Finalmente, a grande porta de tristênio havia sido derrubada e o Príncipe Daniel II estava a poucos passos de fugir. Para até aí chegar, o príncipe se envolveu em muitos confrontos violentos, sendo obrigado a derrotar criaturas horripilantes e sedentas por sangue. Herdeiro do trono do Reino de Teniada, seus inimigos o viam como um potencial líder supremo, capaz de unificar todos os povos da Península de Cohaque, e decidiram isolá-lo na Caverna de Asinto, cercada pelas Sete Montanhas Aladas em uma região remota do Reino Boacho, onde dificilmente desenvolveria e aplicaria suas habilidades.
No entanto, o Príncipe Daniel II era um dos principais guerreiros de seu reino, embora tivesse pouca idade. Além disso, ele buscava conhecer cada lenda e peculiaridade de todos os reinos da península. Assim sendo, sua força aliada com seu conhecimento o permitiram elaborar e executar um plano de fuga. Prova disso foi a batalha contra a guardiã da passagem que dava acesso à caverna. Observando o material da porta, o Príncipe Daniel II logo percebeu onde estava — o mineral tristênio era exclusividade do Reino de Boacho — e, consequentemente, que teria uma grande batalha contra Cambaache, a grande guardiã da Caverna de Asinto. Cambaache era uma criatura mítica, conhecida pelo povo do Reino de Boacho como uma fera de três cabeças, seis braços e que vestia uma armadura de chumbo. Só poderia ser derrotada se acertada no coração pela Espada dos Gritos Desesperados. E de fato, a lenda estava correta. Tanto que foi realizando justamente o que a lenda dizia que o príncipe conseguiu derrotar Cambaache e abrir a passagem.
Nada parecia poder parar o Príncipe Daniel II, que avançava em direção a passagem arrastando sua espada no chão. Repentinamente, ele parou e a espada foi ao chão. O príncipe teve seu coração apertado e sua fuga frustrada por um enorme abismo, em que seu fundo abrigava um vale repleto de lava. Procurou pelas Sete Montanhas Aladas, fundamentais para fuga, e não as encontrou. Com seu corpo cansado e sua alma entrando em estado de choque, procurava descobrir o local em que se encontrava. Tudo levava crer que estava na Caverna Asinto, mas a falta das montanhas o tirava a certeza disso. Além disso, o Príncipe Daniel II estava completamente isolado, sem ter como fugir e voltar ao seu reino.
Sentado no chão, olhando aquele mar de lavas, buscou-se se acalmar e elaborar mais um plano. Inspirou prologa e profundamente para trazer novamente racionalidade aos seus pensamentos. Calmo, começou a pensar no que tinha coletado de seus inimigos durante a fuga. Lanças, escudos e amuletos não pareciam ajudá-los, quando lembrou que tinha conseguido um amuleto místico, conhecido como Pedra Ledeburita. O poder do amuleto era respeitado por todos os ocultistas do Reino de Teniada, mesmo sem eles nunca terem o visto em ação. Segunda as lendas mais longínquas, a Pedra Ledeburita tinha o poder de invocar uma entidade superior, com poderes mágicos capazes de realizar qualquer desejo. Assim sendo, o príncipe colocou o amuleto em volta de seu pescoço e proferiu:
— Poderoso Mago Paifo, a partir da Pedra Ledeburita, pelos caminhos rugosos dos pedregulhos e pelos caminhos polidos do ar rarefeito, venha com sua imponência até aquele que deseja o caminho das dádivas impossíveis para chegar a sólida rocha da certeza.
Seus olhos se arregalaram ao notar que o amuleto trocara do tom púrpuro para o tom rúbeo e a levitava na altura de sua boca. Olhava atentamente até assustar-se ao observar o amuleto sumir misteriosamente diante de seus olhos. Atordoado com a situação, o Príncipe Daniel II voltou a olhar o mar de lava e percebeu que era observado por um ser gigantesco, com áurea imponente e aparentemente muito forte. O ritual de invocação tinha dado certo e, sem pestanejar, o príncipe logo pediu:
— Poderoso Mago Paifo, tira-me deste lugar remoto em que fui aprisionado por meus inimigos e condenado a viver em plena reclusão.
— Do que você está falando, Daniel?
— Poderoso Mago Paifo, diferentemente da Tua Santidade, não posso estar além desta passagem. Se eu pulasse deste abismo, eu jamais resistiria a queda.
— Como “queda”? É só um degrau.
— Poderoso Mago Paifo, mesmo que eu resistisse a queda, eu jamais sobreviveria a esse mar de lava.
— Lava? Onde lava? Do que você está falando Daniel Tentardini Junior?!
