Dizem que quando você mantem uma amizade por mais de sete anos há grande chances dela ser para sempre.
Também dizem que uma verdadeira amizade entre duas pessoas pode se tornar em um grande amor.
Bom... Estou esperando a segunda coisa acontecer.
Eu mantenho uma amizade com Matsui Akira desde o quarto ano do ensino fundamental, quando ele se juntou ao clube de futebol que eu participava. Já são quase vinte três anos.
Fundamental, ensino médio, faculdade. Morávamos juntos pra dividir despesas! Problemas, brigas, reconciliação. Isso não é mais sinônimo de melhores amigos. Vivíamos como um casal, porém sem a parte divertida.
E não é nem por medo de estragar tantos anos de amizade. Akira que era o culpado por ser tão lesado e nunca ter se tocado que estou a fim dele desde o primeiro show que fomos escondidos de nossos pais, assim que entramos no ensino médio, o irmão mais velho dele que nos ajudou no “crime”.
Antes achava que minhas crises de ciúmes fosse só questão de admiração e coisas do tempo de convivência, isso até uma qualquer começar a flertá-lo durante boa parte do show. Posso registrar também que foi uma de nossas piores brigas. Ficamos um bom tempo sem nos falarmos. Estranho que não me recordo como nos “reconciliamos”.
No nosso ultimo ano de colégio ainda não tínhamos decidido o que fazer da vida, mas compartilhávamos o mesmo gosto por música.
Longos intervalos aqueles que eu passava tocando minha guitarra que tanto me esforcei pra conseguir. Por chantagem de meus pais tive que tirar notas perfeitas para merecer o presente. Mas valeu todo o esforço.
Akira também tentou aprender a tocar, mas não se entendeu com instrumento. Só depois que começou a trabalhar descobriu sua paixão pelo baixo.
Acho que tivemos um colegial divertido...
Nossa ingressão para faculdade. Tentávamos entrar em um acordo com cursos no mesmo campus para que pudéssemos dividir morada, porém nesse ponto nossos desejos eram bem distintos. Além de estudar fora, imagine como é ficar apenas entre estranhos. Nunca é ruim se algum amigo vá com você. No final das contas acabamos iniciando o financiamento de um apartamento e seguindo para cursos distintos. Boa parte do que ganhávamos em nosso trabalho de meio período ia pra cumprir as despeças daquele lugar. Mas não me arrependo de nada. Nem das noites em claro para completar projetos, as aulas perdidas pelo cansaço dos dias anteriores... Eu me sentia bem ao ver que todo esforço havia valido a pena.
A única coisa que faltava era Akira abrir o olho e se tocar que algumas coisas mudaram nesses últimos anos. Ainda morávamos juntos, no mesmo apartamento que pagamos juntos. E, claro, eu odiava o fato dele estar indo tão bem em um relacionamento “normal”, mantendo aquela cara de bobo alegre toda vez que falava dela e que tinha planos de se casar indo morar juntos, deixando finalmente o apartamento só pra mim.
Como eu disse: Odiava. Recentemente, entenda-se ontem, vi Akira chegar irritado em casa, xingando deus e o mundo, querendo descontar a raiva em nossa pouca mobília, o que obviamente não permiti. E após esperar esse estado de fúria que finalmente descobri que seu namoro perfeito tinha acabado. O motivo não soube e nem me importa, mas a notícia me deixou imensamente feliz.
Era mais uma oportunidade que me surgia para “consolá-lo”.
Estávamos próximos do dia de São Valentim, data mais que perfeita para por meus planos em ação. Tudo que eu precisava era a colaboração de Akira, a parte mais difícil.
- Bom dia Akira. – resolvi começar o dia com um bom café da manhã quando finalmente ele adentrou a pequena cozinha ainda sonolento.
-... Dia... – respondeu entre um bochecho. – O que faz logo cedo...?
- Preparando o café.
- Você cozinhando? Isso é seguro? – indagou rindo.
- Já passou mal alguma vez?
- Você já cozinhou alguma vez? – pelo visto iriamos ficar nesse impasse de perguntas e nenhuma resposta.
- Idiota. Sabe muito bem que não é a primeira vez que cozinho.
- Devia se lembrar de que também já passei mal nessas vezes.
- Idiota... – realmente eu deveria ter algum problema por conviver tanto tempo com ele e ainda me sentir atraído. – Coma se quiser. – ditei colocando o prato a sua frente.
- Tem certeza que não vou morrer?
- Caso esteja com tanto medo assim o lixo está bem ali. Se vire em jogar tudo fora. – sinceramente ele não colabora. Em minutos acabou com o meu humor.
- Que mal humor... – e a culpa é sua. – E até que não estar ruim. – resolveu comer então? – Mais um pouco já vai poder casar. – brincou.
- Akira... Vai dormir.
- Mas acabei de acordar. – riu.
- Está falando besteira demais na minha casa.
- Sua? Achei que era nossa. – pois é filho da puta. Quem mesmo estava falando de querer se mudar e deixar o lugar pra mim.
