É uma situação muito complexa, Mei, porque nem todos os profissionais da saúde têm esse posicionamento. Nós temos que lembrar que eles estudaram para estar ali e estão exercendo essa profissão tão árdua muitas vezes sem os meios precisos (não é segredo para ninguém o quão precária é a área da saúde). Nem todos os médicos e enfermeiros aplicam certas formas de tratamento porque querem, mas, sim, porque é necessário. Nem sempre é sobre dinheiro, é sobre querer desesperadamente salvar alguém.
Meu namorado é enfermeiro e eu perdi a conta de quantas vezes ele chegou em casa transtornado, triste ou simplesmente esgotado depois de um dia cansativo no hospital. Uma vez, uma das pacientes que ele cuidava morreu por conta do câncer e ele desabou quando me contou a respeito. Não é somente a saúde do paciente, mas também a do profissional. A gente tem que lembrar que eles são treinados para ver a vida e a morte, muitas vezes, em um só dia e é culpa deles tentarem fazer o suficiente para salvar alguém?
Os pacientes em estágio terminal tem toda uma estrutura diferenciada de tratamento. Eles sabem que vão morrer, mas a medicina e a enfermagem trabalham com aquela mínima porcentagem, aquela esperança de 1% que pode virar o jogo e simplesmente trazer alguma forma de melhora para o paciente condenado. Por isso, todos os dias tem os remédios, as injeções e os exames. Existe a constante procura pela melhora, porque, veja bem, se um médio porventura vier a desistir de um paciente, ele vai sair como o culpado, afinal nós temos tecnologias que podem provar que um paciente foi deixado ao relento quando estava melhorando. Se um médico desiste de um paciente, pra que diabos precisamos de médicos?
Não penso dessa maneira somente porque meu namorado é enfermeiro, mas também porque o meu pai tem câncer e eu cresci em hospitais acompanhando o tratamento dele. Muitos falaram que ele estava condenado, mas a única médica que realmente estudou o caso dele viu que tinha uma saída. Eu poderia ter perdido o meu pai se ele tivesse acatado todas as sugestões médicas acerca do caso dele, mas isso não aconteceu, porque houve insistência, houve uma voz que fez com que ele entrasse em um tratamento que possibilitou a melhora dele em 100%.
Sinto muito que a sua experiência nesse sentido tenha sido ruim e lamento muito pela sua perda, mas não acho certo condenar todos, afinal nem todos os profissionais da área são assim maldosos e invasivos. Nós temos que nos lembrar que há muito respeito e carinho também, além de um esforço imenso por parte desses profissionais. Se para nós, parentes, é difícil ver alguém que amamos naquela situação mortal, imagina o quão devastador é para o profissional que constantemente cuida dessa pessoa, sem poder expressar seus sentimentos, que conhece/estuda o caso e não pode fazer absolutamente nada para reverter tudo isso? Posso te responder com muita convicção que não é fácil para os profissionais da saúde, principalmente quando eles lidam com pacientes em estágio terminal. Eles sofrem na mesma medida e, sinceramente, não acho que seja culpa deles tentarem fazer o suficiente e mais um pouco para tentar salvar alguém. Óbvio, ao ver um profissional com uma má conduta, é fundamental que a família denuncie e busque meios para que esse indivíduo seja mandado embora e barrado em exercer a profissão. Caso a família e o próprio paciente sintam-se incomodados com a forma de tratamento é muito importante contatar a pessoa responsável pelo caso e abordar como eles e, principalmente o paciente, querem lidar com a situação. Se não me engano, pacientes em estágio terminal continuam o tratamento caso essa seja a vontade da família e, em caso de lucidez, com o consentimento do paciente. Nada é feito contra a vontade humana nos hospitais, porque, apesar de haver sim muita coisa podre lá, existe uma burocracia imensa que eles devem respeitar e a maior delas é a vontade do paciente e familiares - além do respeito a vida que nem deveria ser citado por ser óbvio.
Espero que meu ponto de vista tenha ficado claro e, por favor, não entenda que estou te apedrejando. Prezo muito pela liberdade de expressão, mas acho fundamental mostrar os dois lados da moeda. Então, achei interessante trazer para a discussão essa minha experiência como namorada e como filha.
Muito obrigada por compartilhar essa obra conosco e possibilitar toda essa discussão. Como sempre, você traz pautas incríveis para serem analisadas.
Parabéns, mil vezes, Mei ♥