Ela sempre me dizia o quanto o amava e cria naquele amor, e eu, tolo pai que sou, acreditei neles também... Eu deveria ter previsto, deveria ter sido mais atento às noites que ela voltou chorando e de repente, no sia seguinte, eles estavam "bem". Bem que eu poderia ter sido mais intruso, metido o nariz velho de pai aonde não sou requisitado... Mas como dizer não para aqueles olhinhos que eu vi abrir pela primeira vez? Para aqueles doces lábios miúdos que tantas vezes limpei o suco derramado, o molho de tomate salpicado, o sangue que de algum dentinho de leite recém arrancado, escorreu?
Ainda me lembro dela ter me implorado para que eu a deixasse ir até Porta Rossa para comprar um belíssimo anel de noivado... Eu desisti de ralhar que ele é quem deveria dar o anel, fazer o pedido, assumir o pacote completo, comprar as passagens de trem, dar a maior quantia para começarem uma vida nova, não é machismo, é apenas consideração... Amor... Mas ela me jurou, sabe... Jurou com toda alma que o amor era recíproco, que ele só estava sem dinheiro, mas que ia fazê-la tão feliz quanto eu fui com a mãe dela...
Inventei meu pecado. Obedeci minha filha.
O sangue dela agora corre por entre meus dedos, suja minhas roupas, meus sonhos, minha existência... Doce sangue de inocência.
A alma dela está adormecendo no rio Arno... E a culpa, nem mesmo dele é... E sim minha...
La colpa è mia.
Ela me deixou um bilhete, na manhã que ele resolveu encontrá-la, eu bem notei, nos nós da minha barba que o tempo havia mudado... Que algo estava diferente na atmosfera, no sol, nos pássaros que pararam de cantar.
Mas eu disse "Filha minha Deus te abençoe e te guarde, agora vá..."
Semanas depois, sem qualquer notícia dos dois, até a dada hora, ouvi dizerem, entre os cantos, em sussurros, que ele fugiu... Sozinho... E ela...? Aonde poderia estar?
Foi então que mais tarde, recebi um telegrama. Peguei em mãos trêmulas aquele papelzinho amarelado, nele estava escrito
"Caio em prantos e sofro tormentas!
Oh, Deus, preferiria morrer!
Pai, tende piedade, tende piedade!".
Mas já era tarde... Tarde demais para não tê-la deixado partir...