Reflito todo esse vazio que sinto com relação às mulheres, de uma forma que explique toda uma ausência afetiva, amorosa, zelosa e cuidadora da qual eu não obtive em minha infância. As mulheres que coloco hoje em minha vida e as quais eu deixei adentrar meu mundo foi um pedido de socorro, ou melhor, um tampa, para que toda a minha falta de um processo infantil burlado, fosse suprido à base de sexo, relações conturbadas, traição, mentiras, lágrimas, abandono e solidão.
Por anos me indaguei e ainda me indago, sou eu quem expulsa as mulheres ou são elas que saem da minha vida sem eu pedir? E perante essas questões, o que faço eu além de ter um coração partido quando uma novidade se vai e ter o ego corrompido quando uma novidade me nega carinho, amor, reciprocidade, respeito, fidelidade?
Temo o abandono e claramente isso se reflete em meu ego, isso nada mais é do que minha necessidade de tampar os buracos feitos pelas ausências afetivas maternas e paternas em meu peito. Quando uma garota se vai, choro por horas profundamente, mas sem levar em conta que o ultima adeus foi meu. Eu as culpo pelo abandono, eu desejo mortes lentas, eu desejo sua infelicidade, eu me martirizo, me flagelo, torturo-me cruelmente em minhas memórias, expulsando as emoções para que elas não amenizem todo o ódio que eu sinto.
Minha mãe nunca foi presente, em minha infância não tive quem contasse historias, quem curasse meus joelhos ralados ou me ajuda-se a vencer o medo do escuro. Cresci sem pai, isso me moldou, ajudou a ser quem eu sou: fria, vazia, abandonada, depressiva, insegura, tímida, fóbica, alcoólatra, rocha permanente.
Lembro-me de um dia em uma das sessões com minha antiga psicóloga que ela me perguntou sobre o que eu sentia em relação ao meu pai que eu nunca havia conhecido, e tudo o que eu pude lhe responder foi: vinte minutos de lagrimas incessantes e só. Numa outra sessão ela me perguntou o que eu sentia com relação a minha mãe, e tudo o que eu pude lhe responder foi: não quero ser como ela. Não serei como ela.
Reprodução, tudo o que somos esta classificado nesta palavra; reprodução. Nascemos, crescemos, aprendemos, vivemos, morremos, tudo em detrimento das reproduções familiares, escolares e sociais. É aquele velho ditado: “a vida ensina”, e eu sim, aprendi e ainda aprendo com a vida, somente com ela.
Não condeno meus pais pelo abandono ou pela falta de afeto, carinho, amor ou atenção, longe de mim condenar outro ser humano, logo eu, reles mortal pecadora. A única coisa pela qual me lamento aqui é por minha própria covardia, o meu medo de reagir, de dar o próximo passo, o medo de se olhar no espelho e se questionar: Quem sou eu afinal?
Lembre-se: a vida ensina, mas ela também cobra, e cobra caro.
A solidão sempre foi meu berço, minha manta, meu leite materno, minhas velas de aniversario, minhas reuniões de pais, minhas bonecas de louça, meus vestidos, meus cabelos embaraçados, meu excesso de peso, minha sexualidade, meu bulling, meus maltratos físicos e psicológicos, meu corpo tocado por um adulto aos seis anos de idade, meu primeiro beijo com uma menina aos sete, o racismo pedagógico aos treze, com as drogas aos quinze, com a primeira tentativa de suicídio aos dezesseis, com minha primeira relação sexual aos dezenove, com uma mulher, com minha segunda tentativa de suicídio aos vinte e seis, com meu tornozelo quebrado e reconstruído com placas e pinos que esfriam em dias frios.
A solidão, o ego, o abandono e a dança diária com a morte vêm daí, de grande parte disso tudo e um pouco mais. O não merecimento, o não pertencer, o fato de não poder ser você, isso é mais pesado do que a fome, do que a guerra, do que as doenças terminais. Uns vão dizer que o câncer e as atrocidades mundanas são bem piores do que a dor de não se reconhecer perante o espelho, mas questiono e rebato: alguém já se perguntou do “quê dos porquês?” Nunca, jamais, meça uma dor.
Levo meu corpo e meu coração pela vida esperando um dia encontrar saída para meus conflitos internos, almejo grandemente uma cura, uma poção mágica ou quem sabe uma salvação.
Pensei eu, enquanto enxugava duas lagrimas refletindo sobre o porquê algumas garotas se vão... Será que são os desencontros? Será que sou tão detestável e todas que disseram que me amavam, na verdade me odiavam? Será que eu sempre vou rastejar pelo amor e atenção das mulheres? Por que com algumas é mais fácil deixar partir e outras se tornam uma situação insuportável? Sei lá, penso agora que tudo tem a ver com perdão. Com saber se perdoar antes de perdoar o outro.
Escrevendo sobre essas questões agora, sinto meu coração leve, não sinto mais o ódio e a dor causados pelo abandono e pela necessidade de carinho e afetividade que eu estava sentindo há quarenta minutos atrás, e isso é bom, isso tem uma palavra, na verdade duas: “Perdão e Progresso.”
Quem sabe, um dia isso esteja estampado na bandeira de algum país...
Por fim, eu amos as mulheres, por mais que vez ou outra elas fodam com meu coração. Eu amo meus pais, por mais que eles tenham fodido com minha criação e minha sanidade. E eu ainda estou aprendendo a me amar antes que a vida me cobre, antes que a vida me ensine que já é tarde demais.