Abner controlava o equilíbrio sobre a prancha com maestria, estendendo os braços viris tanto para estabilizar seu posicionamento quanto para exibir seu corpo atraente. O vento ondulava seu topete, e o sorriso não deixava seu rosto enquanto o rapaz surfava a onda mais alta que já vira. Outros competidores também usufruíam do evento, mas ele sabia que era o seu dia de brilhar.
Inclinava o tronco para cima e para baixo, navegando o oceano com as próprias habilidades e uma ajudinha da maré. Mesmo distante, conseguia avistar as pessoas que o observavam da beira da praia; passeando pelo reflexo do céu e apreciando o mormaço do Sol, conseguia receber e ouvir as mensagens de apoio daqueles que torciam por ele.
Por mais que tentasse se concentrar no seu objetivo, ele não conseguia ignorar completamente seus oponentes. Afinal, eles estavam em seu radar e eram facilmente avistáveis. Curioso sobre o desempenho de Julius, um de seus principais rivais, Abner torceu o pescoço para a direita e o procurou pelas águas. Para sua alegria, conseguiu vê-lo sofrer para fazer, com dificuldade, as manobras mais simples. “Ele pode até terminar o evento, mas com certeza ficará para trás na pontuação”, pensou o rapaz.
Voltava a focar no próprio artifício quando um som vindo de seu lado esquerdo o distraiu. “Splash”, exclamou o oceano ao ser mergulhado pela queda de Melissa, que, apesar de ser vista como uma das favoritas para o torneio do dia, não possuía o melhor aparato para o desafio do momento, e não conseguia manter o equilíbrio perfeito já há alguns minutos.
Abner concentrou-se para finalizar a onda com precisão e estilo, e deixou que a inércia o carregasse até a areia, sem perder a pose de campeão. Ao tocar a terra firme, os personagens já gritavam seu nome antes mesmo dos resultados serem revelados.
Um painel digital se mostrou em frente aos competidores, e uma animação simples mostrou as pontuações de todos com base nos principais atributos julgados pelo evento. Para a surpresa de ninguém, Abner conseguiu o maior escore e conquistou a premiação do dia: uma prancha exclusiva, novas vestes, uma boa quantia da unidade monetária local e muita experiência.
Com a missão cumprida, o rapaz fez um sinal com a mão para acessar o menu principal e desconectou-se do jogo. Sua visão se tornou fosca por alguns segundos, até que o jovem levou as mãos gordas e flácidas em direção ao capacete que cobria sua cabeça e rosto e o removeu com esforço. Respirou fundo e esfregou os pés no chão para empurrar a cadeira com rodinhas em direção à janela de seu quarto.
A neve se acumulava na avenida em frente à sua casa. As poucas árvores, mortas, não possuíam mais flores nem folhas. O céu estava cheio de nuvens e, apesar do relógio ainda dizer que era cinco da tarde, o Sol já se escondera.
O jovem coçou a barriga, bebeu meia lata de refrigerante e comeu alguns salgadinhos jogados sobre sua mesa. Em seguida buscou o capacete que estava utilizando e o vestiu novamente. Antes de começar a explorar um mundo medieval e caçar alguns dragões, pensou para si mesmo:
“Como eu adoro as noites de inverno.”