Mas é aquele ditado
Tháiza Lima
Tipo: Conto ou Crônica
Postado: 26/07/16 18:28
Editado: 27/07/16 15:52
Avaliação: 9.33
Tempo de Leitura: 8min a 10min
Apreciadores: 5
Comentários: 3
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Livre para todos os públicos
Notas de Cabeçalho

Qualquer coisa é só culpar a Inês Brasil e sua famigerada frase "Mas é aquele ditado, né", a qual eu vivia perguntando "De que ditado está falando?", e nunca dava em boa coisa.

Três páginas e meia de caderno para pouco mais de mil palavras, transcritas para o word em menos de meia hora '-' acho que me empolguei um pouco demais com a história, os parágrafos estão imensos, mas achei ela tão fofa então...

Boa leitura <3

Capítulo Único Mas é aquele ditado

A história começa com Dona Vera, que dizia sempre para suas filhas: “Aproveitem a mocidade e tragam para casa um genro digno de sua companhia!”. Carla, a mais velha, encrespava os lábios finos e pregava mais uma vez como a adolescência era curta demais para desperdiçar à procura de um homem. Sara, ao contrário, voltava da escola com os olhos verdes brilhando e se trancava no quarto para analisar as opções de maridos em seu inseparável diário. Laura revirava os olhos, simplista, e continuava fazendo seu tricô e pensando se a vida a reservava mais que gatos, cachecóis e uma família absurda.

Bem, não é surpresa que Sara foi a primeira a se casar. Depois de desperdiçar anos de sua vida procurando alguém para chamar de “querido”, aos vinte e dois anos encontrava-se com um anel no dedo anelar esquerdo e uma carreira promissora como colunista do jornal da cidade.

Carla e Laura reviraram os olhos no dia do casamento, mas Dona Vera achava-se em prantos pela boa sorte da filha. No canto do salão de festa, observando o bonito arranjo de miosótis, uma moça suspirou. “É aquele ditado, certo?”, pensou, “Quem pode, pode; quem não pode, se sacode”, e arrancou algumas flores para ver se conseguia cultivá-las.

A moça, nomeada Hanna por seus pais, foi criada pela avó, a qual vivia dizendo: “A vida não é feita de flores, querida”, e lhe arranjava tarefas e mais tarefas domésticas ao longo do dia. Ironicamente, Hanna teve uma infância dura e uma juventude nada florida, para que, na fase adulta, decidisse virar florista.

Casamento, o que é isso? A jovem estava tão comprometida com sua loja que nem se sentia mais incomodada por fazer arranjos florais complicadíssimos para noivas indecisíssimas. Entretanto, um dia passou em sua loja uma bela jovem chamada Carla Mariane, e fez um pedido um tanto inusitado:

“Preciso de um arranjo para convidar um cara para sair.”

Hanna a fitou por alguns segundos, incerta do que fazer. A jovem lançou sobre ela um olhar irritado, então a moça logo começou a perguntar que tipo de homem ele era, para confeccionar um arranjo bem de acordo com sua personalidade. Nesse tempo, surpreendeu-se ao ouvir que ele era policial, trabalhava em um posto a poucas ruas dali, tinha cabelos acaju e olhos azuis parecidos com as violetas que estavam em exposição na vitrine da floricultura. Hanna também soube que logo ele seria transferido para outra cidade, então Carla não queria perder um só segundo até o fatídico dia.

A florista terminou o pedido em vinte minutos, entregando-o para a mulher que batia os pés apressada em frente ao balcão.

“Aqui, pegue uma bala de caramelo, vai te relaxar um pouco”, ofereceu Hanna. A outra a olhou agradecida, desembalando o doce e mastigando-o enquanto contava as cédulas de dinheiro.

Após tudo resolvido, ambas foram até a porta, para serem cumprimentas por um jovem apressado em roupas de couro e um capacete em mãos. Ele perguntou se podia entrar, Hanna disse que sim, e só deu tempo dele se enfiar no meio dos crisântemos e samambaias que um policial estacionou a motocicleta e perguntou polidamente se as jovens senhoritas haviam visto um “marmanjo fora-da-lei”. Elas viram um jovem afobado que não batia com a descrição feita pelo guarda, então ele suspirou e retirou o capacete para respirar em frustração.

“Miguel”, a jovem mulher Carla de flores em mãos se aproximou do homem de cabelos amassados e lábios franzidos, “quer tomar um café depois que acabar seu turno?”. O sorriso do policial continha alívio, felicidade, e parecia esquecer toda a preocupação de capturar um motoqueiro desenfreado que ninguém sabia a aparência.

“Eu acabo às oito”, ele respondeu.

“Então será um jantar”, ela alargou o sorriso e entregou as flores, piscando um dos olhos castanhos cheios de vivacidade e andando pela calçada de volta para casa.

Miguel olhou do arranjo para a mulher independente e para a florista e de volta para as belas violetas no meio de cabos de plantas que ele desconhecia (afinal, não entendia muito de botânica). “São lindas”, pensou em voz alta, chamando atenção da moça que continuava ali. Esta deu de ombros e voltou para dentro da loja, deixando o policial imerso em sua alegria.

“É aquele ditado, a gente se contenta com o que tem”, Hanna suspirou, crente que estava sozinha com seus pensamentos e amores perfeitos.