- Estou indo ver TV. – sinceramente desisto. Colaboração zero dele.
- Qual o problema Haru? Eu que termino um namoro de dois anos e você que fica estranho? – o problema é que estou tentando ser romântico por etapas e você não colabora. – Faz tempo que não saímos juntos, não é? Primeiro por causa do trabalho e faculdade. Agora só o trabalho já rouba todo nosso tempo. – sorriu sem humor.
- Eu tinha planos de passar minha folga em casa.
- Quando foi que se tornou tão caseiro? – indagou em um tom de surpresa. – É dia de São Valentim.
- Não sei se lembra, mas eu não namoro. E você levou um pé na bunda.
- Que cruel Haru. – ah... Claro. Agora eu sou cruel. – Deixe os apaixonados gastarem durante o dia. Estou falando de sair a noite com o pessoal. Pra pelo menos não passar a noite sozinho.
- Sabe muito bem que não curto essas coisas de só uma noite.
- Sei bem mais que isso. Mas Rui disse que só iria se você fosse.
- Rui?
- É. Está na cara que ele está a fim de você desde os tempos da faculdade. O que acha? Eu particularmente o acho bonito apesar de não fazer meu tipo, mas... – eu não acredito que está me falando isso.
- Cala a boca Akira.
- O que...? – pareceu confuso. Sempre assim.
- Eu disse para se calar! Se você quer sair e arranjar um rabo de saia como meio de curar mágoas de seu fim de relacionamento isso é problema seu! Eu não irei com você e nem me interesso pelo Rui.
- Ta... Desculpe. Não deveria ter dito aquilo.
- Acha mesmo que eu já não notei as investidas de Rui pra cima de mim?! O problema que até ele notou que tenho interesse em outra pessoa. Todos nossos amigos e ex-colegas da faculdade já notaram! Todos... Menos a pessoa que deveria se tocar.
- Hã?!
- É isso mesmo Akira... Não sei por que ainda insisto...
- Para onde vai?
- Pro meu quarto. Passar o resto do dia trancado lá. Espero que se divirta. – e é assim que vejo o dia que deveria ser perfeito acabar nas primeiras horas.
- Haru! – chamou, porém apenas o ignorei. Se eu demorasse mais um minuto ali iria começar a chorar na frente dele. E isso era a última coisa que desejava.
Akira sempre foi lerdo, mas dessa vez foi demais. É capaz de notar os outros me secando, mas não me percebe. Um verdadeiro idiota. Já perdi as contas de quantas vezes já havia me isolado naquele quarto pra chorar por causa daquele idiota. Fervilhando de raiva. Maldita paixão platônica.
- Haru. Até que hora pretende ficar ai? – batia teimosamente na porta de meu quarto.
- Vá embora Akira.
- Não até você abrir essa porta. – então morrerá de bater. – Por favor, Haru... Você queria passar o dia em casa, não é? Poderíamos passar junto então. Ver algum filme...
- Já mandei ir embora! – o interrompi.
- Haru... Já não somos mais criança para repetirmos essas suas manias e birras.
- Quem sabe então minha mentalidade não cresceu!
- Haru... Abra essa porta. – não voltei a respondê-lo apenas o ouvindo suspirar – Tudo bem... Ficarei sentado ao pé da porta até você resolver conversar.
E assim passou sei lá quanto tempo, mas já tinha cansado de chorar e a fome apertava. Provavelmente passasse da hora do almoço. Ainda me recusava a abrir aquela porta. Mas não escutava mais nenhum ruído do outro lado. Será que finalmente desistiu?
Tomado pela curiosidade abri a porta não o vendo mais ali e o cheiro de comida que vinha da cozinha me provocava.
- Finalmente. – escutei a voz de Akira assim que adentrei a cozinha. – E parece que ainda não quer falar comigo. – acertou. – Pelo menos coma alguma coisa. Eu pedi comida. Acabou de chegar. – claro que não tinha sido ele que havia preparado aquilo. É um desastre maior que eu na cozinha.
Querendo apenas saciar minha fome e voltar para meu quarto, comi em silêncio sem nem olhar para Akira. Ele até pensou em dizer algo antes de seu celular começar a tocar. Só pelo toque eu já sabia dizer quem era. Até isso eu sabia. Uma música diferente para cada pessoa de sua lista.
- Fala Rui. – claro, só podia ser ele ao celular. – Desculpa Rui, mas Haru não está com animo de sair e eu desanimei também... Marcamos uma próxima... – não quero atrapalhar a conversa e também já acabei de comer. – Desculpa Rui. Preciso desligar. – apressou-se ao ver que eu estava indo embora. – Você não vai voltar pra lá. – segurou meu braço. – Por favor, Haru.
- Me solta Akira.
- Haru, somos amigos há muito tempo.
- Apenas amigos, não é...?
- Hã?!
- Esquece. – me distanciei dele seguindo pelo corredor que dava a meu quarto. Porém antes que eu alcançasse a porta, Akira conseguiu me cercar contra a parede.
