Vinho, queijo e uma boa conversa
Aléxia
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 27/07/16 11:41
Gênero(s): Cotidiano Reflexivo
Avaliação: 9.6
Tempo de Leitura: 4min a 5min
Apreciadores: 8
Comentários: 2
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Palavras: 677
Livre para todos os públicos
Notas de Cabeçalho

Olá! Texto acabo de escrever numa tentativa de me sentir um pouco melhor comigo mesma. No fim não estou, mas foi uma boa tentativa. E é bom quando uma pessoa se pode expressar com bem entende.

Capítulo Único Vinho, queijo e uma boa conversa

Dois copos de vinho estão na mesa, uma baguette já cortada em pedaços em um queijo camembert ainda dentro do papel repousa ao lado de uvas e várias compotas. Hoje é um daqueles dias, em que finalmente preciso de tempo para pensar e de alguém para pensar com.

Eu não sou o género de pessoa que chora nos braços dos amigos, que grita com eles quando está mal ou pede ajuda quando a dor é demasiado insuportável. Eu sou a alegria do grupo, a pessoa que parece sempre estar okay, mesmo quando não está. É um mecanismo de auto-defesa? É uma forma de não encarar a realidade? Não sei, apenas que chorar na presença de outra pessoa me deixa completamente vulnerável, e eu não gosto disso.

Ela senta-se no outro lado da mesa, estamos voltadas para a vista da varanda do meu apartamento. Os prédios bonitos, brancos com toques de creme e marfim espalham-se e ladeados pelas ruas de pedra antiga e pequena trazem uma sensação de paz, aquele tipo de sentimento que precisamos para colocar as ideias em ordem, antes de começar a falar. Pego no meu copo e bebo um golo e depois pouso-o outra vez. E, sem olhar para a minha melhor amiga decido falar.

- Sabes, sinto-me a morrer. Emocionalmente quero dizer. Eu realmente não sei mais o que fazer. Estou cansada, estou aflita, estou um caco. Quero sair e ao mesmo tempo não quero sair. Parece que estou numa maratona e nunca saio do mesmo sitio. Como se estivesse presa ao chão e o chão preso a mim. Vejo a vida passar-me à frente, as pessoas são felizes com as suas aventuras e eu estou aqui, presa na mesmice de sempre porque não tenho mais coragem de continuar a andar, de viver ou sequer de respirar. Os meus marcos deixaram de ser atingíveis. - Reprimo as lágrimas. - A exaustão tem sido mais que um estado de espírito. É uma constante dos últimos anos e eu não sei bem como sair daqui.

Ela não diz nada, ela sabe que não precisa de o fazer, porque nós funcionamos assim. Enquanto não estivermos no fim a outra pessoa precisa apenas de nos escutar.

- Eu tenho vinte e três anos, e são os piores anos da minha vida. Este impasse esta vontade de morrer e não morrer que corroí-me o corpo cada vez que acordo de noite num susto de morte. Como se os meus pesadelos fossem tão obscuros que apenas acordo em pânico, mas sem saber do quê.

Ela oferece-me um bago de uva e eu aceito comendo-a, apreciando o sabor antes de voltar a falar.

- Eu não sei. Eu não sei continuar, percebes? Eu vivi dias negros que me assustaram os membros e me fizeram preferir a cama a qualquer luz do sol. Eu preferi viver num quarto escuro por baixo de lençóis sujos a aceitar a realidade. E agora não sei bem como voltar. E não porque as pessoas me dizem que tenho que continuar, que o certo é avançar que não posso desistir. Mas, eu tenho que continuar para onde e para quê? Eu já desisti faz tempo. A vontade de mudar é grande, mas o medo de nunca conseguir é sem dúvida ainda maior. Estas correntes de ansiedade e de uma depressão nunca mencionada queima-me o peito. A falta de confiança que uma pessoa ganha da noite para o dia é desmotivante e para falar a verdade ser o centro da vossa alegria começa a custar-me imenso. Tentar rir quando quero chorar, tentar ser optimista quando nem sei se quero continuar a viver.

Ela conhece-me, melhor que ninguém. Sabe que não preciso de palavras para melhorar. E então sai da sua cadeira, deixa para trás o copo e vem sentar-se ao meu colo. Beija-me a testa e enrola os seus braços morenos à volta de mim.

- Podes chorar. - Diz ela. É choro. Porque necessito de não ser forte por um momento. Preciso de mostrar a mim mesma que ser humano é isso mesmo, sorrir ao pé dos amigos e chorar nos braços deles.

❖❖❖
Notas de Rodapé

Obrigada por terem lido (:

Apreciadores (8)
Comentários (2)
Comentário Favorito
Postado 27/07/16 15:45

Após ler seu texto, acabo de perceber que me identifiquei demais com a história. E depois de uma semana trancada no quarto sem saber o que era a luz da manhã, finalmente vou tomar coragem e sair um pouco, sabe-se lá para onde, só deixando as pernas ditarem o caminho pelas calçadas da cidade.

Aléxia, que texto incrível, mesmo que seja um desabafo. Foi tão íntimo que quase me senti invadindo um pouco dos pensamentos da narradora, conhecendo um pouco mais do que ela sente. Mesmo mais velha que um adolescente com crises emotivas e dramáticas, os adultos também têm seus momentos de fragilidade, quando precisam de um abraço, de uma palavra amiga, ou simplesmente um tempo de reclusão para pensar na vida. A rotina chega a ser dura, e mesmo com essas horas escuras e todas as recaídas, no fim a narradora conseguiu colocar para fora o que consumia sua felicidade de viver, e me senti feliz por ela, pois apenas esse ato deve ter custado uma boa dose de coragem.

Chorar é bom de vez em quando, a água salgada consegue lavar as partes da alma que um banho de conversas não consegue. Espero que fique bem de novo, moça :3 e foi realmente um belo texto para se parar e pensar um pouco no que enfrentamos na vida, e realizar que há pessoas do nosso lado, somente a alguns metros do quarto escuro no qual nos aprisionamos ^^ (desculpe pelo tamanho do comentário, acho que divaguei um pouco demais, hsuahu)

Postado 08/08/16 20:59

Nem sei o que responder D8

DESTAQUE. Quando conseguir eu juro que venho aqui responder ;3;

Postado 27/07/16 16:23

Aquele livro realmente deu-te a volta.