Acordei no meio da madrugada, despertei de uma forma tão rápida e tão aflita, coisa que nunca ocorrera anteriormente. Arregalei os olhos, o coração disparou, a alma se afligiu...
Uma espécime de corrente elétrica dominava minha mente, fazendo com que milhares de pensamentos e memórias retroativas voassem em minha cabeça de uma só vez num impasse de segundos. Repetia mentalmente para mim mesma, diversas coisas aleatórias e pressionava-me a levantar-me e escrever todos os meus conflitos intrapsíquicos. Senti vontade de refugiar-me, de sentar num canto escuro, de quebrar todas as garrafas em minha prateleira e com os cacos abrir minhas veias ao meio e me entregar ao suicídio. Uma vontade incontrolável então tomou conta de mim, comecei a agir impulsivamente, batia a cabeça no guarda-roupa enquanto me encontrava em posição fetal. Minhas mãos continham vida própria, agitavam-se e batiam repetidamente na porta do guarda-roupa, exercendo um som irritante. Enquanto eu me punha ali naquela posição exercendo tais funções, a única coisa que eu sentia era raiva, muita, muita raiva, sem nenhum motivo aparente, apenas raiva e lágrimas rolaram de mim. Após alguns minutos eu levantei apressadamente, me dirigindo a janela e abrindo-a violentamente para espiar a rua, o céu negro e as estrelas incandescentes. Fiquei alguns minutos ali, de pé em frente à janela, olhando a madrugada, ouvindo as vozes juvenis nas ruas, pensando numa maneira mais eficaz de cometer um suicídio.
Tentei me acalmar, voltando para cama. Avistei então, Carolina acordada, com os olhos amedrontados e o coração aflito, ela não sabia como reagir frente tudo aquilo, não fazia ideia do que dizer ou como achar uma saída. Ela já aguentou perturbações demais ao meu lado, mas dessa vez foi diferente, tanto para mim como para ela. Conformei-me que talvez desta vez eu estivesse ficando louca. As mãos agiam por conta própria, os dedos embolavam uns nos outros e se contorciam repetidas vezes, eu olhava um ponto fixo e cego, enquanto a voz dela soava longe, eu me tornara um alguém que definitivamente não era eu...
Carolina me acariciava, tentando me manter segura, me deixar instável, mas eu só sabia sentir raiva e por mais estranho que pareça, a cada novo toque dela eu avistava e ouvia nitidamente a presença e voz de minha mãe, e isso me deixava cada vez mais perturbada. Cada milésimo de segundo sentia a raiva crescendo em mim. Depois de algum tempo eu passei a sentir repulsa pelo ato afetivo, senti ódio pelo fato de estar sendo acarinhada e protegida, senti mensurada raiva por estar sendo tocada por uma imagem que representava minha mãe. Nunca senti tanto ódio, tanto desconforto psíquico, tanta vontade de bater minha cabeça contra a parede até deixar visível os nódulos de meu cérebro debulhados em sangue fresco e quente. Em espécimes de colapsos, precisei descrever os relatos do que eu estava sentindo, então eu acendi a luz, escrevi algumas palavras, voltei para a cama, derramai algumas lágrimas, afastei a mão de Carolina de mim, me levantei novamente, olhei então pela janela, repetia movimentos constantes com as mãos, acendia novamente a luz e escrevia e escrevia. Tudo em constante estado de lucidez perturbativa. Achei estar ficando louca, implorei para minha amada cuidar de mim caso me acontecesse alguma coisa e eu não conseguisse mais conter meus próprios atos.
Lembro-me que; antes de toda essa cena começar, eu senti repentinamente uma dor forte no nódulo esquerdo de meu cérebro, pensando bem, faz mais de um mês que eu sinto constantemente está forte dor. Resumindo, nunca senti tanta raiva, tanto ódio e tanto medo de meus atos contra mim mesma ao mesmo tempo. Depois de muito tempo após o incidente, consegui fechar os olhos e acalmar minha mente, mas era como se algo ainda estivesse incompleto e eu precisasse de algum refúgio.
Acordei as sete horas da manhã, após uma madrugada perturbada e raivosa, me sentindo completamente um lixo abandonado na caçamba de um carreto em fuga da morte. Vesti a primeira coisa que avistei em minha frente, olhei pela janela antes de sair de casa e aspirei o nublado do dia, fiquei alguns segundos parada em frente à minha cama, olhando minha Carolina, enquanto ela dormia serenamente, coloquei as chaves no bolso esquerdo da calça e sai; sem beijo de despedida, e sem expectativas de um belo dia ensolarado de sorte.