Era uma bela ilha, que apesar de ser um dos pontos turísticos, parecia tranquila. Dividida entre mansões, pequenas casas, pescadores e restaurantes.
Numa das minhas conversas com os moradores, fiquei encantado com as histórias, porém, uma delas chamou a minha atenção.
Uma "sereia" rondava o caís do pequeno lugar. Por vezes, podia ser vista das varandas das mansões.
Geralmente aparecia no final da tarde, quando o movimento de barcos no local ia diminuindo.
Soube que nunca conseguiram captura-la, apesar dos grupos de vigia que ficavam próximo aos locais onde ela mais aparecia.
Perguntei aos moradores se algum deles já tinha chegado próximo a sereia, e eles, disseram que ninguém conseguiu viver para contar.
Em meio a minha curiosidade e espírito aventureiro, sigo caminhando e investigando os locais das histórias, sempre escutando os avisos dos pescadores.
No finalzinho de tarde, depois das histórias e fotografando os lugares mais lindos da pequena cidade, decido parar para descansar na beira da praia, próximo a um dos caís.
Pretensioso eu sei... Mas algo me dizia que a minha curiosidade iria me levar longe.
A calmaria nas águas salgadas da praia e o vai e vem das ondas, trazia uma paz indescritível.
A água era tão cristalina que dava para ver os peixinhos nadando por ali, mais a frente, caminhando entre as grandes pedras, pude contemplar uma espécie de piscina natural.
Foi quando escutei um leve barulho. Olhei para baixo e pude ver o belo rosto me observando.
Ela sorria para mim, era como um convite. Eu estava hipnotizado por aquele olhar, então sem saber muito bem o que estava acontecendo, desci de onde estava e me joguei no mar calmo.
Pude ver que ela estava se aproximando devagar. A água se agitava ao redor do meu corpo e podia sentir que a temperatura já não era a mesma.
Foi quando vi algo furta-cor passar no meu lado esquerdo, era como um peixe porém maior.
- Encontrou o que procurava? - ouço o som da sua voz pela primeira vez.
- Quem é você? - pergunto.
- Não respondeu a minha pergunta.
A bela mulher, ao qual ouso chamar de "sereia", me observa com atenção.
- Sim, encontrei o que procurava. Quem é você?
- Que bom que você me perguntou "quem é você" ao invés de "o que é você". Me faz pensar que seu respeito é maior que a curiosidade...
Ela sorri para mim mais um vez e tudo o que consigo é admirar a beleza dela.
- Meu nome é Serafim. E você, como se chama?
- Me chamo...
Sou interrompido por ela, que agora está chegando mais perto do que antes.
- Posso ver seu passado. Se esconde algo debaixo de sete chaves, eu vou saber. Também o seu futuro, basta olhar no fundo dos olhos por algum tempo. Vocês humanos não sabem mentir... Então me diga marinheiro, ainda quer que eu desvende a sua alma?
A voz não era tão aveludada e também não era tão sensual como contavam nas lendas. Era firme.
- Eu não sou um marinheiro. - tento responder com certa dificuldade. Ela sorri e se aproxima.
- Todos vocês são apenas marinheiros, velejando por águas desconhecidas. Por mais que conheçam as praias, que construam seus paraísos particulares, nunca vão conseguir chegar tão fundo...
Fico sem palavras, tudo o que sei é olhar para aquela criatura magnífica, minha curiosidade para com os dons dela chega a ser maior que os meus medos. Percebendo meu interesse, ela volta a perguntar.
- O que você quer saber?
Quando tomo coragem para finalmente perguntar, sou interrompido.
- Mas lembre-se, se quiser uma resposta terá que pagar por ela. Não me refiro aos seus bens, mas preciso de algo em troca.
- O que você quer em troca?
- Quero algo precioso, quero o seu coração marinheiro.
- Não entendo...
- Se não entende então por que quer saber do seu futuro?
Decidi tomar coragem e perguntar o que mais me amedrontava.
- Se tiver meu coração, ainda viverei?
- Hum. - ela murmura, agora a sua voz é aveludada e seu olhar hipnotizante.
Ela gira ao redor do meu corpo e a água se agita um pouco.
- Dependendo do quanto de amor guardar no coração... Possa ser que sobreviva.
Não consigo responder, agora sou todo confusão.
- Você é jovem e eu entendo que esteja confuso, mas eu posso te ajudar. Gostaria de ver a minha coleção meu rapaz?
- Onde?
- Não aqui na superfície.
- Não iria conseguir, não sou como você e não conseguiria respirar embaixo d'água.
Ela sorri se aproximando cada vez mais, repousa uma das mãos no meu rosto e acaricia o mesmo.
- Seu ponto fraco... Você sabia que o meu beijo pode ser mágico? Ele poderia te levar a outros universos... Só deixe eu te beijar e você descobrirá o que habita nas profundezas.
Decidi me entregar, eu queria ver meu futuro, queria saber o que existia para além daquelas águas.
- Então me beije...
- Atenderei ao seu desejo.
Seus lábios encostam nos meus, é mais doce do que eu imaginava. irresistíveis... Então, sou puxado para o fundo.
Posso ouvir os sons, o colorido dos peixes e observar a bela criatura que puxa meu corpo para as profundezas.
Seus olhos são escuros e os cabelos assim como a sua calda são furta-cor. A pele agora brilha e ouço uma melodia calma e serena, a qual me faz esquecer todos os sentimentos ruins que algum dia tive.
Depois de um certo tempo, consigo visualizar a beleza do fundo do oceano e alguns pontos de luz interessantes. Até que enfim percebo que não existe nenhuma coleção...
Como um passe de mágica voltamos a superfície, não estou com medo mas acabo percebendo que passei em um dos seus testes.
- Ah meu marinheiro, hoje provou o quanto é corajoso. Venceu os medos, esqueceu das suas dores passadas...
- Eu te dou o meu coração. - estou apaixonado por aquele mistério de extrema beleza.
- Eu já o tenho. Você não é como os outros, se fosse não estaria mais vivo. Aqueles que não voltaram a superfície se perderam no mar. Eu os levei para conhecê-lo, mas a ganância e o poder não deixaram que eles vissem.
- Como assim?
- Você é curioso... Como eu. - ela sorri - Eles nem pensaram em mergulhar, esperaram a melhor oportunidade para me capturar.
Ela mostra algumas cicatrizes perto do pescoço e na calda.
- Quando olhei a vida que eles tinham descobrir coisas perturbadoras. Ganância, egoísmo e mentiras, mas não qualquer mentira. Eles fingiam amar, contavam sonhos falsos, enganavam e eram confusos. Não sabiam se realmente amavam. Quando nós dúvidamos do amor, não amamos plenamente.
- Posso contar sobre você em meu diário?
- Ah, claro que pode. Só não esqueça de mim e eu prometo lembrar para sempre de você... E de como seu coração é bonito.
Não tenho tempo de lhe prometer nada, Serafim me dá um beijo no rosto e coloca uma pequena concha nas minhas mãos, vai embora sem olhar para trás e nesse momento tudo o que sinto é felicidade.
Volto para a areia analisando a pequena concha e sorrindo de saudades da sereia misteriosa que roubou meu coração.