O sol entra pelas frestas do estore mal fechado. Os pequenos fragmentos de luz adornam a pele despida de Kendall. Mal tapada pelos lençóis brancos, espreguiça-se à medida que a luz vai incomodando as suas delicadas pálpebras ainda cerradas. Abre uma e outra vez os olhos, piscando para focar o mundo. O outro lado da cama está vazio, mas ainda quente. Ela franze o sobrolho, esfrega os olhos e tapa-se melhor, puxando a coberta para cima. Ouve barulhos vindos da sua casa de banho, a batida da água contra o chão de azulejo, as torneiras que guincham enquanto são giradas em busca da temperatura ideal. Ela suspira pesadamente e encosta a cabeça na almofada do seu lado da cama. Desde quando é que ela tinha um lado da cama? Conhecia-se como solteira e não vivia com ninguém. Apenas dividira casa e cama com o seu melhor amigo de infância, mas esse encontrava-se numa relação e mudara-se fazia umas semanas. Semanas estas que ela aproveitara ao máximo com o homem que abusava da sua conta da água. Isso não fazia daquilo uma relação, uma coisa oficial, para espalhar pelas redes sociais, - as quais ela raramente acessava com a falta de tempo - e afins? Era muito cedo para pensar nestas complicações. Rebolou para o outro lado da cama e depois para o seu lado, encostando-se melhor nas almofadas. Ela tinha, pelo menos, umas seis na cama, e a maior parte no seu lado. Tyler não compartilhava o seu gosto excessivo por almofadas, cobertores ou velas.
O barulho da água a escorrer cessou, ouviu o som da porta de vidro do duche abrir-se e depois fechar-se. Conseguia imaginá-lo a pegar na toalha pousada no lavatório, secar o cabelo com ela antes de a enrolar em volta da cintura, como sempre fazia. Sabia esses pequenos pormenores porque passava demasiado tempo a observá-lo e já interagia com o texano fazia um tempo considerável. A maçaneta rodou e ele veio para o quarto, acompanhado com o vapor de água e o som das últimas gotas a pingar da torneira.
Tyler levou uma mão à cabeça, coçando o couro cabeludo ainda húmido. Avançou na direção dela, deitando-se em seguida em cima da jovem, cobrindo-a com as últimas gotas demasiado teimosas para secarem. Ela gemeu com o peso e depois com a sensação arrepiante que as gotas lhe provocavam nas costas. O homem beijou-lhe as costas nuas, descendo e descendo. Massajava-lhe as pernas e voltava a subir, brincando um pouco com o corpo dela em busca das reações desejadas. Mordeu-lhe o lóbulo da orelha e depois o pescoço.
– Só pensas em sexo! – Atirou-lhe ela, fazendo menção de se virar para cima. Ele levantou-se o suficiente para que ela trocasse de posição e agora os seus seios ficavam hirtos e de fronte para Tyler. Ele queria brincar com eles e ao mesmo tempo queria provar que a afirmação dela era completamente errada. Vacilou por uns segundos, pensando seriamente deixá-la vencer uma discussão, mas o seu orgulho falou mais que a cabeça de baixo. Apenas beijou-lhe os lábios de forma ternurenta e completamente despropositada. Tal como aquele beijo na noite de ano novo. – Não esperava por essa. – Confessou ela arqueando uma sobrancelha.
– Nem eu – encolheu os ombros e levantou-se. Deixou a toalha escorregar e cair no chão alcatifado e continuou a andar em busca de um par de boxers. – Não comeces, eu já vou apanhar a toalha! – Resmungou de costas para ela.
– Nem disse nada – bufou – Acho bem que já comeces a conhecer as regras da casa. – A frase soou estranha. Demasiado estranha. – Que horas são? – Perguntou olhando para a mesa-de-cabeceira do outro lado da cama.
– Quase oito. – Respondeu categoricamente voltando-se para uma gaveta. – Ainda não preciso de ir para o trabalho. – Encontrou os boxers que procurava e vestiu-os. Voltou-se então para a cama e rastejou até à borda da mesma. – Sai do meu lugar, Kendall.
–- O teu lugar? Desde quando é que tens um lugar? – Franziu o sobrolho e cruzou os braços à volta do peito. Estava sentada na cama com os lençóis a tapar-lhe até o busto.
– Oras, desde que começámos a dormir juntos! -- Gesticulou e revirou os olhos. Como podia ela negar-lhe o seu lugar e ficar ela com ele? Não gostava da ideia.
–- Com esses discursos até parece que somos oficialmente um casal! – Brincou.
Tyler deitou-se na ponta da cama, pisando pelo caminho os pés descalços e frios dela. Beijou-lhe as pontas dos dedos e traçou linhas imaginárias nas suas canelas e pés. Resolveu aproximar-se mais dela, gatinhou e sentou-se em cima das pernas cobertas. Massajou-lhe o pescoço com os polegares e ia brincando com os cabelos loiros dela. Beijou-lhe o nariz e depois a testa. Roçou o seu nariz contra o de Kends e beijou-o também, depois a testa, as pálpebras, as bochechas, perdeu-se um pouco pelos lábios rosados e doces. Mordeu-lhe o queixo e sorriu quando ela começou a rir. Sabia os seus pontos de prazer, onde lhe tocar quando a queria chatear, que lugar a fazia gritar e rir histericamente.
