Ficar tanto tempo fazendo isso chega a ser doentio. Acho que enlouqueci. É, é sim. Só pode.
E quem não ficaria insano ao ver um cadáver masculino brutalizado, violado e abandonado como se fizesse parte dos infindáveis dejetos deste quase interminável aterro sanitário?
E eu não fiz somente olhar: observei a deplorável putrefação ser acelerada pela intensidade atípica do verão paulistano. Vermes vicejando das e nas feridas da tortura para se fartarem no jovial banquete de carne falecida, o viscoso chorume se unindo ao sangue coagulado e às gotas de sêmen ressecado em um sinistro banho póstumo, o inacreditável fedor dos detritos acumulados sobre o morto se convertendo em um miasma insuportável ao se mesclar ao odor peculiar e pungente da decomposição, a desfiguração absoluta causada por este escárnio de enterro em um lugar imundo e cujo clima quente, seco e aflitivo que perdura só faz tudo piorar.
Quantos dias já se passaram desde que isso aconteceu? Não faço ideia. Tantos cortes, hematomas, deflorações, apodrecimento... É tão horrível! Tão monstruoso! Não creio no que vejo. Em COMO vejo! Simplesmente... Abominável.
Ouço vozes ao longe. Olho em volta. Outras pessoas! Grito à plenos pulmões. Gesticulo inúmeras vezes. É dia de novo, então intensifico meus esforços: com sorte, talvez verão.
E então finalmente encontrarão meu rançoso e irreconhecível cadáver.