me peguei observando
os olhos mortos deste corpo que
me encara de volta, com pena...
sua face é vermelha, seus olhos são um poço, sua boca tremula e o coração em seu peito apodrece
a mais grandiosa perca de tempo:
respirar com pressa
pois nada nunca para, os segundos nunca param de rodar
num momento hospitaleiro, descanso meus olhos pensando que a semana nauseante se passou, e quando percebo, é domingo. 23h59. pisco os olhos. segunda-feira.
quero me enforcar nos ponteiros do relógio.
quero me dilacerar, e dilacerar esse corpo que me fita, que a propósito, é meu.
sim, e não há nenhuma surpresa, sou eu que encaro, pelo canto destes olhos,
este encargo que sou
enquanto no reflexo do espelho,
o encargo se lamenta, por sermos uma só
fiz de meu leito, uma maternidade de pesadelos
e dores e fomes e saudades
quis vomitar tudo que possuo em minha alma esfarelada
mas tudo que consegui foi chorar até o emudecer das palavras
quis ver minha pele retalhada em escarlate
imaginei-me sem um só fio de cabelo castanho-avermelhado
(sem mais apelidos carinhosos, tenho horror, a cada cacho)
desejei-me desfigurando com os punhos minha própria face
mas nem me destruir perpetuamente consigo,
o que me resta é perpetuar neste vazio com aroma industrializado de vida
me resta ansear pelos dias que já quero que acabem
pelos minutos que desejo que se que virem pó
pelos segundos que freneticamente abençoo por já terem voado
voltei a me incomodar
estando presa a este chão
os corredores barulhentos me vêem correr cada vez mais depressa,
os sinais de trânsito têm medo de me ver chegar
pois eu sou o mais catástrofico acidente
que não cessa de incendiar.
meus ossos poídos com unha de demônio,
demônio este que me atormenta em qualquer lugar
ele assassina minha alma em cada indesejado pesadelo medonho
quando estou dormindo, não consigo descansar,
e eu, continuo me encarando com pena de mim mesma
encarando este hospício que chamo de lar
encarando meu corpo cansado e meu rosto arrebentado de dor e saudade,
eu desejo ter um ombro para chorar.
mas não há ombro que mereça o peso dos meus dias
não há bom coração que mereça me ouvir lamentar
eu faço minhas pausas apenas para encharcar meus olhos no banheiro
e toda decisão certa que tomo, faz outra certamente, desmoronar.
e eu estava bem certa, sobre o que disse em outra desventura depressiva: a vida é um grande, eterno e último suspirar
o suspiro eterno. eternos 19 anos suspirando, estou roxa, já sem forças para fazer qualquer lado de meu pulmão trabalhar
alguém. por. favor. desligue. o. ar.