–- O que estás tu exatamente a fazer? – A irlandesa mordeu-lhe de volta os lábios e em seguida a ponta do nariz, apenas provando que não era só ele que tinha direito a fazer estas coisas.
–- Não faço a mínima ideia. – Comentou sem tirar os olhos dela. – Devíamos oficializar.
–- Oficializar o quê? – Ela arqueou uma sobrancelha loira perfeitamente aparada.
–- Tu sabes. – Coçou a cabeça – Isto.
–- Não estás a fazer muito sentido, Tyler – comentou. – Queres que escrevamos no facebook ou sei lá que somos amigos com benefícios?
–- Não há duvidas que essa cor é a verdadeira. – Revirou os olhos, saiu de cima dela e sentou-se no outro lado da cama. Deitou-se de barriga para cima, deixando-se ficar hirto. Observava o teto branco que precisava de alguns retoques. Começou a pensar nas coisas que queria trocar e arranjar. Aquele chuveiro meio louco, o espelho um pouco rachado nos lados. O lavatório da cozinha precisava de ser trocado. Isolar janelas, pintar algumas paredes. Aquele frigorífico estava para dar as últimas. Raios! Até o sofá precisava de ser trocado. Precisava de algumas mudanças. Parou por um segundo; aquele lugar não era dele. Apenas a cama, uma gaveta onde guardava a sua roupa interior e nada mais. Ela provavelmente matá-lo-ia no segundo que ele propusesse as mudanças. Mas, mesmo que só aquela gaveta, o duche e a cama lhe pertencessem, ele achava que mais que isso era dele, porque ela era dele. Um pensamento um tanto primitivo mas que o fazia feliz. A ideia de partilhar mais que noites de sexo começava a agradar-lhe, e quem diria que seria a moça que lhe atirou com um copo de plástico à cara na primeira vez que o viu. Devia ter desconfiado desde logo. Ela era completamente diferente de todas as mulheres que já conhecera, que já devorara durante longas noites, apenas uma ou duas por semana. Com Kendall era diferente, mal via a hora do trabalho terminar para se poder enfiar no carro e conduzir até ao apartamento, onde a encontraria com a roupinha de secretária ainda vestida.
–- Estás muito estranho hoje, Tyler. – Kends mexeu-se chegando mais perto dele. Posou a cabeça no peito do jovem e, como era costume, esperou que lhe afagasse os cabelos. – O que queres tu dizer com oficializar? – Não demorou para que sentisse a mão pesada dele brincando com os seus cabelos, envolvendo-os nos dedos ou até no pulso. Vinha então com o indicador passeando pelo couro cabeludo, desenhando figuras que ela não conseguia adivinhar a forma. Apenas podia imaginar que seriam ferramentas do trabalho. Era uma sensação agradável quando ele fazia isso.
– Tu sabes. Oficializar. Uma relação. – Parecia envergonhado, não era um tom que ela ouvira muitas vezes da sua parte. Pensando melhor, a ultima, e primeira vez, fora quando se conheceram e o polícia o obrigou a desculpar-se pela atitude grotesca com que ele a tinha abordado.
– Uma relação a sério? - Kendall virou-se para ele, encarando-o o melhor possível dadas as suas posições. Estava perplexa.
– Sim, uma relação a sério. O que achas?
– Namorado e Namorada? Tu dormes cá, usas mais que uma gaveta, aliás, não é só dormir é viver. É isso que estás a propor?
–- Se te faz tanta confusão assim podemos passar os primeiros tempo cada um na sua casa, contudo o nosso envolvimento já nos permite uma mudança do género. Já te conheço suficientemente bem, tu já conheces os meus hábitos. – Parecia seco.
–- Acho que… não estava à espera dessa, Tyler. – Um arrepio percorreu-lhe a espinha fundindo-se depois com os lençóis e jurou sentir a cama a tremer.
–- Se preferes que continuemos assim, continuamos. – Não parecia feliz, preferia mil vezes receber um sim. Nunca tivera de pedir nada, sugerir nada, partia sempre da outra pessoa e ele apenas tinhas que responder um redondo não e acabar com tudo. Porém esperava que desta vez ela não fosse o “Tyler da relação” e o mandasse embora sem roupas e lhe fechasse as portas não só da sua casa, da sua cama, como do seu coração.
– Não me lembro de ter dito isso. – brincou. Adorava chateá-lo. Beijou-lhe o abdómen e levantou-se. Rastejou para cima sentando-se na barrida de Tyler. Esboçou um sorriso e baixou-se beijando-lhe os lábios. – Acho mais que correto. – Pronunciou, deliciando-se com o sorriso que viu na cara do namorado. Seria confuso chamar-lhe assim. – E agora vamos comer!
–- Queria celebrar de outra forma. – Comentou, rodando-a para o outro lado e logo em seguida colocando-se em cima dela. – Uma forma mais divertida. – Ronronou.
–- Oh, a sério? – Riu – Vamos ver se é assim tão melhor que comida! – Um grito de alegria inundou o quarto enquanto Kends era atacada com cócegas por todo o lado. Ela agarrou-lhe as mãos e olhou-o calmamente. – Acho que te amo.
– Eu também te amo, Kendall.