leite condensado e café mofado
Tháiza Lima
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 29/08/16 16:57
Gênero(s): Comédia LGBT Romântico
Avaliação: 9.67
Tempo de Leitura: 5min a 7min
Apreciadores: 7
Comentários: 1
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Palavras: 943
Livre para todos os públicos
Notas de Cabeçalho

“Como o tempo que só se nota nas rugas, o café mofou. No líquido preto dentro da cafeteira, pelos brancos vêm à tona com grudes, flores de lótus da podridão.” Luzes de emergência se acenderão automaticamente, Luísa Geisler

Capítulo Único leite condensado e café mofado

No momento que iniciei a leitura, pensei que sabia em que ponto eu iria chorar.

Nunca pensei que iria sorrir tanto, que iria parar o livro no meio para te mandar um SMS com uma foto da frase exata que me fez quase rolar da cama como uma vaca arfante e cair no chão duro e frio e morto e silencioso como todo o piso que reveste a minha casa. Nunca pensei que iria me divertir quando você me ligasse pelo Skype e eu diria “No dia que eu decidir me confessar para você, o café terá mofado”, e assim fizemos joça com um fato sério e sorrimos como as duas amigas que somos.

“O que sobrou do café da manhã?”, você pergunta em um determinado dia. Eu estava deitada no seu colo, terminando o capítulo oito daquele livro tão peculiar, quando sua voz cortou minha linha de raciocínio. Eram cinco horas da tarde? Às vezes você vinha tanto na minha casa que eu até perdia a noção do tempo.

“Leite condensado, caramelizado, com flocos crocantes e café gelado na cafeteira verde”, eu respondi, sem realmente prestar atenção no que estava dizendo.

“Então eu vou fazer brigadeiro”, você falou, e eu assenti, voltando a ler o capítulo desde o início, já que minha mente estava cheia de imagens de chocolate e sorvete de flocos e de como seria a aparência de café mofado.

No momento que findei aquela parte, você já tinha terminado o melhor brigadeiro que eu já tinha provado, seu cabelo estava preso em um coque desarrumado e você estava vestindo aquela blusa larga de Harry Potter que é grande o bastante para não precisar de um short por baixo, mas muito curta para ser aceitável usar sem um short – ao menos na minha opinião, só que você nunca ligou muito para minha opinião tradicional sobre as coisas (“Você chega a ser muito antiquada para certas coisas, darling!”, não era isso o que dizia?).

Então eu cheguei do seu lado e te dei um abraço e você estendeu sua colher cheia de chocolate e não sei quantas calorias em minha direção, e eu aceitei, porque não se recusa doce. Fiquei assim, apoiada na cadeira, com você comendo o brigadeiro que fez com o leite condensado da minha casa e o meu Nescau e deve ainda ter usado a manteiga caseira com sal que meu pai insiste em comprar, até que dei um suspiro profundo e ouvi sua risada.

Abro um parágrafo para dizer que sua risada é o melhor som que já ouvi, assim como seu brigadeiro é o melhor que já comi, e seu ombro, embora seja magro e pontudo, se encaixa direitinho na curva do meu pescoço. Sua boca é o conjunto de lábios mais perfeitos que já foram formados e seus olhos castanhos são infinitos, são dois vórtices negros que me impelem a chegar mais perto, até que eu me perca nessa imensidão de felicidade, aleatoriedade e amizade que nos une.

Logo eu estava rindo junto a você, sentando na cadeira ao seu lado e pegando a colher extra que você tinha colocado em cima da mesa para mim. Puxei meu celular do bolso do jeans e quase tive um enfarto ao ver a quantidade de chamadas perdidas da minha mãe, mas é claro que ignorei todas, colocando para tocar alguma música fofa e que fizesse ambas sorrirem enquanto devorávamos todo o doce no pote branco. Aquele momento era tão único e íntimo, eu poderia passar todas as tardes com você assim, mas não fazia porque a) leite condensado está caro, b) brigadeiro engorda e c) você não pode passar todo o tempo do mundo na minha casa, por mais que diga que não se importa.

Somos duas amigas que encontram conforto em roupas largas demais, doces não recomendados pelos médicos e universitários, músicas de bubblegum pop e leituras leves. Eu sou uma garota que encontra felicidade no colo de alguém que aguenta minhas tagarelices intermináveis e você é aquela garota que assiste Netflix nos dias de semana, vai para a balada sexta à noite e no sábado de manhã está apertando minha campainha pelo simples prazer de me irritar (ou porque você gosta mais da minha casa do que da sua? Não sei, e nem reclamo, eu gosto da sua companhia.)

Quando eu comecei a ler aquele livro, nunca pensei que minha vida poderia mudar tanto, nem que seu sorriso passaria a significar tanto para mim. Quando comecei, não achei que nossa piada secreta seria algo cruzado entre propaganda de Chokito e colônias de fungos que se desenvolviam no pacote de pão em cima da geladeira.

Quando eu terminei de ler, só pude pensar no gosto de chocolate que seus lábios vermelhos tinham, e em como você nunca mais me deixaria beija-los, porque não quer estragar nossa amizade com algo tão efêmero quanto uma paixão. Quando eu terminei, eu só queria que você parasse de me ignorar e voltasse a frequentar minha casa no sábado depois de pegar sabe-se lá quantos garotos (e garotas) na balada de sexta-feira.

Quando eu terminei de reler o livro, marquei de nós duas irmos ao cinema sem direito a postergação ou desculpas esfarrapadas. Fomos ver qualquer filme que passava, como “Kung Fu Panda” ou algo assim, e no fim da sessão, enquanto nós duas conversávamos normalmente sobre o quanto crianças são irritantes, comentei que eu havia finalmente descoberto como era a aparência de café mofado – até tinha tirado uma foto para comprovar.

Você riu.

E então eu soube que luzes de emergência não se acendem automaticamente, porque nada me avisou sobre o quão feliz eu ficaria após ver seu sorriso novamente.

❖❖❖
Notas de Rodapé

isso está muito gay, mas honestamente, eu gostei xD

Inspirado no livro citado das notas iniciais, em tardes passadas, piadas sem graça e naqueles amigos que te fazem sorrir mesmo sem pensar <3

Apreciadores (7)
Comentários (1)
Postado 29/08/16 17:32

Ai a Vic vai ficar tão feliz. O textos deste desafio são as coisinhas mais boas de se ler D8

Postado 29/08/16 20:46

Siiim, os textos desse desafio só faltam personificar a doçura e nos envolver em uma bolha de ternura, amor e felicidade até não conseguirmos mais respirar c:

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