Aos seis anos de idade, na escola na esquina de minha casa, eu comecei a andar no mundo de verdade. Claro, a maldade passava de longe, mas isso não significava que problemas deixariam de acontecer de tempos em tempos.
Desde o primeiro ano, fui sempre bem popular. Conseguia falar com todos, apesar de não conhecer ninguém relativamente especial.
No terceiro ano as amizades foram se afunilando, até que eu tinha uma única amiga próxima: Mariana, ou Nana, seu apelido.
Nana era tinha duas irmãs menores, que eram gêmeas. Eu, sendo filho único, nunca entendi as reclamações dela, nem podia entender a graça em ter irmãos.
Ao final do primeiro semestre, eu descobri que meus pais estavam prestes a se divorciar. Naquela época, eu fugi para a casa dela, com esperança de que eles continuassem juntos.
Não funcionou.
No final de setembro, meu pai e minha mãe estavam definitivamente separados, cada um no seu canto. Fiquei com meu pai, já que a casa onde eu morava na época era da minha avó paterna. Minha mãe me visitava todo final de semana e, durante os feriadões, eu ia para a casa dela, numa cidade à três horas de distância.
Nana sempre me ajudava a arrumar e desarrumar as malas e, nós, seguiamos felizes com a vida.
Ao começo do quarto ano escolar, uma das irmãs dela ficou muito, mas muito doente. Ela estava com leucemia, foi o que os médicos falaram. Durante os próximos dois anos, eu vivia com Nana e sua família, ajudando principalmente pelo bem estar da minha amiga. Todos os dias eu os visitava e voltava para casa bem tarde.
Em maio do sexto ano, quando Nana e eu estavamos prestes a completar onze anos, o veredito foi dado: a gêmema faleceu, após tanto lutar contra a doença. A paulada foi tão grande que, naquele ano, nós não comemoramos e nem fizemos alguma festa.
Porém, se soubessemos o que estava vindo em nossa direção, acho que ignorariamos todas as tristezas.
No final daquele ano, foi dita a regra: eu estava indo para uma instituição militar privada, já que a escola atual só ia até o sexto ano. Nana, por outro lado, estava indo para um convento.
Nós pudemos ficar juntos até janeiro, onde nos despedimos. Não foi possível manter contato por cartas, porém...
- Nana, quando nós nos formarmos, vamos comemorar juntos, tudo bem? - Eu perguntei.
- Só se tu tiver notas boas, alguma vez na vida. - Ela riu debochando da minha cara. - Aceito.
Porém, na formatura do fundamental, nada aconteceu. Muito menos na do médio, que foi solitária. Eu segui para uma faculdade de psiquiatria, onde me formei após seis anos. Nana nunca mais passou pela minha cabeça.
- Antigamente o dia das crianças era tão feliz... - Falei para mim mesmo, sentado em um banco no ônibus.
- O que aconteceu? - Uma mulher ao meu lado perguntou.
- Ah, é só que terminei um relacionamento de dois anos a uma semana e, quando eu era mais novo, a família se reunia nesse dia. - Suspirei. - Estava apenas me lembrando.
- Quer uma bala? - Ela colocou uma bala de morango na minha mão. - Espero que se sinta melhor.
A mulher saiu pelo ônibus na próxima parada. Após as portas se fecharem eu olhei pela janela e rapidamente me pus de pé. Mas, o ônibus já estava andando.
Quando a próxima parada chegou eu corri como um louco até a anterior e segui todos os rastros daquela garota. Depois de me perder por algumas ruas, avistei a silhueta mais uma vez.
- Ei! - Gritei, longe da mulher. Quando ela se virou, pude ver que não havia me enganado.
- Perdeu algo? - Ela gritou de volta.
- Sim! - Disse, ofegante. - A comemoração da formatura contigo, Nana!
Não houve respostas, apenas um longo silêncio onde ela escondeu seu rosto e me permitiu aproximar.
O final verdadeiro, algum dia surge por aí, porém, deixo convosco a última mensagem recebida:
"Feliz dia das crianças, Tuti. Eu vou voltar de noite.
De: Nana."