“Sentimental Lions”( o principe leão)
Dois leões repousavam sob as estrelas da savana.
“Você se parece com o sol”, Namibia lembrou de ter dito isso para Tuka enquanto caçavam antílopes mais cedo do mesmo dia. De sentir o sol queimando na juba. Mas agora que a lua estava alta no céu, o único jeito de se esquentar era ficar perto da juba de Tuka.
-Sinto medo, Namibia, como nunca senti antes.
-O que houve?
-Hoje enquanto caçávamos, vi pegadas de homem, não te avisei porque não queria assustá-lo.
Namibia fitou o horizonte:
-Sim, meu pai me disse, é temporada de caça outra vez. Devemos ter mais cuidado.
-Eu sei, mas estou com um pressentimento ruim.
O vento do oceano chegou soprando suas jubas e a vegetação rasteira da savana.
Tuka fitou o horizonte dos olhos de Namibia:
-Já falou com seu pai?
-Ainda não.
Os dois se olharam, mas o olhar de Tuka persistiu mais; e o de Namibia, voltou ao horizonte.
-Acho que isso me dá mais medo do que morrer pelos caçadores.
-Não importa o que ele diga, vamos ficar juntos. - disse Tuka.
Namibia percebeu que a juba de Tuka era tão reluzente que alguns mosquitos buscavam calor ao redor dela. O resto da noite foi puro silêncio e amor, até o sol despontar no horizonte.
De manhã, Tuka foi embora, e Namibia foi encontrar Handak, o rei dos leões, na caverna:
-Pai, está acordado? - Ele temeu encostá-lo.
O jovem leão aguardou por uns minutos ele acordar, até este soltar um bocejo, que mais pareceu um esnobe rugido, e se espreguiçar.
-Pai?
-Namibia? Há quanto tempo está aí?
-Cheguei agora.
Handak bocejou mais um pouco. A luz do sol fazia sombras enormes dos dois nas paredes da caverna.
-Bom dia, pai. - disse curvando-se, apesar de odiar aquilo.
Handak passou por ele e caminhou para fora, deixando-o se levantar. Namibia, cuja mente estava dividida entre preocupação e convicção, juntou-se ao pai na beira da caverna, onde os dois saldaram o sol.
-O dia está lindo hoje. - disse Handak
-Pai, tenho que te contar uma coisa, mas não sei como dizer, parece que minha mente é limitada pelas minhas palavras. - sua voz se tornou dramática.
-Namibia. - Os olhos vermelhos do rei penetraram no olhar dele, que sentiram-se intimidados, mas não cederam.
O sol queimou mais forte. O vento moveu montanhas e desapareceu com todos os animais da savana, sobrando só eles dois.
-Eu estou com medo. Eu quero que você entenda.
-Um leão não tem medo. Namibia, fale comigo. - disse Handak , que parecia estar com mais medo que o filho.
-Você sempre me disse que eu não poderia ser rei sozinho. E eu não vou.
-O que está querendo me dizer?
-Eu vou governar com Tuka ao meu lado.
Ao ouvir isso, o corpo de Handak cresceu sobre o filho.
-Namibia, onde você passou essa noite?
-Isso não importa. Você tem que me escutar.
-NÃO! - Handak rugiu tão alto que ondas gigantescas se formaram no oceano.
Ele se aproximou mais do filho, que se sentiu cercado por todos os lados.
-Pai, meu peito dói. Estou com medo.
Handak ficou gigantesco:
-Se eu encontrar aquele leão, vou matá-lo.
Diante daquela ameaça, a postura de Namibia também ficou mais forte e ele cresceu por cima de Handak.
-NÃO! - seu rugido foi tão alto que as nuvens se abriram e se formou um arco-íris alto no céu. - Eu amo ele, e não tem nada que você possa fazer para mudar isso.
-Você não é um leão. Você não é meu filho.
Namibia não cedeu sua posição no chão, mas teve que reunir forças para continuar:
-Se ser um leão é parecer com você, eu prefiro ser uma hiena.
Handak perdeu o controle e voou suas garras sobre o filho, girando-o no chão.
EU NÃO VOU BRIGAR COM VOCÊ! - rugiu Namibia.
Usando suas patas traseiras ao seu favor, ele conseguiu empurrar o pai para dentro da caverna e correu para longe.
À distância, ouviu os rugidos do pai:
VOCÊ ESTÁ MORTO PARA MIM, MORTO!
Quando à noite chegou, trouxe a escuridão com ela. Namibia não conseguia entender porque seu pai tinha agido daquele jeito, e imaginar Tuka em perigo só alimentava seu ódio. Seu peito sangrava onde Handak tinha enfiado suas garras, no entanto sentia que a verdadeira dor era causada por algo muito mais profundo que um ferimento, e desmaiou de cansaço.
No meio da noite, ouviu alguém chamar pelo seu nome.
-Namibia.
Com um susto, o príncipe leão acordou desorientado, demorando para recuperar sua consciência.
-Namibia.
Era Tuka. Ele reconheceria aquela voz mesmo que se passasem duzentos anos.
