Capítulo único - Enfiem a beleza no meio da bunda
Sentir-se só em uma multidão não é uma ato isolado da minha mente que não consegue parar nem por um minuto sequer em meio ao conhecido das minhas lembranças que se fundem com o desconhecido do amanhã que insisto em prever, falhando miseravelmente; todas as vezes.
Chega a ser um ato comum, não é mesmo? Comum as mentes que como a minha não conseguem parar, comum como as dores que vem e vão na minha cabeça por pensar demais naquilo que nunca terei certeza. Comum com a vontade de me manter deitado na cama esperando os pensamentos simplesmente morrerem em si mesmos enquanto passam.
Mas eles nunca passam, sabe?
Continuam a fluir desgraçadamente por entre minha mente, alma e coração de uma forma que nem mesmo a dor consegue fazer parar. Continua fluindo como água em um rio, como aquele filosofo insistia em dizer, “nem sempre a mesma água e nem sempre a mesma pessoa”. Mas pelos deuses que nunca acreditei, os pensamentos me parecem os mesmos enquanto eu sou a porcaria da mesma pessoa.
É como se tudo se perdesse em meio ao suor que escorre frio em minha testa, seguido pelos malditos tremores no corpo que sei que existem pois não consigo parar a minha mente. Segue sempre um ritmo, como o coração que sinto que falha uma ou duas batidas quando tudo se inicia.
Mas a mente?
Ah...
Essa desgraçada não para, e nem creio que vai parar. Continuo vendo as desgraças que vão acontecer, continuo prevendo aquele futuro que nunca vai chegar, continuo me vendo naquela imagem borrada de batom no espelho do bar quando eu tento apagá-la com o álcool.
Mas a merda toda volta, no dia seguinte, em forma de ressaca.
Minha mente não para.
Nem por um segundo.
Eu tento explicar como isso dói lá no fundo da minha alma (que hoje eu creio que nem existe mais), mas as pessoas continuam dizendo que é normal.
Que eu sou só mais um em um total, cansado da correria do mundo, que como humano é isso que tenho.
Só é estranho que minhas enxaquecas nunca foram bonitas, poéticas ou boêmias.
Que o álcool que queima a garganta não queima as memórias do passado que me corrói e que nem mesmo apaga o futuro que eu vi segundo após segundo depois de calcular o que deveria fazer.
Mas vocês me obrigam a aceitar como comum, não é?
Como arte, poesia, como boemia da alma que matei.
Mas ainda dói.
Como qualquer porcaria que me fazem enfiar goela abaixo.
Queima como o álcool descendo em mim, me esquenta como a cachaça que peguei embaixo da pia, me fazendo suar e tremer.
Mas vocês dizem que é bonito.
Então apenas fecho os olhos e desejo que tudo passe de uma vez.
Por que a minha mente não para nem por um minuto, mas a de vocês também não para, a de vocês ainda insiste em ver a maldita beleza na minha dor.
E talvez este seja o motivo de me sentir só em meio a multidão. Pois eu nunca vou entender a poesia, o lírico e a beleza nos sinais claros que meu corpo me manda dizendo que nada vai bem.
Talvez seja melhor eu ficar sozinho, deitado na minha cama.
Estou esperando que o mundo não veja isso como mais um ato preguiçoso de quem não consegue mais se ver no espelho.
Ou ver um futuro.
Ou se ver em um futuro.
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Adeus, a toda boemia, a toda poesia e a todo lirismo que corrói.