“Você sempre pode querer mais, sabe”, disse uma voz desconhecida. Se a mulher não se lembrasse que um motociclista aparentemente procurado pela polícia estava se escondendo no meio de suas amadas samambaias, teria pensado que as flores tinham acabado de falar.

“Contento-me com pouco, obrigada”, sibilou a mulher, irritada de súbito sem motivo aparente, “Pode deixar as plantas em paz?”, o rapaz logo parou de tentar desembaraçar aquele amontoado de caules com folhas pequenas.

“Não precisa ser grossa, nem parece que você trabalha em um lugar tão calmo”, Hanna levantou as sobrancelhas para a afirmação. Ela não achava o lugar calmo, na verdade, adorava cuidar das mudas que cultivava, de ouvir histórias da clientela e associar pessoas aos arranjos que confeccionava. “Honestamente, acho que você precisa de mais adrenalina na sua vida.”

“Tem adrenalina o bastante. Você nunca sabe se a noiva vai gostar do buquê ou jogá-lo na sua cara”, a moça riu, mas o rapaz sentiu que havia uma dose de experiência pessoal naquela sentença que deixou o clima mais pesado.

“Parece emocionante”, ele disse devagar. O dar de ombros que Hanna deu foi o gatilho para ele continuar falando, “Enfim, dona florista, você sabe o que é ter o vento passando por seu rosto tão rápido que parece que seu corpo nem está ali? Sentir um aperto na barriga ao cruzar o sinal amarelo, ouvir sirenes de polícia tendo ciência de que elas nunca o alcançarão? Sabe o que é sentir o sangue ferver em suas veias e o coração bater descontrolado e tudo parecer tão bem e certo e tão onde deveria estar?”, o jovem parou por um instante, antes de pegar as mãos de Hanna e fazê-la girar pelo corredor de tuberosas e rosas carolinas.

“Sabe o que é se sentir bem com o perigo?”, com essa frase, executou um último giro e segurou a moça pela cintura segundos antes da queda iminente. Por alguns momentos, nenhum dos dois falou ou se moveu; eram apenas dois adultos ainda novos nesse estágio de vida, os quais tinham desejos demasiado adolescentes.

“Eu sei o que é quase morrer do coração agora”, Hanna falou, libertando-se do aperto do rapaz desconhecido e com inclinações para o lado rebelde da vida. Este mesmo rapaz gargalhou da face irritada da mais baixa, percebendo que era sua deixa para ir embora.

“Passarei aqui quando você fechar a loja, ok?”, educadamente, ele pôs uma florzinha azul no cabelo cacheado da moça, e saiu ainda com um sorriso no rosto.

“Eu recuso! Nem sei seu nome e não estou a fim de parar na cadeia”, resmungou a rapariga. Foi o tempo do rapaz de virar, dizer seu nome e ela pegar a flor em seu cabelo que enfim descobriu o que era “sentir o sangue ferver e o coração bater descontrolado”.

O nome dele era Pedro Soares. Ele deixou uma miosótis em seus cachos acobreados e as memórias de um amigo de infância por quem era secretamente apaixonada.

“É aquele ditado, algumas vezes você precisa parar e deixar o carma tomar conta”, disse Hanna para Laura ao telefone, minutos antes de fechar a loja e subir na garupa da moto que parecia prometer prazerosas aventuras.

Laura suspirou e pensou novamente se a vida um dia a traria mais que tricô, gatos e uma família de amigos absurdos.

❖❖❖
Notas de Rodapé

Qualquer nome estranho ou desconhecido é nome de flor. Miosótis pode ser tanto masculino quanto feminino, então deixei A mais por preferência :v

Espero que tenham gostado :3

Apreciadores (5)
Comentários (3)
Postado 27/07/16 16:29

AAAWWWWNNNN QUE GRACIOSIDADE *----*

Poxa, queria saber como continua a história desses dois ;-;

Durante a leitura eu tava achando que o moço iria sequestrar a moça, e leva-la para algum lugar, tipo um campo cheio de flores, e daí a polícia ia atras deles, e daí eles fugiam, e daí eles tinham que fugir tanto que eles teriam que ir morar em outra cidade, e daí eles viveriam felizes para sempre...

Mentira, não existe essas coisas de ''felizes para sempre''

Lindo texto, adorei!!!!

Parabéns, e um abraço!

Meiling!

Postado 14/08/16 00:33

You again <3

Vou escrever uma continuação procê depois, só preciso de bubblegum pop e nomes de personagens q

Olha, eu estava muito tentada a fazer isso enquanto escrevia aqueles giros que eles deram na floricultura, SHAUSHUA tipo, ele pegando ela no colo e colocando na moto enquanto o policial ainda estava sorrindo abobalhado para as flores, então o motoqueiro arrancava com a Hanna gritando coisas como "E se alguém roubar minhas preciosas flores, enlouqueceu?!", e então o Miguel (policial) sairia do transe e partiria atrás dos dois. Mas eles conseguiriam escapar, claro, pff, não subestime o tal Pedro Soares, Motoqueiro Fantasma (e antigo crush nas horas vagas qq), e eles dariam uma volta na praia rumo ao pôr do sol como os belos clichês românticos.

Menina, felicidade é efêmera. O sentido da vida é tentar fazer a efemeridade durar o máximo possível u.u

Obrigada novamente, e perdão pela demora para responder todos os seus comentários *abraçando novamente* <3

Postado 05/01/18 23:32

Adorei!

Parabéns, moça ❤

Postado 05/01/18 23:32

Adorei!

Parabéns, moça ❤