-Tuka.
-Sim, Namibia, sou eu, você perdeu muito sangue, não se levante.
-Tuka.- ele estava forçando sua voz e corpo havia muito tempo, e ouvir a voz de Tuka depois de tudo que passou o fez finalmente ceder. - Eu te amo - e se descontruiu em lágrimas.
Os dois adormeceram juntos e passaram o resto da noite sobre a grama rasteira da savana e sob a luz das estrelas. Namibia sentiu que era impossível alguém separá-los.
Na manhã seguinte, Namibia acordou de um sonho misterioso. Nele, um leão estava morto no chão. Essa visão o fez temer pela vida de seu parceiro.
Apreensivo, o jovem leão acordou Tuka:
-Nós temos que fugir.
-O quê? Por quê?
-Handak disse que vai matá-lo na proxima vez que te ver.
-Namibia, eu vou nos proteger.
-Não, por favor, nós temos que ir agora, levante. - disse Namibia, empurrando as costas de Tuka com a cabeça
-Não, nós não precisamos fugir, eu já disse, eu vou te proteger custe o que custar. Eu não tenho medo.
-POR QUE EU SOU O ÚNICO LEÃO DA SELVA QUE ADMITE TER MEDO? - rugiu Namibia.
-O quê? - Tuka finalmente se pôs de pé.
-Tuka, eu sonhei que você morreu. E estou preocupado com você - Os dois se entreolharam diretamente.- Por favor, temos que ir agora. - finalizou.
-Para onde vamos?
-Para bem longe daqui, onde poderemos ser muito mais do que leões. Seremos o que quisermos.
-Namibia, eu nunca te abandonaria, você sabe disso.
-Vamos.
Depois que cruzaram o limite da terra dos leões, atravessaram a terra das hienas e dos rinocerontes até chegarem na selva, onde se encontrava a fronteira da savana. O sol estava brilhava no meio do céu. o clima estava quente e nenhuma folha se mexia.
-Sinto cheiro de chuva - disse Tuka.
-Acho que vêm da selva.
-Não quer mesmo voltar?
-Não.
Antes de continuar e cruzar a fronteira, Tuka sentiu algo, um presságio, seu corpo dizia que algo ia acontecer. Atrás dos dois, ele ouviu o som de arbustos se mexendo, mas praticamente não tinha vento, estavam muito longe do oceano. Ao virar um pouco seu corpo e olhar para savana pela última vez, não soube o que fazer. Foi tomado pelo medo.
-Namibia. Corre.
-O quê?
-CORRE! - Tuka rugiu e todos os arbustos sopraram de novo, revelando Handak camuflado sob um deles.
O rei dos leões voou sobre Tuka, que contra-atacou antes mesmo de ser atingido, colidindo com o Handak no ar e girando com ele pela vegetação rasteira. Quando conseguiu ficar por cima, Tuka se afastou empurrando a cabeça do outro contra o chão.
Namibia rugiu e se adiantou para frente de Tuka, sem nenhum indício de medo:
-Se afaste! Nós vamos embora.
Enquanto se punha de novo de pé, Handak espirrou sangue no chão, manchando também sua gloriosa juba.
-Como ousa atacar seu rei. - murmurou.
-Deixe-nos ir.- rugiu Namibia - Não queremos lutar.
-Ele te seduziu, Namibia, tudo isso é culpa dele. Você é um leão, ele é uma gazela. E eu vou comê-lo.
-Eu nunca vou deixar isso acontecer - rugiu Namibia.
-ENTÃO VOU MATAR OS DOIS!
Todos aqueles rugidos tinham atraído algo. Da borda da selva, Tuka, que tinha o melhor a audição mais aguçada, ouviu um som peculiar. Das folhas, a ponta de um fuzil surgiu, e atrás dela, um homem.
-Não - disse Tuka, agora colocando-se a frente de Namibia.
O princípe leão jamais tinha visto um homem tão de perto, mas conhecia o seu poder.
Os três leões paralisaram ante a mira fria do homem caída em Handak, que não parava de rugir. O vento começou a soprar de repente e o som que as folhas faziam era aterrorizante. Handak, que sempre teve o mundo inteiro pra si, teve a sensação de que ele tinha diminuído e agora estava mais perto da morte do que nunca. Tuka lembrou do sonho que Namibia teve. Namibia pensou na possibilidade de fugir, deixar seu pai pra morrer e assumir o posto de rei dos leões e viver feliz para sempre ao lado de Tuka. Era exatamente o que seu pai faria no seu lugar. Mas ele era melhor que o pai.
Handak, ao olhar seu reflexo nos olhos do caçador, disse:
-Namibia, estou com medo.
O jovem leão, que até aquele momento encarava o homem, virou o olhar para seu pai,e ao ouvir suas palavras, se enxergou nele.
O fuzil disparou, e em seguida dele um rugido que espantou o caçador de volta para a selva.
-Filho. Por quê?
-Pai...
-Agora eu entendo, filho. Eu fui um péssimo pai.
-Pai...
-O quê?
-Eu te perdoo.