Fim de tarde. Papel, caneta, xícara de café. Histórias do lado de fora. Um escritor fugindo delas do lado de dentro.
Levei a xícara aos lábios e rabisquei qualquer coisa no meu caderno. Nada decente. Nunca decente. Há dias. Semanas. Meses. Eu estava amargurado. O mundo estava amargo. As palavras estavam amargas. O cheiro daquelas panquecas era amargo. Aquela cafeteria era amarga. A minha inspiração estava amarga. Aquele café estava amargo.
Ergui a mão rapidamente e chamei a atenção da garçonete. A careta que ela fez foi amarga.
A porta da cafeteria se abriu docemente. Uma história em forma de mulher entrou naquele lugar amargo. O seu rosto era doce. As curvas de seu corpo eram doces. Suas roupas coloridas eram doces. O livro que ela carregava era doce. Os seus olhos me encarando eram doces. Seu batom vermelho era doce. As sardas em seu rosto eram doces.
A garçonete que me abordou era amarga.
— O que deseja, senhor?
Meus lábios amargos se franziram em excitação. A doce mulher me dirigiu um doce sorriso. Batuquei a minha caneta amarga em meu caderno amargo. O papel clamava por palavras doces. O meu corpo clamava por doce.
— Mais açúcar, por favor.