Viver é tão difícil, tantas obrigações, responsabilidades, tantas coisas que você pode ou não fazer, só porque pode ofender o outro, nós devíamos ser sinceros, não é mesmo? Independente de se vamos ofender alguém ou não.
Nossa, nem me apresentei, me chamo Pedro Gondim, possuo vinte anos e moro no Rio de Janeiro, no Brasil. Vivo sozinho, sai da casa dos meus pais aos dezoito anos, no Rio Grande do Sul para cursar medicina na UFRJ, aqui no Rio de Janeiro.
Sempre tive uma vida muito monótona, tão parada que até tive medo de virar criadouro do mosquito Aedes Aegypti, eu quase não saia, afinal, sair sozinho não é legal, e eu nunca fui muito bom em fazer amizades, meus pais, sempre ocupados trabalhando ou indo em festas, nunca tiveram tempo para mim.
A única pessoa nessa vida com quem eu me importava era a Joana, uma empregada que trabalhava em minha casa desde que eu nasci, e cuidava de mim como um filho, mas ela morreu poucos anos antes de eu sair de casa, me deixando sozinho neste triste mundo.
Na faculdade eu era sozinho, chegava, assistia a aula, ficava no meu canto, sozinho, concentrado em tentar acabar aquilo o mais rápido possível, ficar o menor tempo possível perto das pessoas, afinal, é impossível entender como eles se comunicam, todas as regras sobre o que falar, ou o que não se pode falar, regras como: “Se uma menina te pergunta se ela está gorda, você sempre diz que não, mesmo que ela esteja”, qual o sentido da pergunta, se só tem uma resposta? Eu nunca entendi isso.
Pode até parecer, mas eu não gostava de ficar sozinho, eu só gostava de poder dizer o que eu quisesse, sem ser julgado, menosprezado ou excluído. Por isso eu amava Joana, ela não se importava com o que eu dizia, nunca fez aquela cara de horror quando eu disse algo que para outros, era um pecado de ser dito.
Mas agora só existia eu, apenas minha alma, sozinha no mundo, sem ter com quem conversar, discutir ou qualquer outra besteira que pudéssemos fazer. Eu sentia falta disso, da companhia, do amor que ela me dava, das nossas conversas, do brigadeiro de panela.
Me lembro como se fosse hoje do trote da faculdade, eu, aquele menino de preto, quieto e silencioso no seu canto, torcendo para aquilo logo acabar, não fazendo ideia do que ainda tinha por vir.
Nos levaram para a casa de alguém, separaram os meninos das meninas, nos obrigaram a tirar a roupa, nos molharam, no começo pensei ser água, mas depois reparei que era urina, aquele liquido verde, fedorento e nojento sobre nós.
Prefiro não citar o que mais fizeram conosco, afinal, pode se dizer que foi algo desumano, depois daquilo, percebi que uns dez, de oitenta calouros, não foram as aulas, desistiram do curso, e eu presumo que foi por causa do trote.
Já estávamos em junho quando eu reparei que viver já não tinha mais sentido, tinha todo um medo ao redor da morte, mas para mim ela era a salvação.
Muitos acreditam que existe uma vida após a morte, e se realmente existir, eu vou me reencontrar com a única pessoa que me entende, se não existir, se for como alguns falam, que após a morte tudo acaba, também vai ser bom, afinal, o fim de algo ruim é sempre bom, sempre esperado.
Comecei a pensar como eu faria isso, se seria através de remédios, corte, tiro na cabeça, uma faca enfiada no coração, pular de uma ponte, me asfixiar, entre outras coisas. Eu tinha um leque de opções, só precisava escolher.
Optei pela overdose, nunca tinha experimentado nenhuma droga, nunca quis me viciar e ter uma vida pior do que a que eu tinha, mas percebi que aquele era o melhor modo, pois dizem que usar drogas é algo muito bom, muito louco, uma experiência única, e porque não ser essa experiência a que iria me salvar?
Primeiro fiz uma carta, dizendo aos meus pais que os amava, uma mentira, mas pelo tempo que eu vivi vi que aquilo era o certo a se fazer, disse também que aquilo era culpa deles e tudo mais que um suicida escreve em uma carta.
Depois eu tinha que comprar drogas, e o lugar mais fácil de achar era no campus da minha universidade. Comprei todo tipo de drogas, desde cocaína e êxtase, até LSD e maconha.
O mais estranho é que eu estava me sentindo feliz, um sentimento que eu não sentia a muito tempo, e o que todos achavam errado, eu achava certo, era a minha salvação.
Cheguei em casa, coloquei uma musica alta, um rock, não me lembro muito bem qual musica era, mas eu gostava. Deitei na minha casa, com todas aquelas drogas ao meu redor, eu acho injusto chamar de droga, afinal, droga é algo ruim, e isso era algo bom, enfim, enquanto estava deitado, curtindo a musica, comecei a usar um por um, cheirando, fumando, comendo, dropando, injetando, todos os verbos possíveis para a utilização de drogas.
E eu senti aquela onda, senti aquele sentimento que todos falavam e que eu nunca tinha experimentado, e era bom, realmente bom, você se sente leve, feliz, único, e toda a sua tristeza vai embora.
E eu me senti livre, como nunca tinha me sentido antes.