— Poderoso Mago Paifo, olha sob teus pés e vê um mar de lava escaldante que somente tu serias capaz de pisá-lo e não o perceber.
Daniel se perguntava o que passava na cabeça de seu filho que agora hesitava em sair de casa. Há instantes, Daniel Jr queria sair com seu pai de qualquer jeito, a ponto de gritar com sua mãe, deixando a fula da vida.
— Daniel, do que você está falando? Você não queria apenas sair? Então vamos logo, que temos que ir até ao supermercado fazer as compras para o almoço de amanhã.
— Poderoso Mago Paifo, eu, Príncipe Daniel II, fui aprisionado por meus inimigos nesta caverna. Inicialmente, acreditei estar na Caverna de Asinto, mas por não ver as Sete Montanhas Aladas acredito estar em outro lugar. Em meus planos inicias, saltaria de pico em pico e chegaria ao Reino de Boacho. De lá, conseguiria um cavalo e voltaria para o meu reino.
Daniel olhou novamente seu filho e chegou a ficar preocupado com o que ouvia. Não entendia o que ele queria dizer com todas aquelas palavras incoerente e porquê ainda estava parado na porta de casa. Chegou a acreditar que seu filho delirava, quando, graças um estalo em sua mente, percebeu que Daniel Jr estava em mais uma de suas aventuras, fruto de sua mente criativa e fantasiosa. O pai, agora aliviado, acabou achando engraçado o que a criança falava e percebeu, portanto, que se entrasse na fantasia conseguiria se divertir e fazê-la continuar a caminhar.
— Está bem, Príncipe Daniel II. Ajudar-te-ei a sair dessa caverna. Pelo que vejo, não consegues enxergar as Sete Montanhas Aladas. Mas saibas que tua visão está ofuscada por seu medo. Venhas e não serás queimado pelo ardor das lavas.
O Príncipe Daniel II institivamente duvidou das palavras do Poderoso Mago Paifo. Para ele, era muito claro que não as Sete Montanhas Aladas não estavam em sua frente. Mas também sabia que o mago não teria o dito se não fosse verdade, deixando-o confuso, além de amedrontado.
— Poderoso Mago Paifo, meu coração palpita pela possibilidade de fugir deste inferno, mas não consigo avançar sem ter a certeza de as Setes Montanhas Aladas estarem de fato aqui.
— Já te disse que estão. Salta e sê contemplado pelo poder das Sete Montanhas Aladas.
— Mas meu temor não permite que avance.
— O medo é natural. Mostra tua coragem, Príncipe Daniel II, e se arrisca. Salta com plena convicção que está fazendo o que quer fazer e goza da benção da sua liberdade.
O pai viu seu filho olhá-lo com medo, mas determinado a saltar. As palavras tinham surtido efeito em transmitir sua mensagem. Daniel Jr deu três passos para trás e veio correndo em direção a porta.
Com um salto magistral, o Príncipe Daniel II mostrou plena confiança nas palavras do mago e lançou-se em direção a lava. Quando começou a cair e seu coração a se desesperar, uma criatura gigantesca, do tamanho de uma montanha, veio voando pelos ares e se posicionou sob o pé do príncipe, que aproveitou o apoio sólido para se impulsionar e saltar novamente. Novamente no ar, o Príncipe Daniel II estava abismado com o que lhe acontecerá e feliz por finalmente conhecer o que de fato eram as Sete Montanhas Aladas. Quando começou a cair novamente, mais uma criatura surgiu em alta velocidade por de trás das nuvens para lhe servir como apoio, o que alegrou o príncipe. Foram oito saltos e o apoio de sete criaturas para sair da borda da caverna para chegar a borda do grande vale. O Príncipe Daniel II conseguiu, finalmente, fugir da Caverna Asinto.
Já o pai do Daniel Jr viu seu filho saltitar da porta da casa em direção ao carro, evitando pisar nas linhas de concreto que seguravam as pedras da calçada. Estava feliz em ver que seu filho tinha assimilado bem suas palavras e que conseguirá ir adiante sem se “queimar”. Já no carro, Daniel olha para filho, e ainda no espirito da brincadeira diz:
— Parabéns, Príncipe Daniel II. Conseguiste fugir da caverna.
— Do que você está falando, seu ET maluco? Vamos fugir daqui em sua nave antes que a tempestade radioativa de Zlegter nos atinja!
Assim, pai e filho arrancaram o carro e rumaram ao supermercado. Mais uma aventura estava lançada. Provavelmente, muitos momentos de superação acompanharam a dupla imbatível, que vivem num universo que permite que o que é real se misture com o que é fantasia.