- Já chega Haru. Você parecia tão animado de manhã e agora está com essa birra toda. Não sou seu amigo o suficiente pra que possa me dizer qual é o problema?
- Esse é o problema! Só amigos...
- O que?
- Será que é tão lesado Akira?! Ainda não se tocou que eu gosto de você?! – por sua reação pude entender que aquilo era um “não”. – Nunca percebeu...
- Desde quando...?
- Isso não importa. Agora estou voltando pro meu quarto.
- Haru!
- Me deixa Akira. Eu já sei que sua praia é outra e que fui idiota por manter essa paixonite durante tanto tempo. Agora me deixe. – o que eu dizia com condizia com o que eu desejava. Inutilmente eu esperava que ele dissesse algo “por que não me contou antes?” ou me correspondesse. No final o idiota sou eu.
- Eu não disse que podia ir. – e eu não esperava que você me abraçasse pelas costas. – Desde quando?
- Akira me solta.
- Desde quando?
- Desde o ensino médio. Agora me solta.
- Sério? Eu nem desconfiava...
- Agora que sabe me solte.
- Não quero.
- Akira eu já estou desiludido o suficiente. Não piore.
- Não quero piorar. Apenas... Permita-me tentar. Eu posso acabar gostando... Sua companhia sempre me agradou... Então por que não?
- Não quero criar novas expectativas para serem destruídas.
- Então não crie. Faremos disso um teste. Faça-me apaixonar por você.
- Está dizendo isso porque continua carente por conta do término recente.
- E você relutante por conta de uma longa paixão platônica.
- Não quero me ferir mais.
- Desistir sem tentar não é pior?
- Eu não sei...
- Haru... Olhe pra mim. – me soltou e eu me virei lentamente. – Levante o rosto. Olhe diretamente para mim. – ainda relutante fiz o que pediu. - Não mentirei. Era algo que eu não esperava, mas despertou-me curiosidade. E sendo você sei que não terei arrependimento.
- Pisoteie meus sentimentos novamente que desapareço com o que sobrar de seu corpo. – cedi, porém o ameaçando.
- Que medo. – teria parecido mais assustado com minhas palavras se não tivesse rido. – Eu jamais teria feito nada disso se tivesse notado antes. Desculpe Haru...
- Ainda quer assistir algum filme?
- É só escolher. – sorriu.
Talvez... Não seja ruim arriscar.
Escolhido um filme de comédia qualquer, Akira ajeitou algumas almofadas no chão e pegou uma manta. Não estava tão frio para pegar uma coberta grossa, estava apenas uma temperatura agradável. Na verdade a ideia acabou sendo minha apenas para ter mais um motivo de ficarmos mais próximos.
Eu cuidei apenas da pipoca. Com ajuda de um querido micro-ondas foi uma tarefa fácil. Também preparei um pouco de chá. Gostava assim.
- Tem certeza que não esqueceu nada? – brincou a me ver carregando uma bandeja.
- Ou me ajuda ou como tudo sozinho.
- Como és doce. – riu puxando a mesinha de centro para mais próximo de onde ficaríamos depois me ajudando com as coisas. - Quer mesmo assistir esse filme?
- Agora que já trouxe as coisas pra cá vai querer mudar de ideia?!
- Não é isso. É São Valentim e...
- Estamos em um teste. – o interrompi. – Não é um namoro oficial. – mas queria que fosse...
- Então continua tudo igual e os bônus serão desbloqueados aos poucos?
- Basicamente. – outro gosto que compartilhamos: Videogames. – Precisa só cumprir bem as fases.
- E eu já tenho direito a algum bônus? – puxou-me para perto de si envolvendo seus braços em minha cintura.
- Uhum. – afirmei com um sorriso nos lábios pegando uma pipoca da tigela e levando até sua boca antes que se aproximasse demais. – Controle sua carência.
- Mau... – fez bico, mas logo riu engolindo a pipoca.
Após me ajeitar melhor aceitando o abraço e puxando a manta, deixamos o filme começar. Entre risadas e comentários aleatórios parecia que tudo corria bem. Isso até o celular de Akira tocar de novo. Aquele maldito toque. Não acredito nisso.
- Não vai atender...? – já indaguei pronto pra levantar.
- Não estou a fim. – pegou o aparelho deixado ao seu lado e desligou. – Estou em uma companhia boa demais agora.
- Idiota... – sorri bobo.
- Ainda gosto de você e esse teu humor.
-... Akira... – o chamei receoso. Não sei se deveria. Ele apenas se manteve atencioso esperando que eu continuasse. Curvei minha cabeça para trás de modo que pude selar meus lábios aos deles. Um beijo singelo, mas significativo demais para mim. – Esperei tanto por isso... Esse foi seu primeiro bônus.
- Gostei disso. – sorriu.
- Continue atencioso assim que em breve terá bem mais. – voltei a me ajeitar naquele abraço pensativo, porém feliz.
Esperei tanto tempo e isso apenas aumentava meu medo. Distanciava-me de meu desejo. Agora apenas peço que esse teste evolua positivamente.
Quero comprovar a teoria da amizade e viver um grande amor.