Tʜᴇ Vɪʟʟᴀɪɴ Oғ Pʀɪɴᴄᴇ
Pʀᴏ́ʟᴏɢᴏ
Certa vez, quando tinha os meus dez anos, ganhei um livro de uma tia distante. Eu mal a conhecia, mas ela havia se tornado minha pessoa favorita após ler o livro. O Jardim do Príncipe era um romance de época, cheio de magia, aventura e uma trama muito viciante. Lembro-me que devorei o livro de quinhentas e cinquenta páginas em cinco dias, chegava a me entusiasmar todos os dias para ler depois da escola e antes de dormir. Não havia figuras ou imagens, apenas palavras que descreviam um mundo totalmente diferente e deslumbrante. Naquela época, tudo que eu queria era mergulhar dentro do livro e vivenciar a trama no corpo da mocinha e assim, acabar me casando com o príncipe.
E durante toda a minha vida, eu lia e relia aquele livro. Era o que eu fazia nas noites tristes ou quando não tinha nada para fazer. O Jardim do Príncipe sempre esteve na minha escrivaninha, preservado. Mesmo que suas folhas, ao longo dos anos, amarelassem, nunca me desfiz daquele livro que tanto gostava. Tornei-me uma apreciadora de livros por causa de uma tia que nunca mais vi na vida, nem ao menos pude lhe agradecer por me proporcionar várias horas de leitura apaixonante.
E agora cá estou eu, sentada em frente á um espelho com bordas de ouro, encarando um reflexo que não é meu. A última coisa que me lembro antes de acordar em uma cama estupidamente grande, era correr pela rua em direção á escola de minha irmã. Estava á poucos minutos antes no trabalho, um hospital militar onde eu servia como enfermeira chefe. Atendi uma ligação informando que Bianca, minha irmã caçula, havia agredido alguém. Tive que largar o meu posto, por que minha irmãzinha podia ser levada a delegacia se eu não comparecesse. Mas ao atravessar a rua em plena faixa de pedestre, um carro desgovernado que fugia de uma perseguição com a polícia, acabou por me atropelar.
Eu morri.
Eu acho.
Mas agora, estou olhando para minha própria imagem e não me reconheço. A imagem no espelho fazia todos os meus movimentos e expressões faciais. Não tinha como negar que era eu, mas também não era meu corpo. Eu, Eliza Santiago, tinha vinte e cinco anos. Meus cabelos tem a tonalidade castanha e meus olhos são verdes, tinha a pele bronzeada e o corpo desenvolvido por treinamento militar. Mas este corpo, o corpo que encaro no espelho, tem uma idade muito inferior a minha. Parecia que estar em sua adolescência, o que me incomodava muito, já que odiei a adolescência.
Ente corpo tinha a pele pálida, como que nunca tivesse ficado no sol. O corpo era pequeno e em formação, sendo assim, os seios ainda eram pequenos assim como as mãos. Mãos macias e sem vestígios de calos ou cicatrizes. Os cabelos de ébano eram longos e se ondulavam na ponta, a mesma que ia até abaixo do ombro. Boca rosada sem nenhum cosmético, rosto fino e um par de olhos incrivelmente hipnotizantes. Pareciam gotas de sangue em uma pedra de rubi, brilhantes, intensos e perigosos.
Eu tocava aquele corpo, não conseguindo acreditar o que estava acontecendo. Era algum tipo de alucinação, só podia ser. Eu estou em coma e tudo isso era fruto de minha cabeça. Já que toda essa face que me encarava de volta e este quarto assustadoramente luxuoso, me fazia recordar das cenas do livro.
Corri os olhos pelo quarto grande e parei na escrivaninha ao lado da janela, disparei até ela e vasculhei os papéis que ali dispunha. Meu coração quase parou ao encarar a assinatura da dona deste corpo, peguei o papel e quase o enfiei na cara de tanto incrédula e descrente estava com aquilo. Voltei para diante do espelho e novamente olhei o reflexo de Vanda Vllamir, a vilã do meu querido livro O Jardim do Príncipe.
Engolir em seco, isso só podia ser brincadeira. No final do livro, antes do final feliz da mocinha, a vilã é executada pelo próprio príncipe.