E aqui estamos nós, no lugar mais estupidificador que há: a escola pública.
Só consigo suportar tudo isso bêbado. Não há outra forma. O juízo de um homem sensato se esfarela em meio a toda essa balbúrdia de mequetrefes...
— Ei Augusto! Tá sumido hein. — diz um garoto de quinze anos que sempre me enche o saco porque certa vez eu estava bêbado e recitei poemas anarquistas na sala para todos ouvirem enquanto a minha integridade descia ladeira abaixo...
Aprendo mais sobre a vida sentado observando pombos num banco de praça. Mas agora estou sentado na primeira carteira da porra da sala. Ah! Como sou comportado! Como sou bom aluno! Vejam só, queridos professores, querida humanidade: estou anotado a matéria toda; que bonitinho, que bonitinho! Ah, então quer dizer que o seno de 30° é 1/2 ? Maravilha! Um dia isso vai salvar a minha vida! Ah, há! Ah, há há!
Mas eu entendo. Há todo tipo de gente nesse mundo. Alguns realmente acham importante todas essas fórmulas, essas coisas matemáticas. Problema é deles. Mas por que diabos eu, que só me preocupo com as razões e irrazões da vida e da morte, que não me interesso por nada disso, sou obrigado a perder o meu tempo decorando essas merdas?
Dê liberdade ao ser humano. É pedir demais?
E mesmo as aulas de Literatura são um saco. São rasas, e também, quase ninguém se interessa por Literatura. Literatura não dá dinheiro, não é mesmo? Ah! O que importa é o mercado de trabalho! A alma que se foda... O desenvolvimento do intelecto que se foda... É preciso formar homens e mulheres práticos, prontos pro batente, etc. etc. etc.
E a Filosofia? Raios de Zeus partam a cabeça dos idiotas que perdem tempo com isso! É bobeira, não é não? Na escola então, nem me fale. Eles não ensinam Filosofia. É tudo um grande decoreba. Platão dizia isso e aquilo. Decorem. Aristóteles dizia assim e assado. Decorem. Rousseau, Montesquieu, Voltaire, D'lambert, diziam assim e assim. DECOREM. Marx, Marx, Marx. Uni-vos trabalhadores! E o resto? E Nietzsche? E Bastiat? E Mises? E Ayn Rand? E Friedman?
Onde está o outro lado da moeda? Hmm? Não, não, o outro lado da moeda não importa, não importa. Balela!
Bukowski, Sade, Reinaldo Moraes... Imaginem! Uma boa aula de literatura cheia de putaria e realidade. Oh não! Isso seria inconcebível... A juventude precisa ser domesticada. Assim, assim, sentem-se jovens tolos e patéticos. Sentem-se e decorem. Mais nada. Absolutamente mais nada. Não é preciso compreender, muito menos se interessar... Apenas decorem, seus filhos da puta. Porque o mercado de trabalho não é mole não, hein, seus filhos da puta.
Bem, confesso que a escola ensina sim, muita coisa.
Ensina que o sono e a estupidez é mais importante que a loucura desperta e a embriaguez...
Eu queria me levantar e puxar pelos cabelos cada um dos alunos e gritar em seus ouvidos:
— ACORDA, CARALHO!
Mas eles estão todos sentados falando e falando e falando, sobre o jogo do Flamengo, ou sobre casos amorosos, ou sobre o Big Brother Brasil, ou sobre etc. etc. etc. E eu me levanto e peço pra ir ao banheiro. Estou melancólico, da cabeça aos pés e dos pés ao cu.
Eu sou o maior dos idiotas... É isso. Eu deveria me adequar. Deveria escovar melhor os dentes. Parar de beber, agir de acordo com o bom senso, virtuosamente, sim, sim. Ah! Um bom escritor precisa de disciplina, não de devassidão...
Saio rumo ao pátio. Está bem vazio e frio por ali. Finalmente! Um pouco de ar e de solidão... Caminho, perdido, perdido. Vou ao fundo do colégio. Há uma grade separando o pátio de um sub-pátio escuro cheio de entulhos. Pulo a grade, abraço a escuridão. Oh não, tem câmeras! Espero que não tenham me visto...
Há uma escadinha. Nunca antes havia visto essa escadinha. Subo nela. Diabos, eu poderia cair e morrer, assim, simplesmente. Mas de alguma forma chego ao topo. O teto do edifício!
Me sento e olho para o céu. Estrelas no céu... Quantas, quantas. Ah... Nada disso importa. As dores não são nada, a vaidade humana não é nada. Nossas esperanças, progressos e guerras. Não são nada, perante a vastidão gritante do silêncio cósmico infinitamente glorioso e frio.
Me deito e tiro um longo cochilo. Sou acordado pelo tonitruante badalo do sinal. Hora do intervalo. Puta merda. E o pátio se enche, e as vozes pulam de um lado pro outro, e os namoradinhos se pegam aqui e ali, as bundas rebolando em calças apertadas, os jovens com suas roupas de marca fazendo poses, com cabelos estilosos, com dinheiro no bolso, conversando as banalidades mais previsíveis...
Avisto lá embaixo uma espécie de conhecido e grito:
— VENHA ATÉ AQUI! EI, EI!
Todos olham então em minha direção. Céus, estou fodido, hein?
Mas de repente, o maluco aparece no teto e fala:
— Ei, Augusto. Tu é muito doido! Tá fazendo o que aqui?
— Pensando na morte, meu nobre Pedro. Sente-se aqui, sente-se.
— Tá aqui há quanto tempo?
— Não sei, não faço ideia, não importa. Ei, o que você acha da escola, hein?
— É um saco.
— É? Por que?
— Eu queria estar no campo. Sabe, tenho uns tios que trabalham no campo.
— Ora essa! Pensa comigo então: toda essa gente... Cada um quer fazer uma coisa diferente da vida. Cada um tem o seu gosto. Mas o que é a escola? É um caminhão de normas atropelando a nossa alma. Eles dizem: façam isso e aquilo. E você precisa fazer isso e aquilo. Do contrário, você fracassa, sacou?
— Saquei...
O sinal bateu. Todos foram pra sala, inclusive Pedro. Minha bebida acabou. Oh merda, e agora só me resta dormir e acordar de mãos dadas com a sobriedade. Com todos os meus demônios e palavras trancafiados à sete chaves no baú de minha timidez.
Patético. Augusto, você é patético.