha maligna pela reação da Imperatriz. Tristeza chorava de rir na janela. Sarah encarava Ternura com reprovação.]
SARAH: Quem te ensinou essas palavras feias?
[Ternura começa a assobiar, descendo do parapeito e desaparecendo da janela, simplesmente fingindo que sua tia não havia falado com ela.]
DIABLAIR (com ironia): Eu estou bem, querida. Muito obrigada por perguntar.
SARAH (com deboche): Você é imortal, portanto essa queda não te mataria. Aproveite esse pula-pula e durma do lado de fora já que não quer dormir comigo!!!!
[A mulher fecha violentamente a janela, assustando Tristeza, que corre para sua cama.]
DIABLAIR (furioso): Eu vou te matar, Blake.
BLAKE (com tranquilidade): O destruidor de sonhos aqui é você.
TORTURA (rindo): Tio, você está em uma enrascada.
DIABLAIR (suspirando): Você tem razão, jovem fujona.
VOZ DE FUNDO: Esse foi um dos muitos episódios em que Blake “invadiu” a casa de Diablair para escapar com Tortura, porém, após essa fadada madrugada, sua dedicação em sua carreira de hunter, outrora perdida, retornou. Ele queria estar com Tortura, mas desejava que ela tivesse uma vida confortável e pudesse ter tudo o que quisesse. Apesar de saber que ela mesma poderia conquistar sozinha todas as riquezas do mundo, ele queria poder fazer o mínimo para satisfazê-la, evitando, desta forma, os erros cometidos em dias longínquos.
O líder Infernal, após passar a noite no pula-pula rosa, acabou pegando um resfriado. Tortura, após alguns meses, tirou sua licença para dirigir vassouras, enquanto a Imperatriz apresentou seu novo namorado vampiro, que foi gentilmente arremessado pela janela por Diablair. Sarah nunca mais ficou sem sua câmera por perto e, inclusive, a fotografia tirada nesta pacata madrugada de terça-feira, encontra-se pendura no enorme corredor da Mansão Infernal, onde Tristeza e Ternura adoram correr e relembrar das bizarras histórias vividas naquela casa.
FIM.