A noite chega e meu coração dilata...
Dizem que é no esplendor do amanhecer que a venda da noite se desfaz e que, a cada nascer do sol, um novo recomeço surge. Especulam que a esperança da alvorada é uma semente semeada na alma de quem a vê, mas o que posso entender quando nada sinto com tamanho acontecimento?
Existem coisas fora do alcance de meu entendimento, que ultrapassam os conhecimentos vagos que permeiam o âmago e que afogam meu coração, pois é na calada da noite que vejo e sinto tudo com a clareza da luz da manhã. Quando o breu sombrio recobre minha visão, a solidão diz-me que é hora da perdição. No rio de prazer, afogo cada melancolia que vaga pelo meu caos. A cada toque malicioso, preencho o vazio de uma vida incompleta. A consumação do ato, é o ápice.
Quando um segundo se passa, me levanto como se nada tivesse acontecido. Visto minhas roupas como quem tem ciência de seu destino. Recebo o pagamento de minha performance hoje para garantir o sustento de amanhã; para ter certeza que a noite é minha sina, mas o amanhecer é daquele que tem meu sangue — daquele pequenino ser humano que não tem consciência de nada e que tive que deixar, por saber que é impossível uma mulher despedaçada ser mãe de alguém tão completo.
Ando pelas ruas em direção ao lugar que meu filho se encontra: a casa da família que o acolheu quando deixei-o em frente a porta na pequena cesta, enrolado com o cobertor que continha seu nome. Minha companhia é o envelope escrito “Para George” que contém todos os meus pagamentos. Entre becos e ruas desertas, chego ao fim de minha rota e insiro dentro da caixinha de correspondência o envelope. O silêncio que pesa na noite é quebrado por meu sussurro:
— É tudo por você.
Viro-me e refaço todo meu caminho, tendo discernimento que, enquanto me deito em camas alheias para ser a válvula de prazer de alguém, ele repousa sua cabeça no travesseiro tranquilamente, a espera do amanhã. Eu sou a noite, a escuridão. Ele é o dia, o aurorescer.
Dizem que a esperança vem ao amanhecer, mas tudo o que consigo ver é um mar de trevas, quando os raios de sol atingem a janela. Especulam que, quando você vende sua alma, tudo se torna obscuro e, com isso, devo concordar.
A noite chega e meu coração dilata, mas sei que é tudo por você.