Uma vez eu fiquei observando o trânsito em uma avenida movimentada aqui da cidade onde morava. Constatei que ninguém realmente prestava atenção em nada que não dissesse respeito às suas respectivas rotinas e vidas. O ir e vir incessante de carros e pessoas em um fluxo praticamente autônomo e padronizado me hipnotizou como um pêndulo e fez com que o vazio interno engolisse os berros da autopreservação por um segundo.
Uma corrida célere e breve foi realizada, fazendo com que eu fosse atingido em cheio por um ônibus que vinha a toda velocidade. Uma onda de dor imensurável me assolou por completo conforme meus ossos eram fraturados e rasgavam minha carne para ficarem expostos como minhas vísceras e os excrementos de meu ventre. Alguns orgãos explodiram enquanto meu corpo era submetido a todo o peso do veículo quando as rodas passaram por cima de mim. Fiquei parcialmente desmembrado, desfigurado além dos limites e inerte no asfalto agora tingido de vermelho-sangue, cinza-encefálico e marrom-fezes, com um leve colorido de almoço e suco artificial de limão.
Eu era a mais nova imundíce a emporcalhar ainda mais as ruas e os automóveis do município.
Então eu voltei à realidade, esperei o sinal de pedestres abrir, os carros pararem e segui meu caminho.